O globo, n. 30.158, 02/03/2016. País, p. 6

‘Se vier com metade da história, não tem acordo’, diz procurador sobre delação de empreiteiros

Léo Pinheiro e José Carlos Bumlai também estariam dispostos a fazer acordos

Por: Thiago Herdy

 

- CURITIBA- Um dos coordenadores da força- tarefa da Operação Lava- Jato e negociador de colaborações premiadas, o procurador federal Carlos Fernando dos Santos Lima disse ontem considerar pouco factível a hipótese do que classificou como uma “delação pela metade” por parte de executivos da Odebrecht, com aval de Marcelo Odebrecht.

A possibilidade de delação foi mencionada em notas publicadas nos últimos dias. Por meio de sua assessoria, a Odebrecht nega a estratégia e diz se tratar de hipótese divergente da linha de defesa jurídica escolhida pela empresa.

— Acordo parcial, onde o executivo só entrega parte dos fatos que sabe, talvez esteja só na imaginação das pessoas. Não é assim que as coisas funcionam. Eles podem até querer falar. Mas não será feito de acordo com beneplácito da empresa. Se vier com metade da história, não tem acordo. Para a delação ocorrer, ela tem que vir com sinceridade — disse Carlos Fernando.

Para a força- tarefa, as colaborações só ocorrem quando o delator confirma fatos já apurados com base em provas colhidas pela Lava- Jato, e ainda apresenta fatos novos. Assim, para aceitar a delação de um executivo da Odebrecht, um dos primeiros passos seria que eles estejam dispostos a admitir crimes de corrupção, inclusive com participação de Marcelo Odebrecht. Para a Lava- Jato, ele sabia dos pagamentos de propina.

— Depois que Camargo Corrêa e outras grandes empresas fecharam acordos, ficou mais difícil ocorrerem novas colaborações. Os fatos estão esclarecidos. Talvez já esteja na hora de punir algumas pessoas pelos crimes que cometeram — afirmou o procurador.

De acordo com o jornalista Ricardo Noblat, Léo Pinheiro, ex- presidente da construtora OAS, já condenado pela LavaJato, reuniu parte da família na semana passada e comunicou que decidiu fazer delação. Condenado a 16 anos de prisão pelo juiz Sérgio Moro, Pinheiro foi solto, mas usa tornozeleira eletrônica. Se for condenado pela 2 ª instância, voltará a ser preso. Ele enfrenta sérios problemas de saúde.

De acordo com o blog de Lauro Jardim, o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula, deu início às conversas com o MPF para fazer delação premiada. Um dos pontos que interessam aos procuradores é que Bumlai dê detalhes sobre os supostos R$ 2 milhões que o lobista Fernando Baiano disse ter repassado a pedido dele para nora de Lula.

 

“Ficou mais difícil ocorrerem novas colaborações. (...) A delação tem que vir com sinceridade”
Carlos Fernando Lima
Procurador da República

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Empreiteira diz ter pago de forma ilegal dívida de campanha de Dilma

Segundo executivos, Andrade Gutierrez desembolsou R$ 6 milhões em 2010
 

 

- BRASÍLIA- Dirigentes da empreiteira Andrade Gutierrez afirmaram em depoimentos ao Ministério Público Federal que a empresa pagou despesas de fornecedores da campanha eleitoral da presidente Dilma Rousseff, em 2010, sem que os gastos tenham sido devidamente registrados na prestação de contas apresentada à Justiça Eleitoral.

Só com um dos fornecedores, a Pepper Comunicação, a Andrade Gutierrez teria desembolsado cerca de R$ 6 milhões. O pagamento teria sido feito a partir da simulação de um contrato de prestação de serviços entre as duas empresas, segundo informou a Globonews.

 

DELAÇÃO DE EXECUTIVOS

As acusações teriam sido feitas pelo ex- presidente da Andrade Gutierrez Otávio Azevedo e ratificadas pelo executivo Flávio Barra. Os dois fizeram as declarações depois de negociar acordo de delação premiada com o grupo de trabalho da Procuradoria- Geral da República encarregado das investigações de políticos com foro no Supremo Tribunal Federal ( STF). Os dois prestaram depoimento sobre o caso na semana passada.

