Correio braziliense, n. 19288, 17/03/2016. Política, p. 4

MULTIDÃO NO PLANALTO

Após divulgação das interceptações telefônicas entre Lula e Dilma, protesto pediu prisão do petista e renúncia da presidente
Por: HÉDIO FERREIRA JÚNIOR

 

HÉDIO FERREIRA JÚNIOR
ESPECIAL PARA O CORREIO

 

A nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a Casa Civil e a divulgação de uma conversa telefônica entre ele e a presidente Dilma Rousseff provocou alta tensão em Brasília e levou pelo menos 5,5 mil pessoas, segundo a Polícia Militar, para a frente do Palácio do Planalto, na noite de ontem. Com faixas, cartazes, megafones, apitos e palavras de ordem, os manifestantes começaram a ocupar uma das faixas laterais da Praça dos Três Poderes ainda no fim da tarde, num movimento espontâneo que começou tímido e foi crescendo com a convocação dos partidários pró-impeachment nas redes sociais.

Por volta das 21h30, houve dispersão do ato em frente ao palácio e os milhares de manifestantes ocuparam o gramado do Congresso Nacional. Houve tentativa de ocupação do prédio e o disparo de diversas bombas de efeito moral. Pega de surpresa, tanto pelo número de efetivo quanto pela falta de equipamentos de segurança, a polícia legislativa teve que se apressar para conseguir conter a aproximação do grupo que gritava “fora PT”.

O protesto, que começou pacífico no Planalto, prosseguiu em clima tenso quando se deslocou para o Congresso. Um manifestante chegou a agredir um policial com uma pedra e foi detido. Sem documentação e aparentando ser menor de idade, ele acabou liberado minutos depois de identificado por pessoas que disseram conhecer a sua família. Quem assistia o ato ainda na parte de cima do gramado, próximo à via de acesso aos carros, era incitado a descer e se somar ao grupo.

Mais cedo, em um carro de som, líderes de movimentos como o Brasil Livre e o Vem pra Rua convocaram um novo protesto para hoje, às 10h, em frente ao Planalto. Nesse horário, está marcada a cerimônia de posse de Lula e dos ministros Jaques Wagner, na Chefia do Gabinete Pessoal da Presidência da República; de Eugênio Aragão, no Ministério da Justiça; e de Mauro Lopes, na Secretaria de Aviação Civil.

Ainda na Praça dos Três Poderes, pneus foram queimados acendendo uma grande fogueira no centro do local. Já no começo da noite, a PM fechou as vias de acesso ao Planalto, impedindo a circulação de carros em toda a Esplanada dos Ministérios, inclusive a via N1, que liga a praça a via L4. Quatro horas depois de iniciado o protesto, as pessoas ainda continuavam a chegar.

Tanto a Polícia Militar quanto o Batalhão de Choque da guarda presidencial precisaram de reforços, já que se mobilizaram para conter um ato que não passava de 300 pessoas no começo da noite. A manifestação foi deflagrada com a chegada de um grupo de deputados da oposição que tentava homologar uma moção de repúdio à nomeação de Lula no Palácio do Planalto.

A presidente Dilma Rousseff deixou o palácio às 18h35 em direção ao Alvorada. Naquele momento, o clima ainda era de tranquilidade e pouca movimentação de manifestantes, que pediam a sua renúncia. Lula já não estava mais em Brasília. Havia viajado para São Paulo.

Um pequeno grupo de pessoas favoráveis ao ex-presidente Lula e à presidente Dilma Rousseff também compareceu ao ato. Houve confronto entre os dois grupos. A PM reagiu com cassetete e spray de pimenta.

 

Deputado expulso

Parlamentares da oposição participam do protesto. Eles teriam, inclusive, tentado iniciar a manifestação, mas, barrados pela segurança, voltaram ao Congresso. Com a chegada de mais manifestantes, os deputados retornaram ao local. Confundido com um oposicionista, o deputado Carlos Marun (PMDB-MS) chegou a ser hostilizado pelos presentes. Marun é aliado do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Ele é um dos responsáveis por tentar blindá-lo no Conselho de Ética.

A notícia da divulgação da conversa telefônica entre a presidente e Lula – interpretada como uma tentativa de impedir a prisão do ex-presidente e novo ministro – logo se espalhou, esquentando o clima fora e dentro da Câmara. A sessão plenária foi suspensa e a oposição protestou cantando o Hino Nacional.

Munidos com apitos, panelas e instrumentos musicais, os participantes do protesto gritavam palavras de ordem e xingamentos contra o ex-presidente. Entre os gritos ecoados, estavam “Lula ladrão seu lugar é na prisão” e “Lula cachaceiro devolve o meu dinheiro”. Os manifestantes também portavam faixas com dizeres favoráveis ao juiz federal Sérgio Moro e pedidos para que os motoristas buzinassem em apoio ao ato.

Quem também incitou os manifestantes contra o governo e o PT foi Kim Kataguiri, do Movimento Brasil Livre. Do alto do carro de som, ele pedia a prisão de Lula. No Twitter, a tag #OcupaBrasília liderava a lista dos assuntos mais comentados do país. Internautas criaram um abaixo-assinado virtual para impedir a nomeação de Lula. Sob o título de “Não aceito Lula como ministro do meu Brasil”, o documento já contava com pelo menos 118 mil assinaturas.