Correio braziliense, n. 19278, 07/03/2016. Política, p. 2

ATAQUES E ALGEMAS NA OPERAÇÃO ALETHEIA

CRISE NA REPÚBLICA » Segundo delegado da Lava-Jato, ex-presidente chegou a dizer que só sairia de casa algemado, mas acabou convencido a ir depor. Hoje, ele e a sucessora, Dilma Rousseff, voltam a se encontrar em Brasília, sob críticas da oposição
Por: PAULO DE TARSO LYRA

PAULO DE TARSO LYRA

 

Ministério Público, Polícia Federal e defensores do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltaram a trocar acusações ontem sobre supostos excessos da Operação Alethéia, que levou o petista de casa para depor, na semana passada. Em reposta ao juiz responsável pela Lava-Jato no Paraná, Sérgio Moro, o delegado da Polícia Federal Luciano Flores, que conduziu o petista para prestar depoimento, informou ao juiz Sérgio Moro que não precisou cumprir o mandato de condução coercitiva. A defesa do petista, no entanto, voltou a atacar a Operação da última sexta-feira e chamou de “ilegalidade” as determinações expedidas por Moro.

Segundo o delegado Flores, em um primeiro momento, Lula chegou a dizer que só sairia de casa para depor algemado. E que, se quisessem, “teriam de colher o depoimento ali”. O policial informou que isso não seria possível por questões de segurança e que, se Lula não aceitasse acompanhá-lo, teria de cumprir o mandado de condução. “Logo depois de ouvir as orientações do referido advogado, o ex-presidente disse que trocaria de roupa e que nos acompanharia para prestar as declarações”, relatou.

Os advogados de Lula, Roberto Teixeira e Cristiano Zanin Martins, por sua vez, divulgaram nota acusando a força-tarefa de ilegalidades. No sábado, os procuradores disseram que a operação já fizera 116 conduções coercitivas e que apenas no caso do ex-presidente houve queixas. “O fato de a Operação Lava-Jato já ter emitido 117 mandados de condução coercitiva não tem o condão de legitimar a ilegalidade agora praticada contra o ex-presidente Lula, mas, ao contrário, serve de alerta para tantas outras arbitrariedades que poderão já ter sido praticadas nessa operação”, disseram os defensores do ex-presidente.

Eles também rebateram a alegação dos procuradores de que há uma tentativa de se criar uma cortina de fumaça ao levantar o debate. “Houve, inegavelmente, grave atentado à liberdade de locomoção de um ex-presidente da República, sem qualquer base legal. A tentativa de vincular Lula a “esquema de formação de cartel e corrupção da Petrobras, apenas atende a um anseio pessoal das autoridades envolvidas na operação, além de configurar infração de dever funcional”.

 

Reunião emergencial

Menos de 24 horas depois de se encontrarem em São Bernardo do Campo (SP), Lula e a presidente Dilma Rousseff devem se reunir novamente hoje, desta vez em Brasília. Se o evento de sábado foi mais um gesto de solidariedade da presidente, o de hoje deve servir para definir as estratégias de ação da dupla. O petista deve cobrar respostas mais incisivas do governo para tirar o país da atual paralisia. Eles abordarão também os desdobramentos da Lava-Jato, e como o Planalto, o PT e os movimentos sociais vão se preparar para os rebater os atos favoráveis ao impeachment marcados para o próximo domingo, 13 de março. Há uma preocupação, especialmente das forças de segurança, devido ao agendamento de manifestações antagônicas para o mesmo dia. O temor é de que ambas descambem para a violência. Ontem, em Porto Alegre, manifestantes fizeram protestos contra a presidente.

Prestes a se encontrarem novamente, Lula e Dilma ainda terão de explicar a reunião do sábado, em São Bernardo do Campo. A oposição pretende fazer uma representação na Procuradoria-Geral da República, questionando a legalidade da visita presidencial. O líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), argumenta que a presidente e o chefe da Casa Civil, ministro Jaques Wagner (PT), utilizaram recursos públicos para atividade de fim político-partidário. “É inadmissível que uma presidente use o aparato do Estado para fazer uma viagem de solidariedade a uma pessoa que está sendo investigada pela Justiça por crime de corrupção, sob a suspeita de ocultação de patrimônio”, disse.

Para o senador, ao visitar o ex-presidente, Dilma acirra o clima de hostilidade entre os militantes do PT e os defensores do impeachment da presidente. “Isso mostra que ela não tem estatura nenhuma para ser presidente da República”, completou. O líder do DEM na Câmara, Pauderney Avelino (AM), ecoará a pressão e também apresentará requerimento na Câmara para pedir informações ao governo sobre a viagem. “Queremos saber por que ela usou o avião e o helicóptero da Presidência para visitar o Lula”, disse.

No início da noite de ontem, a Secretaria de Comunicação da Presidência divulgou nota afirmando que, “por imposição de segurança, todo o deslocamento da presidenta Dilma Rousseff precisa ser feito por meio do avião presidencial. Também por questões de segurança, se necessário o uso de helicóptero, será o helicóptero militar”.

 

Frases

“É inadmissível que uma presidente use o aparato do Estado para fazer uma viagem de solidariedade a uma pessoa que está sendo investigada pela Justiça por crime de corrupção, sob a suspeita de ocultação de patrimônio”

Ronaldo Caiado (DEM-GO), senador

 

“O fato de a Operação Lava-Jato ter emitido 117 mandados de condução coercitiva não tem o condão de legitimar a ilegalidade agora praticada contra o ex-presidente Lula, mas, ao contrário, serve de alerta”

Roberto Teixeira e Cristiano Zanin, advogados de Lula