Correio braziliense, n. 19272, 01/03/2016. Cidades, p. 21

MP REFORÇA PEDIDO DE PRISÃO DE ESTEVÃO

JUSTIÇA » Com base no entendimento do Supremo de que após condenação em 2ª instância é possível o início do cumprimento da pena, subprocurador-geral da República volta a solicitar a ida imediata do ex-senador para a cadeia. Falta entendimento sobre a nova decisão
Por: HELENA MADER E EDUARDO MILITÃO

HELENA MADER

EDUARDO MILITÃO

 

Dez dias depois de pedir ao Supremo Tribunal Federal a prisão imediata do ex-senador Luiz Estevão, o Ministério Público Federal fez uma nova solicitação à Corte para o início do cumprimento da pena imposta ao empresário. O subprocurador-geral da República Edson Oliveira de Almeida enviou ontem uma manifestação ao ministro do STF Edson Fachin, relator do processo. Os pedidos de detenção de Estevão foram apresentados com base no novo entendimento do STF de que, após condenação em segunda instância, é possível o início do cumprimento da pena. Mas, entre magistrados, advogados e integrantes do Ministério Público, ainda não há consenso sobre o trâmite dos processos a partir de agora. Casos recentes mostram que, até mesmo nos tribunais superiores, existem dúvidas sobre a execução das penas.

Na semana passada, Fachin enviou o caso de Estevão para a Justiça Federal de São Paulo. Mas a juíza Andréia Sarney Costa Moruzzi repassou a responsabilidade ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região. “O Ministério Público Federal, discordando da decisão da meritíssima juíza federal, vem requerer que vossa excelência reitere o que foi determinado pelo despacho de 23 de fevereiro de 2016: ‘Impende, pois, remeter a matéria ao juízo de origem, a quem cabe examinar e determinar, a tempo e modo, a expedição de mandado de prisão em desfavor do paciente’”, alegou o subprocurador-geral no pedido apresentado à Fachin.

No documento, o MP pediu que o Supremo remeta novo comunicado à Justiça Federal de São Paulo. “O Ministério Público Federal requer que seja expedida nova comunicação à 1ª Vara Federal Criminal de São Paulo, reiterando que compete àquele juízo examinar e determinar a expedição de mandado de prisão”, argumentou Edson Oliveira de Almeida.

O trâmite do pedido de detenção imediata de Luiz Estevão foi diferente do adotado em outro caso recente, o do ex-deputado Benedito Domingos. Nesse processo, que está no Superior Tribunal de Justiça, o relator, ministro Rogério Schietti, não enviou o caso à primeira instância e abriu prazo para a defesa se manifestar sobre o pedido. “Em virtude da decisão proferida pelo STF indicar uma mudança abrupta da jurisprudência consolidada no âmbito daquela Corte desde 2009, determino, em homenagem à ampla defesa e ao contraditório, a intimação do recorrente, para que se manifeste acerca da postulação”, argumentou Schietti.

 

Controvérsia

O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, José Robalinho Cavalcanti, diz que é normal haver divergências enquanto há uma adaptação no meio jurídico. “Quando o Supremo muda um entendimento consolidado, sempre há dúvidas operacionais de como fazê-lo. Além disso, os tribunais não têm uma uniformidade de organização nem de tecnologia. A normalização levará algum tempo”, explica.

O procurador lembra que a decisão do Supremo sobre a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância não tem repercussão geral e, por isso, os casos serão analisados individualmente. “O ministro Fachin entendeu que caberia ao juiz de primeira instância decidir sobre a prisão. Já o ministro Rogério Schietti, ao abrir prazo para a manifestação da defesa, parece sinalizar que vai tomar a decisão. Com o tempo, haverá uma definição mais clara sobre qual procedimento deve ser tomado”, acrescenta Robalinho.

A professora da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília Beatriz Vargas diz que a decisão do Supremo cria uma “situação bastante confusa”. “A Constituição é clara quando diz que ninguém é considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. O novo entendimento do STF traz uma controvérsia no campo do direito penal e constitucional. A decisão não é vinculante, então, é possível que haja diversidade de entendimento por parte dos juízes”, comenta.

O criminalista Pierpaolo Bottini, professor do Departamento de Direito Penal da Universidade de São Paulo (USP), acredita que, com o tempo, haverá uma uniformidade de procedimentos. “Estamos em um momento de perplexidade para advogados, juízes e procuradores. Ainda vai haver muita controvérsia sobre quem deve determinar a prisão a partir de agora e se o novo entendimento do Supremo deve ser seguido automaticamente em todos os casos”, reconhece o especialista.

O criminalista Thiago Bottino, professor de direito penal da Fundação Getulio Vargas, reconhece a controvérsia e defende que, até a publicação da decisão com o novo entendimento do Supremo, as prisões imediatas não sejam executadas. “O certo seria manter o entendimento anterior até que pudéssemos analisar a extensão da decisão do STF e os argumentos usados nos votos dos ministros. O Supremo tomou essa decisão no julgamento de um habeas corpus. Embora seja um entendimento do plenário, a extensão dos efeitos não é automática”, comenta o especialista. “A falta de consenso não é sobre quem tem que determinar a prisão. A divergência é se em todos os casos a prisão deve ser decretada”, acrescenta. Para Bottino, a determinação do início do cumprimento da pena deve ser feita pela autoridade judicial que está com o processo.

 

O processo

Benedito Domingos

» Em 2011, o ex-deputado foi denunciado por formação de quadrilha, fraude em licitação e corrupção passiva.

» Como Benedito à época tinha foro privilegiado, o caso ficou com a Corte Especial do Tribunal de Justiça do DF.

» Em 2013, os desembargadores da Corte Especial do TJDFT condenaram o ex-deputado por unanimidade. A pena é de 6 anos de cadeia.

» A defesa recorreu ao Superior Tribunal de Justiça em 2014.

» Em 2015, os ministros do STJ mantiveram a condenação de Benedito.

» No mês passado, o MPF pediu a prisão imediata do ex-deputado.

» O relator do processo no STJ, ministro Rogério Schietti, abriu prazo de 48 horas para a defesa se manifestar sobre o pedido de prisão.

 

Luiz Estevão

» Em 2000, foi denunciado pela prática dos crimes de peculato, corrupção ativa, estelionato, formação de quadrilha e uso de documento falso.

» Absolvido em 2002 pela Justiça Federal de São Paulo.

» O MP recorreu e, em 2006, o empresário foi condenado pelo TRF a 31 anos de cadeia.

» A defesa recorreu, mas, em 2012, o STJ manteve a condenação.

» O Supremo manteve a condenação de Estevão em dezembro do ano passado.

» No mês passado, o MPF pediu a prisão imediata do empresário.

» O ministro Edson Fachin, relator do processo, enviou o processo à Justiça Federal para início do cumprimento da pena.

» A Justiça Federal de São Paulo repassou o caso ao TRF.