Correio braziliense, n. 19289, 18/03/2016. Cidades, p. 25

Entorno centraliza crise da dengue

SAÚDE » Aumento de casos nas 10 cidades próximas ao DF preocupa o governo de Goiás e causa reflexo direto na capital federal. Executivo admite falta de estrutura no combate ao Aedes: cada vigilante epidemiológico é responsável por 636 domicílios na região
Por: OTÁVIO AUGUSTO

OTÁVIO AUGUSTO

 

Os casos de dengue no Entorno do Distrito Federal colocaram em estado de alerta máximo a Secretaria de Saúde de Goiás. Ao todo, 7.967 pessoas estão com a infecção transmitida pelo Aedes aegypti nas 10 cidades limítrofes ao DF. O Executivo goiano é taxativo: a região centraliza a crise da doença no estado. Luziânia, Formosa, Cidade Ocidental, Santo Antônio do Descoberto e Valparaíso são os locais onde o risco é maior. Os reflexos são sentidos também na capital federal. Das situações ocorridas aqui, 59% se concentram em Brazlândia, Ceilândia, Taguatinga, São Sebastião, Samambaia e Planaltina — pontos com ligação direta com os municípios que lideram o ranking das contaminações.

No estado vizinho, 61.996 pessoas adoeceram por dengue — alta de 18,8% em relação ao mesmo período do ano passado. Goiás já ultrapassa o total de casos registrados em 2011 e 2012. Em apenas sete dias, eles aumentaram 10,7% nos 10 municípios do Entorno. Autoridades sanitárias investigam 30 mortes — sendo seis em municípios limítrofes ao DF. Há, ainda, 107 casos de zika. Desses, 16 são no Entorno: 10 em Santo Antônio do Descoberto; quatro em Valparaíso e dois na Cidade Ocidental. As infecções de chicungunha somam 148 ocorrências — duas no Entorno.

O governo goiano admite falhas no combate ao mosquito. Para se ter ideia dos entraves, cada vigilante epidemiológico é responsável por 636 domicílios no Entorno. Apesar do recuo no índice de infestação por Aedes aegypti na região — de 74,16%, em janeiro, para 37,26%, em fevereiro —, o cenário continua preocupante (veja arte). “Tivemos alguns avanços, mas ainda temos que intensificar os trabalhos. A intenção do governo é erradicar o mosquito do território goiano, mas isso será possível apenas com investimento em infraestrutura e saneamento básico, sobretudo nos municípios do Entorno”, avalia Leonardo Vilela, secretário de Saúde de Goiás. Para o gestor, o crescimento desordenado e os problemas ligados a serviços como limpeza urbana, fornecimento de água e coleta de esgoto são os principais desafios a serem vencidos na região.

No DF, a dengue aumentou 337% em relação ao mesmo período do ano passado. Ao todo, 7.146 pessoas estão com a infecção. Das 31 regiões administrativas 10 vivem situação de risco máximo para a doença. Segundo Cristina Segatto, diretora da Vigilância Epidemiológica, a partir do segundo semestre, o governo vai formular o Caderno da Saúde do DF. O levantamento servirá de diretriz para o controle de doenças. “Com essa análise, vai ficar mais fácil agir. Saberemos o que está acontecendo, o motivo e como vamos trabalhar. Será uma mudança de comportamento para 2017”, explica.

 

Microcefalia

Duas grávidas, uma de Santo Antônio do Descoberto, a 40km de Brasília, e outra de Rio Verde, no sudoeste goiano, diagnosticadas com zika no primeiro trimestre de gestação, tiveram bebês saudáveis, sem microcefalia. Segundo a Secretaria de Saúde de Goiás, o Comitê de Investigação de Microcefalia acompanhou os casos desde a notificação. “É importante destacar que nem toda gestante que tem zika vai ter um bebê com microcefalia”, destacou Magna Carvalho, gerente de vigilância epidemiológica. Até 14 de março, as autoridades sanitárias registraram 117 casos de microcefalia. Desses, 90 estão em investigação e sete foram confirmados.

No DF, os dois casos das malformações notificados pelo Ministério da Saúde continuam em investigação. O Executivo local informou que amostras de sangue das mães e dos recém-nascidos passam por exames laboratoriais no Instituto Adolfo Lutz, em São Paulo. A Secretaria de Saúde descartou a hipótese de problemas genéticos terem causado a anomalia. “Várias infecções congênitas podem causar a microcefalia. Quando recebemos a notificação, avisamos ao ministério. Ainda estamos aguardando o laudo com a conclusão da investigação”, explicou Segatto.

 

Mapeamento

Dos casos de dengue registrados até o momento, 17% tiveram a notificação em hospitais particulares, segundo o mais recente Boletim Epidemiológico, divulgado na última quarta-feira. A rede pública é responsável por 77% das confirmações — o sistema identificou 4.799 doentes contra 1.091 das unidades privadas. Os outros casos tiveram atendimento em unidade púbicas de Goiás (110) ou não estão classificados (242).

 

Sala interfederativa

Autoridades sanitárias do Distrito Federal e de Goiás discutiram, na última terça-feira, estratégias para intensificar o combate ao Aedes aegypti no Entorno. O ministro da Saúde, Marcelo Castro, ressaltou a importância de reduzir a incidência do mosquito na região. Os governadores Marconi Perillo (PSDB-GO) e Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) debateram ações conjuntas para atenuar o avanço da dengue, do zika e da chicungunha. Uma sala interfederativa, no escritório da representação de Goiás no DF, localizada no Lago Sul, será responsável por coordenar as medidas contra o Aedes no Entorno. Participaram da reunião prefeitos de 19 municípios goianos. A volta da circulação do vírus tipo 3 da dengue no estado vizinho foi um dos assuntos mais discutidos no encontro.

 

Para saber mais

UPA sob suspeita

O Ministério da Saúde cobrou à Prefeitura de Santo Antônio do Descoberto o funcionamento de uma unidade de pronto atendimento (UPA) no município. Em ofício, despachado em 29 de fevereiro, a autarquia federal pediu documentos sobre a execução e a conclusão da obra. Segundo o documento, a unidade deveria estar funcionado desde janeiro de 2015. “Solicita que até a data de 31/03/2016 sejam postados os devidos documentos ou enviado os devidos esclarecimentos quanto data prevista para conclusão da referida obra, evitando o encaminhamento desse processo ao Departamento de Auditoria do Sistema Único de Saúde (Denasus), para conhecimento e providências cabíveis”, destaca o texto.

A prefeitura de Santo Antônio confirmou o recebimento do ofício. Segundo a Secretaria de Saúde, a nova data para a entrega do espaço é 30 de junho. O Ministério Público Federal (MPF), a Polícia Federal e o Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) investigam irregularidades na gestão de recursos destinados à saúde, como o Correio mostrou na edição de terça-feira. A auditoria do TCM também identificou ilegalidades em contratos de locação de máquinas pela Secretaria Municipal de Viação, Transportes e Obras Públicas de Santo Antônio do Descoberto. Segundo o Tribunal, há indícios de fraudes aos cofres públicos relativos ao pregão e aos contratos dos itens. “Contratação de itens por menos preço majorado em relação aos preços de referência no mercado, em afronta ao princípio constitucional da economicidade”, diz documento. O TCM enviou o processo para o Tribunal de Contas do Estado de Goiás (TCE-GO). A prefeitura nega as falhas.