Correio braziliense, n. 19281, 10/03/2016. Política, p. 2

LULA É DENUNCIADO POR OCULTAR TRÍPLEX

CRISE NA REPÚBLICA » O Ministério Público de São Paulo vê lavagem de dinheiro e falsidade ideológica no caso do apartamento do Guarujá
Por: EDUARDO MILITÃO, MARCELLA FERNANDES E JÚLIA CHAIB

 

LEGENDA DA FOTO: Petista se encontra com o Presidente do SenadoRenan Calheiros. Se Justiça aceitar denúncia contra ex-presidente, ele vira réu

 

EDUARDO MILITÃO

MARCELLA FERNANDES

JÚLIA CHAIB

 

Curitiba e Brasília — O Ministério Público de São Paulo denunciou ontem o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva por lavagem de dinheiro e falsidade ideológica, sob acusação de ocultar a propriedade de um apartamento tríplex em frente à Praia das Astúrias, no Guarujá (SP). Entre as 16 pessoas arroladas na denúncia à Justiça, estão a ex-primeira-dama Marisa Letícia Lula da Silva, o presidente afastado da empreiteira OAS, Léo Pinheiro, e o engenheiro Igor Pontes.

A denúncia é assinada por três promotores, José Carlos Blat, Cássio Roberto Conserino e Fernando Henrique Araújo. Conserino disse ao Correio ontem que há previsão de uma entrevista coletiva hoje, às 15h, no fórum da Barra Funda para explicar detalhes da acusação.

O advogado de Lula Cristiano Zanin disse que o promotor antecipou a denúncia em entrevista à revista Veja em 22 de janeiro. “Hoje (ontem), Conserino apenas formalizou o resultado, deixando claro que a apuração não foi isenta, decorrendo tão somente da parcialidade e da intenção deliberada de macular a imagem de Lula, imputando crime a pessoa que o promotor sabe ser inocente”, criticou, em nota. “O ex-presidente Lula não é proprietário nem de tríplex no Guarujá nem de sítio em Atibaia, e não cometeu nenhuma ilegalidade”, disse o Instituto Lula. A assessoria da OAS não comentou o caso.

Conserino disse em entrevista ao Correio em 17 de fevereiro que o casal Lula e Marisa era o “possuidor” do apartamento. “Tem testemunhas que afiançam que ele era o possuidor, o proprietário era a OAS. A OAS oculta o nome dela (Marisa Letícia).” Para o Ministério Público foi um ato de lavagem derivado de crimes cometidos contra moradores que compraram cotas de imóveis empreendidas pela Cooperativa Habitacional dos Bancários (Bancoop), que foi à falência e entregou o Condomínio Solaris, onde fica o tríplex, para a OAS. “Três mil famílias ficaram sem apartamento, ele ganhou tríplex”, contou o promotor ao jornal. Ele disse que pediu retratação à revista Veja e que não antecipou que denunciaria o petista.

Lula tinha cota do Solaris pela Bancoop, fez visitas ao tríplex, que era reformado pela OAS, mas desistiu do negócio após notícias revelando sua presença no edifício. “Conserino transformou duas visitas a um apartamento no Guarujá em ocultação de patrimônio”, criticou Zanin. “A família do ex-presidente Lula nunca escondeu que detinha uma cota-parte de um empreendimento da Bancoop, tendo solicitado o resgate desta cota no final de 2015.”

 

Defesas factíveis

O líder do governo no Senado, Humberto Costa (PT-PE), disse que se trata de “denúncia extremamente frágil”. “Todas as defesas do presidente são factíveis. O presidente ainda não foi julgado. Se aceita a denúncia, haverá o processo de julgamento.”

O líder do PPS na Câmara, Rubens Bueno (PR), destacou que Lula é um cidadão como os outros. “As investigações indicam diversos crimes praticados pelo ex-presidente Lula e ele não está acima da lei. A lei é para todos. O ex-presidente Lula deve, e deve muito, responder às denúncias que são feitas contra ele na Justiça.” Ele lembrou que o caso do tríplex e o do sítio são investigados pela Lava-Jato no Paraná, sob suspeita de serem propina de desvios na Petrobras. Para Zanin, isso reforça que as apurações são redundantes. A defesa pediu no Supremo Tribunal Federal a suspensão das duas investigações e a remessa do caso do Paraná para São Paulo.

 

Carga pesada

O juiz Sérgio Moro negou à Polícia Federal pedido de apreensão de objetos que seriam do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e que tiveram o armazenamento custeado, segundo as investigações, pela OAS — uma das empreiteiras investigadas pela Operação Lava-Jato. “(...) inviável a apreensão de tudo, pois seria desproporcional e não há causa fundada para tanto. Se não for possível relacionar todos os bens e promover o lacre, fica a diligência no ponto prejudicada”, diz trecho de um despacho publicado por Moro. De acordo com a Polícia Federal, a OAS custeou a mudança de Lula após o mandato do petista. Conforme a investigação, inicialmente, os bens foram para contêineres e depois para dois endereços em São Bernardo (SP). Ainda segundo a investigação, a OAS pagou R$ 21.536,84 mensais, durante cinco anos, pelo serviço. As imagens mostram prateleiras que armazenam os volumes. No detalhe, caixa identificada com a inscrição “Presidência da República” e a indicação “Praia”.