Correio braziliense, n. 19280, 09/03/2016. Política, p. 6

Lava-Jato tem sido criteriosa, diz Velloso

CRISE NA REPÚBLICA » Ministro aposentado do Supremo diz que Operação tem forte simbolismo, e que a prisão de Odebrecht mostra que a lei é para todos
Por: JOÃO VALADARES

JOÃO VALADARES

 

O ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Velloso afirmou ontem, em entrevista ao Correio, que a condenação de Marcelo Odebrecht, dono da maior empreiteira do Brasil, é muito importante e significativa. “Não entro no mérito da condenação, é claro, porque não conheço os fatos postos nos autos, as provas produzidas. A prisão do presidente da maior empresa brasileira do setor de construção pesada significa que ninguém está acima da lei”, ressaltou.

Alvo de críticas de um segmento do meio jurídico, a Operação Lava-Jato a as medidas do juiz Sérgio Moro foram defendidas por ele. “A Operação Lava-Jato vem sendo conduzida com critério, tanto que as decisões do juiz Sérgio Moro têm sido confirmadas pelos tribunais, inclusive pelo STJ e STF. Ressalte-se que se observa um bom entrosamento entre Ministério Público e Polícia Federal”, pontuou.

Velloso comentou a condução coercitiva a que foi submetido o ex-presidente Lula, sexta-feira passada, por determinação de Moro. “O juiz determinou, em seu despacho, que houvesse o convite para o comparecimento para depor. Caso não aceito o convite, ocorreria a condução coercitiva, inclusive para evitar incidentes como os ocorridos entre populares quando da intimação do ex-presidente perante o promotor de Justiça de São Paulo. Na ocasião, houve negativa de comparecimento”, destacou.

Ele afirmou que não houve excesso, mas, no lugar de Moro, agiria de maneira diferente. “Eu, se fosse o juiz da instrução, determinaria, primeiro, a expedição de ofício, a fim de bem caracterizar, se fosse o caso, a recusa em comparecer para depoimento. Eu agiria dessa forma por ser mineiro, que pensa duas vezes antes de agir e que costuma antever o que pode acontecer”, ponderou.

O ministro aposentado declarou que, até agora, não observa nenhum respaldo jurídico para um pedido de prisão de Lula. “Não vejo motivo, no momento, para a prisão provisória ou preventiva do ex-presidente”. Questionado se percebe algum tipo de viés ideológico na condução da Lava-Jato, Velloso rebateu. “Trata-se de uma acusação injusta, não assentada em fatos. O que acontece é que as pessoas não estavam acostumadas com um juiz feito o Moro. Ele é um juiz severo, é certo, mas um juiz criterioso e ajustado às novas circunstâncias fáticas e jurídicas e que não se subordina a razões subalternas, como ressaltou, em entrevista à imprensa, o ministro Carlos Ayres Brito.”

Ele declarou que não existe, a seu ver, influência de posicionamentos políticos nos desdobramentos da Lava-Jato e rebateu a tese de vazamentos seletivos. “Os envolvidos devem se preocupar em defender-se. Devem enfrentar o mérito das acusações. Ficam irritados, é certo, quando a imprensa noticia acordos de delação. A imprensa precisa noticiar, precisa informar”, atesta.

 

Frase

“Trata-se de uma acusação injusta, não assentada em fatos. O que acontece é que as pessoas não estavam acostumadas com um juiz feito o Moro”

Carlos Velloso, ex-ministro do STF

 

Três perguntas para

Carlos Velloso, ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal

 

Como o senhor analisa a condução coercitiva a que foi submetido o ex-presidente Lula? Houve exagero?

O juiz Sérgio Moro, no seu despacho, determinou que houvesse o convite para o comparecimento para depor. Caso não aceito o convite, ocorreria a condução coercitiva, inclusive para evitar os incidentes como os ocorridos entre populares quando da intimação do ex-presidente para prestar depoimento perante o promotor de Justiça de São Paulo. Na ocasião, houve a negativa de comparecimento, inclusive com medida requerida junto ao Conselho Nacional do Ministério Público. Não acho que houve excesso por parte do juiz. Eu próprio, se fosse o juiz da instrução, determinaria, primeiro, a expedição de ofício, a fim de bem caracterizar, se fosse o caso, a recusa em comparecer para o depoimento. Eu agiria dessa forma por ser mineiro, que pensa duas vezes antes de agir e que costuma antever o que pode acontecer.

 

O que significa para o Brasil, do ponto de vista simbólico, a condenação de Marcelo Odebrecht, dono da maior construtora do país?

Não entro no mérito da condenação, é claro, porque não conheço os fatos postos nos autos, as provas produzidas. Quero que o seu processo seja um processo justo, que vai se desenrolar, agora, no Tribunal Regional Federal da 4ª. Região, um excelente tribunal. A prisão do presidente da maior empresa brasileira do setor de construção pesada, significa que ninguém está acima da lei. O que precisa, também, ser trazido ao debate, é que uma empresa com mais de cento e cinquenta mil empregados diretos, que paga altos impostos, tem que ser preservada. A empresa não pode ser confundida com diretores processados criminalmente.

 

A delação premiada de Delcídio do Amaral pode servir de base para o pedido de impeachment?

As revelações feitas pelo senador, que era o líder do governo no Senado, com livre trânsito, portanto, no governo, devem ser examinadas com critério — o que certamente está sendo feito pelo ministro-relator da ação penal. A partir desse exame é que seria possível opinar a respeito, isto é, que as revelações podem servir de base para o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff.