Correio braziliense, n. 19290, 19/03/2016. Política, p. 4

CASO DE LULA VOLTA PARA MORO

Decisão do Ministro do STF Gilmar Mendes suspende a posse do ex-presidente da Casa Civil,e, assim,mantém a investigação com juiz do Ministério Público Federal.Petista está sem foro privilegiado até 30 de março,por causa de feriado na semana que vem

 

EDUARDO MILITÃO

 

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu, ontem, a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o cargo de ministro da Casa Civil. Ele ainda determinou que as investigações da Lava-Jato contra o petista continuem com o juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba. Mendes determinou que o magistrado fosse comunicado com urgência da decisão.

A suspensão foi dada em caráter liminar, provisório, e deverá ser analisada futuramente pelo plenário do STF. O ministro julgou dois mandados de segurança abertos pelo PSDB e pelo PPS. Para Mendes, Lula tenta um “salvo conduto” para evitar a prisão, conforme narra diálogo entre ele e a presidente Dilma Rousseff, a respeito de um termo de posse como chefe da Casa Civil. Haveria “intenção de fraudar”, na avaliação do ministro. Ele determinou que o ex-presidente seja incluído no processo.

Não haverá nenhuma sessão plenária do Supremo na semana que vem, por conta do feriadão de Páscoa, que é maior para o Judiciário todos os anos. Caso não seja marcada nenhuma sessão extraordinária, o que seria improvável, Lula deve ficar sem foro privilegiado até 30 de março, quando está marcada o próximo encontro do tribunal.

Na liminar, Mendes diz que as mais de 50 ações espalhadas pelo Brasil devem continuar a correr normalmente e não poderiam ser reunidas no STF ou suspensas. Ainda ontem, a ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Diva Malerbi negou pedido da Advocacia-Geral da União (AGU) para reunir todos esses procedimentos em uma vara do DF.

Na decisão de ontem, o ministro comparou a situação de Lula com a do então deputado Natan Donadon (ex-PMDB-RO), que, na iminência de ser julgado pelo STF, renunciou ao cargo para perder o foro privilegiado e trocar de juiz, escapando de uma eventual condenação. No caso de Lula, ocorre o inverso. “A alegação é de que pessoa foi nomeada para o cargo de Ministro de Estado para deslocar o foro para o STF e salvaguardar-se contra eventual ação penal sem a autorização parlamentar”, disse Mendes.

Foro
Segundo o ministro, a presidente Dilma Rousseff atuou, em princípio, “em conformidade” com sua atribuição de nomear um ministro. “Mas, ao fazê-lo, produziu resultado concreto de todo incompatível com a ordem constitucional em vigor: conferir ao investigado foro no Supremo Tribunal Federal.” Mendes usou grampos telefônicos feitos pela Lava-Jato em telefones de Lula para “demonstração dos fatos”. Um deles é o diálogo do ex-presidente com Dilma travado às 13h32 de quarta-feira, no qual a presidente afirma que enviará um termo de posse para o futuro ministro da Casa Civil. Mendes também cita conversa de Lula com o cientista político Alberto Carlos, em 8 de março, que recomenda que ele assuma um cargo no governo para evitar a detenção. Depois, menciona escuta em que o presidente do PT, Rui Falcão, pergunta ao então chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, o que aconteceria se Lula assumisse a pasta.

A primeira conversa é de 4 de março. “Eu, sinceramente, tô assustado com a ‘República de Curitiba’. Porque a partir de um juiz de primeira instância, tudo pode acontecer nesse país”, reclamou o ex-presidente. Para Mendes, a frase permite concluir que “uma clara indicação da crença de que seria conveniente retirar a acusação da 13ª Vara Federal de Curitiba — a ‘República de Curitiba’ —, transferindo o caso para uma ‘Suprema Corte acovardada’”. Em 16 de março, quando a indicação de Lula é divulgada oficialmente, esse objetivo é revelado em outra ligação, de acordo com o ministro. “O objetivo da presidente da República de nomear Luiz Inácio Lula da Silva para impedir sua prisão é revelado pela conversa”, atesta. Ao explicar a conversa, a presidente disse que estava mandando uma versão do documento porque Lula não sabia se iria na cerimônia. Mas, para Mendes, a explicação “não corresponde” aos diálogos e não é “compatível” com a lei. “O objetivo da falsidade é claro: impedir o cumprimento de ordem de prisão de juiz de primeira instância.”


Abraço simbólico 
Delegados da Polícia Federal realizaram abraço simbólico em todo o país em apoio à instituição e aos agentes coordenadores da Operação Lava-jato. Segundo a Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal (ADPF), o ato também foi em defesa à discussão sobre a aprovação da PEC 412, a PEC da Autonomia, que, se aprovada, torna a PF um órgão independente do Ministério da Justiça. As mobilizações ocorreram em: Ceará, Paraná, DF, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rondônia, São Paulo e Santa Catarina. A expectativa de público era de 230 mil pessoas.


"A alegação é de que pessoa foi nomeada para o cargo de Ministro de Estado para deslocar o foro para o STF e salvaguardar-se contra eventual ação penal sem a autorização parlamentar” 
Gilmar Mendes, ministro do STF