O globo, n. 30.165, 09/03/2016. País, p. 6

Moro condena Marcelo Odebrecht a 19 anos

Para magistrado, empresário que comandou maior empreiteira do país orientou o pagamento de propinas

Por: Cleide Carvalho/ Renato Onofre

 

- CURITIBA E SÃO PAULO- O juiz Sérgio Moro condenou a 19 anos e quatro meses de prisão o empresário Marcelo Odebrecht, além de Márcio Faria e Rogério Araújo, outros dois ex- executivos da Odebrecht, pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa. Segundo a Justiça, o empresário, que comandou a maior construtora do país até ser preso ano passado, orientou o pagamento de propina a ex- dirigentes da Petrobras e tentou obstruir investigações.

Outros dois ex- executivos do grupo receberam penas um pouco menores. Alexandrino Alencar foi condenado a 15 anos, sete meses e dez dias de reclusão e César Ramos Rocha, a 9 anos, dez meses e 20 dias por corrupção e associação criminosa. Para a defesa do empresário, a sentença foi injusta. Em nota, o advogado Nabor Bulhões disse que a condenação só pode ser concebida como “grave erro judiciário ou como expressão de puro arbítrio do julgador”.

No decisão de Moro, proferida ontem, a maior pena foi a de Renato Duque, ex- diretor de Engenharia e Serviços da Petrobras: 20 anos, três meses e dez dias de reclusão.

Ao contrário do que alegou a defesa, o juiz considerou que Marcelo Odebrecht se envolveu “diretamente na prática dos crimes, orientando a atuação dos demais, o que estaria evidenciado principalmente por mensagens a eles dirigidas e anotações pessoais, apreendidas no curso das investigações”.

 

PARA A DEFESA, “GRAVE ERRO JUDICIÁRIO”

Além dos ex- dirigentes da Odebrecht, Moro determinou que Duque também siga preso, pois “teria movimentado suas contas no exterior após o início das investigações na Operação LavaJato, tentando, portanto, dissipar os ativos criminosos e praticando novos atos de lavagem, bem como indícios de que teria outras contas secretas no exterior”. A sentença de ontem se refere a cinco contratos firmados pela empreiteira com a Petrobras, que resultaram em propina para funcionários da estatal, referentes a obras em refinarias ( Presidente Getulio Vargas e Abreu e Lima), no Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro ( Comperj), e na construção do prédio sede da Petrobras em Vitória.

De 2006 a 2014, segundo a sentença, a empresa usou offshores e contas no exterior para fazer os pagamentos. Teriam sido depositados US$ 9.495.645,70 e 1.925.100 francos suíços para Paulo Roberto Costa ( também ex- diretor da Petrobras), US$ 2.709.875,87 para Duque e R$ 2.181.369,34 para Pedro Barusco ( ex- gerente da estatal). Ainda foi pago US$ 4,2 milhões para o doleiro Alberto Youssef. Há pagamentos de propina no fornecimento de nafta da Petrobras para a Braskem, controlada pela Odebrecht.

O juiz estabeleceu em R$ 108, 8 milhões e em US$ 35 milhões somados ( R$ 132, 3 milhões) o valor mínimo para indenização dos danos decorrentes dos crimes, a serem pagos à Petrobras. Isso corresponde ao pago em propina à Diretoria de Serviços e Abastecimento da Petrobras.

“O Grupo Odebrecht, por sua dimensão, tem uma responsabilidade política e social relevante e não pode fugir a elas, sendo necessário, como primeiro passo para superar o esquema criminoso e recuperar a sua reputação, assumir a responsabilidade por suas faltas pretéritas. É pior para a reputação da empresa tentar encobrir a sua responsabilidade do que assumi- la”, afirmou o juiz na sentença.

Moro também rebateu as críticas de que concentra a culpa nas empreiteiras e não nos agentes públicos. Argumenta que a discussão não poder ser ideológica a respeito do papel do Estado ou do mercado na economia. (* Enviada especial)

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Operador suspeito de pagar marqueteiro do PT avalia fazer delação

Zwi Skornicki está preso desde fevereiro; mulher de João Santana também estaria disposta a colaborar

Por: Cleide Carvalho/ Renato Onofre

 

- CURITIBA E SÃO PAULO- O operador de propinas da Petrobras Zwi Skornicki é o mais novo investigado da Lava- Jato a cogitar fazer uma delação premiada. Advogados sondaram a força- tarefa sobre a possibilidade de colaboração com a Justiça. Zwi está preso desde fevereiro, suspeito de ter pagado US$ 4 milhões ao marqueteiro petista João Santana em contas no exterior.

Nas últimas semanas, ao menos seis investigados e sete empresas suspeitas de participação no esquema de corrupção consultaram os investigadores sobre a possibilidade de confessar crimes, em troca de benefícios como a redução na pena.

A delação de Zwi é vista com bons olhos pelos investigadores da Lava- Jato, já que as operações comandadas por ele podem provar que o dinheiro desviado da Petrobras abasteceu campanhas presidenciais comandadas por Santana. Durante a 23 ª fase, batizada de Acarajé, descobriuse que Zwi fez nove repasses para uma conta secreta de Santana na Suíça. Três dos noves repasses, que chegaram a US$ 1,5 milhão, ocorreram entre julho e novembro de 2014, período em que Santana e sua mulher, Mônica Moura, conduziam a campanha de reeleição da presidente Dilma Rousseff.

O boom de interessados em fazer delação premiada surpreendeu os investigadores. Entre os advogados, a ação contra o ex- presidente Lula, na última sexta- feira, é considerada um dos fatores que levou a essa disposição de colaborar com a Justiça. A frase do procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, em entrevista sexta- feira, assustou: “Não há ninguém isento de investigação neste país”.

Os investigadores são céticos sobre essa onda de delações. Além de Zwi, estariam negociando acordos a publicitária Mônica Moura, mulher de Santana; o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula; os empresários Marcelo Odebrecht e Léo Pinheiro; e a secretária da construtora Odebrecht Maria Lúcia Tavares.

— Temos que ver com uma certa distância esse mar de boas intenções — afirmou um investigador ao GLOBO.

De acordo com outro membro da força- tarefa, os critérios para novas delações aumentaram e ficaram mais “rigorosos”. Já foram celebrados 48 acordos de colaboração premiada: 43 com pessoas físicas e cinco com empresas. ( Cleide Carvalho, enviada especial, e Renato Onofre)

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Parceria em acordo de colaboração não é usual

 

A delação conjunta não é uma novidade na Lava- Jato, mas nunca foi feita nos moldes que a OAS e Odebrecht negociam fazer, como revelou O GLOBO ontem. Os investigadores têm aceitado o recurso quando o delator principal tem vínculo familiar com os demais e assume o ônus de ter mandado o outro praticar o crime. Eles recusaram a única tentativa de delações conjuntas de pessoas de núcleos diferentes: o ex- diretor da Petrobras Nestor Cerveró e o lobista Fernando Baiano. Os investigadores diziam que os dois queriam delatar a mesma coisa. A regra básica é que cada delator tem que trazer fatos novos à apuração.