Correio braziliense, n. 19279, 08/03/2016. Economia, p. 8

Sem crédito no exterior, risco de calote aumenta

CONJUNTURA » Taxa de rolagem de apenas 20% nos empréstimos externos, em janeiro, mostra dificuldade das empresas em rolar dívidas e reduz ainda mais os investimentos. Rebaixamento do país, crise política e desequilíbrio fiscal deixam credores apreensivos
 
» ANTONIO TEMÓTEO
 
Mais um sinal de alerta sobre a economia brasileira acendeu no radar dos especialistas. Empresas e bancos nacionais estão tendo dificuldade de rolar as dívidas contraídas no exterior, o que pode aumentar o nível de calotes e reduzir ainda mais os investimentos no país. Em janeiro, segundo o Banco Central, a taxa de refinanciamento da dívida externa de empresas brasileiras, caiu para apenas 20%. Isso quer dizer que, de cada US$ 100 devidos a credores estrangeiros, os bancos e as companhias de diversos setores foram obrigados a pagar US$ 80. Atualmente, o passivo das empresas e das instituições financeiras chega a US$ 264 bilhões, dos quais R$ 55 bilhões, ou 20,8% do total, vencem a curto prazo.

Para piorar, diante da crise instalada no país e da falta de previsibilidade da economia brasileira, o volume de operações de crédito internacional dirigidas ao Brasil despencou. A desconfiança dos credores estrangeiros com a economia brasileira chegou ao pior nível com o rebaixamento da nota de crédito do país pelas três maiores agências de classificação de risco, em consequência do desarranjo nas contas públicas.
No ano passado, a taxa de rolagem das empresas do setor privado chegou a 100%, mas a expectativa dos analistas é de que a situação será bem pior neste ano. Dados preliminares do Banco Central (BC) apontam que, em fevereiro, até o dia 19, a taxa média de rolagem para os setores privado e público chegava a 67%. Para o economista Bruno Lavieri, sócio da 4E Consultoria, a queda nas taxas de rolagem era esperada com o encarecimento do dólar e o rebaixamento da nota de crédito do país e de companhias brasileiras.
Apesar dos riscos, Lavieri afirmou que o nível de calotes não deve disparar. “Para que isso se torne um problema sistêmico, muitas empresas deveriam estar em uma situação delicada e sem a cobertura do BC. Não me parece que seja a situação”, afirmou. Ele ainda ressaltou que, diante da valorização da moeda norte-americana, as empresas brasileiras estão procurando financiamentos internos e tentando colocar em dia os empréstimos tomados.
Na avaliação do economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, os investidores estão preocupados com os riscos de calote, em meio à crise política, à depressão da economia e ao risco de que o endividamento público se torne insustentável. “Na medida em que os juros estão altos e as taxas de rolagem, menores, as empresas têm dificuldade de conseguir recursos. Isso dificultará ainda mais o processo de retomada do crescimento porque as companhias não conseguirão fazer investimentos”, detalhou, o que implica retração do potencial de crescimento da economia brasileira.
O economista Antônio Corrêa de Lacerda, sócio-diretor da MacroSector consultoria, explicou que a queda no nível dos refinanciamentos para as empresas é reflexo do quadro doméstico conturbado e da volatilidade dos mercados estrangeiros. Ele explicou que o imbróglio político e a dificuldade de aprovação de medidas no Congresso para ajustar as contas públicas afugentam os investidores estrangeiros. “Os credores internacionais esperam para ter mais informações sobre os rumos da economia brasileira e, por isso, temos essa volatilidade nas taxas de rolagem. Com isso, as linhas ficam mais caras, devido à percepção de risco em relação àeconomia brasileira”, disse.

 

Recorde negativo
O número de pedidos de recuperação judicial por empresas bateu recorde. As solicitações passaram de 116, nos dois primeiros meses de 2015, para 251 no primeiro bimestre de 2016, num avanço de 116,4%. O resultado é o maior para o período desde 2006, após a entrada em vigor da Nova Lei de Falências, em junho de 2005. As informações são do Indicador Serasa Experian de Falências e Recuperações. Somente em fevereiro, na comparação com o mesmo mês do ano passado, a alta foi de 269%.