Segundo a Globonews, a empreiteira fez os pagamentos à Pepper a pedido governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel ( PT), um dos coordenadores da campanha de Dilma à época. A Pepper prestou serviços ao PT nas duas últimas campanhas presidenciais. As relações entre a empresa e Pimentel são um dos alvos centrais de outra investigação da Polícia Federal, a Operação Acrônimo. A partir da operação, a PF investiga se empresas fizeram pagamentos indevidos à mulher do governador.

As informações sobre pagamentos da Andrade Gutierrez à Pepper, com base em contratos fictícios, provavelmente não terão reflexos na Justiça Eleitoral. Eventuais crimes eleitorais já estariam prescritos. Isso porque juristas entendem que o mandato de Dilma referente à eleição de 2010 se encerrou em 2014. Portanto, a presidente Dilma não poderia ser processada Justiça Eleitoral por problemas na contabilidade de uma campanha anterior ao atual mandato.

 

FILIPPI NEGA IRREGULARIDADES

As denúncias da empreiteira poderão, no entanto, dar origem a uma nova apuração sobre corrupção e lavagem de dinheiro entre uma empreiteira investigada na Operação LavaJato por desvios de dinheiro da Petrobras e ex- integrantes da campanha da presidente.

Em nota, o tesoureiro da campanha de Dilma em 2010, José De Filippi, negou que tenha sido feito pagamento irregular à empresa Pepper. “Os serviços prestados pela empresa Pepper à campanha de 2010 da presidenta Dilma Rousseff foram regularmente contabilizados nas prestações de contas aprovadas pelo TSE. Os valores pagos a esta empresa foram da ordem de R$ 6,4 milhões. O vazamento truncado e seletivo de informações atribuídas às delações premiadas submetidas a sigilo legal, independentemente de quem pratica, é ato ilícito e exige apuração imediata por parte das autoridades responsáveis”.

Amauri Teixeira, um dos donos da Pepper, disse ao GLOBO desconhecer a delação de Otávio Azevedo, ex- presidente da Andrade Gutierrez. Ele não quis dizer se a empresa fez contrato com a empreiteira.

— A gente não vai comentar. Desconheço a delação. Não sei se isso corresponde à verdade. A Pepper não vai se manifestar sobre esse assunto — disse ele.

No mês passado, o ex- presidente da Andrade Gutierrez foi envolvido numa disputa entre dois juízes. O juiz Sérgio Moro, de Curitiba, havia autorizado regime de prisão domiciliar ao empreiteiro. Já o juiz da Marcelo Bretas, da 7 ª Vara Federal do Rio de Janeiro, encarregado da ação referente às propinas pagas para a Eletronuclear, determinara a prisão de Azevedo.

Um dia depois da ordem de prisão, o juiz do Rio revogou a ordem de prisão, e o ex- presidente da Andrade Gutierrez pôde voltar para sua residência em São Paulo.

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Executivo da Odebrecht comprou imóvel em SP na planta

Ruy Sampaio foi primeiro dono de apartamento que hoje é de João Santana
 

- SÃO PAULO- O executivo Ruy Lemos Sampaio, diretor da Kieppe Investimentos e Participações, holding que controla os bens da família Odebrecht, afirmou ontem ao GLOBO que comprou o imóvel ainda na planta, em 2004. Diferentemente do que O GLOBO informou ontem, na primeira página, ele não foi proprietário por 24 horas do apartamento de luxo comprado depois pelo marqueteiro João Santana, em São Paulo.

O executivo, no entanto, só passou a escritura do apartamento para seu próprio nome em 14 de dezembro de 2009, mesmo dia em que oficializou a venda para Mauro Eduardo Uemura e Deborah Uemura. Depois, este casal vendeu o imóvel para Santana em 17 de junho de 2013. Reportagem publicada ontem mostra que a Polícia Federal investiga se Uemura atuou como laranja nesta última transação.

Segundo a Lava- Jato, Santana usou a offshore Shellbill para comprar o imóvel e não declarou US$ 1 milhão pago a Uemura. Sampaio disse que a posse do imóvel foi informada em todas as declarações de imposto de renda até a venda e que comprou o apartamento como investimento. Entre 1985 e 2008, Sampaio ocupou os cargos de vice- presidente de Investimentos e de Finanças na Odebrecht.