Correio braziliense, n. 19276, 05/03/2016. Política, p. 3

A defesa pelo enfrentamento

Ex-presidente dispara críticas contra o Poder Judiciário, a Polícia Federal e o Ministério Público, e chama militância petista para as ruas
Por: LUIZ CARLOS AZEDO

LUIZ CARLOS AZEDO

 

Em pronunciamento na sede do PT, três horas após deixar o terminal de autoridades de Congonhas, onde foi interrogado, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixou em segundo plano a própria defesa nos tribunais e as articulações políticas no Congresso e fez um discurso indignado contra a ação dos investigadores da Lava-Jato. “Hoje neste país ser amigo do Lula parece que virou uma coisa perigosa. É preciso criminalizar o PT, é preciso criminalizar o Lula”, disse, numa clara estratégia para politizar o caso e mobilizar os militantes do PT em sua defesa.

À noite, no centro de São Paulo, petistas lotaram o ginásio do Sindicato dos Bancários e suas imediações e Lula voltou ao ataque. Foi secundado pelo prefeito de São Paulo, Fernando Haddad; pelo presidente do PT, Rui Falcão; e por outros parlamentares e dirigentes petistas. Lula não poupou críticas ao juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba, que determinou as operações de busca e apreensão no seu apartamento e nas residências de seus filhos e de assessores, como o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamoto, e a secretária Clara Ant, que controla sua agenda e anota todas as decisões tomadas pelo líder petista desde a campanha eleitoral de 2002.

“(Eu) Me senti prisioneiro hoje de manhã. O Moro não precisaria ter mandado uma coerção na minha casa, na casa de meus filhos, da casa de companheiros. Lamentavelmente preferiram utilizar a prepotência, um show, um espetáculo de pirotecnia”, declarou. “Estou indignado com o que fizeram com a minha família”, disse o presidente, que foi acompanhado pela esposa Marisa Letícia ao posto da PF em Congonhas, num carro descaracterizado.

 

O “mais caro”

Ao dar a entrevista, ele desqualificou os investigadores, acusando-os de violar os seus direitos, e pilheriou em relação a acusações. Disse que cobrava pelas palestras tanto quanto o ex-presidente norte-americano Bill Clinton: “Sou o conferencista mais caro do mundo e paga quem quiser”. Também falou que não sabia distinguir um vinho barato de um vinho caro. Voltou a negar que é dono tríplex de Guarujá, alvo de um dos mandados de busca e apreensão: “Eles dizem que o apartamento que é meu, mas não é meu. Eu quero saber quem é que vai me dar esse apartamento quando esse processo terminar, porque o apartamento não é meu”.

Lula deixou claro que vai para o enfrentamento aberto com os investigadores da Lava-Jato: “Se quiseram matar a jararaca, não bateram na cabeça, bateram no rabo, porque a jararaca está viva”, afirmou. Muito irritado, voltou a atacar a imprensa e “a elite brasileira”. E apelou para o velho discurso do nós contra eles: “Eu só consigo entender uma explicação para tudo isso. Não há outra coisa para incomodá-los a não ser a gente ter trabalhado todos esses anos para fazer as pessoas do andar de baixo subirem um degrau na perspectiva do andar de cima”, declarou. Lula conclamou militantes e dirigentes do PT a voltar ao cotidiano do partido para recomeçar sua carreira política, mas que ainda não sabia se será candidato à Presidência em 2018.

O apelo de Lula aos militantes do PT resultou num grande ato à noite, ao qual compareceram muitos dirigentes do PT e parlamentares. Enquanto aguardavam a chegada de Lula, nos bastidores, conversavam. O líder do governo no Senado, Humberto Costa (PE), endossou as críticas ao juiz Sérgio Moro e defendeu a antecipação da candidatura de Lula à Presidência da República. O ex-presidente da Câmara deputado Arlindo Chinaglia (SP) avalia que Moro havia cometido o seu primeiro grande erro político, pois despertou os militantes do PT a irem às ruas e unificou o partido. Prefeito de São Paulo, Haddad fez uma defesa apaixonada de Lula, seu padrinho político, com o argumento de que estavam sendo violados seus direitos de simples cidadão.

 

Frase

“O Moro não precisaria ter mandado uma coerção na minha casa, na casa de meus filhos (...) Preferiram utilizar a prepotência, um show, um espetáculo de pirotecnia”

“Eu quero saber quem é que vai me dar esse apartamento quando esse processo terminar, porque o apartamento não é meu”

“Se quiseram matar a jararaca, não bateram na cabeça, bateram no rabo, porque a jararaca está viva”