Estado de São Paulo, n. 44.696, 02/03/2016. Economia, p. B5

Governo conta com quase R$ 50 bi de receitas extras

Dados divulgados ontem projetam queda de R$19,4 bi na receita com tributos e um aumento de R$ 9,8 bi nas despesas obrigatórias

Por: Bernardo Caram e Adriana Fernandes

 

Para não ter de fazer um corte no Orçamento da União maior que o de R$ 23,4 bilhões realizado pela presidente Dilma Rousseff, a equipe econômica estimou ontem em R$ 47,5 bilhões a arrecadação de receitas extraordinárias em 2016. Essa arrecadação é incerta e pode não ser realizada ao longo do ano, o que ocorreu nos últimos anos, levando a sucessivas frustrações da meta fiscal. A previsão foi incluída em relatório sobre receitas e despesas enviado ao Congresso Nacional. Decorridos apenas dois meses de 2016, o governo projetou queda de R$19,4 bilhões na   arrecadação de tributos cobrados pela Receita Federal neste ano.

Indicando um cenário fiscal ainda mais complicado, os dados divulgados ontem apontam para aumento de R$ 9,8 bilhões nas despesas obrigatórias, se comparado com o previsto na Lei Orçamentária deste ano, sancionada pela presidente há pouco mais de um mês. Entre as receitas extraordinárias, o governo incluiu a arrecadação de R$ 13,6 bilhões com a volta da CPMF - que enfrenta forte resistência dos parlamentares - e aumento dos tributos que são recolhidos em operações de venda de ativos, além dos recursos obtidos com a repatriação de recursos não declarados à Receita no exterior. Das receitas extraordinárias esperadas, o governo revelou apenas o que espera receber com a CPMF: R$13,6bilhões. O restante foi mantido em sigilo.

O governo estimou mais R$ 30,8 bilhões em receitas com a venda de ativos da União. Essas estimativas incertas contribuíram para minimizar o impacto da queda da arrecadação de tributos no tamanho do corte. Como o governo já previu a possibilidade de déficit de R$ 60,2 bilhões nas contas do ano, o relatório pode ser considerado velho porque leva em consideração o cumprimento da meta de superávit de R$ 24 bilhões em 2016.

Em meio à crise econômica, com aumento do desemprego, chamou atenção o fato de o governo ter projetado substancial aumento de R$ 4 bilhões com a arrecadação previdenciária. O Planejamento argumenta que o incremento foi motivado pela atualização de dados de janeiro, além de novos parâmetros da economia, como o reajuste do salário mínimo. Também foi revista para cima a previsão de despesas com benefícios da Previdência, em R$ 4 bilhões. Dessa forma, o governo conseguiu no relatório manter em R$ 129,7 bilhões a previsão do déficit da Previdência. Outros fatores de pressão para a elevação das despesas são gastos com abono salarial e seguro- desemprego, que subiram R$ 4,8 bilhões na projeção atual, comparado com o que estava previsto na Lei Orçamentária.

As despesas com pessoas e encargos foram elevadas em R$ 1,3 bilhão. A estimativa é que em 2016 o governo gaste R$ 255 bilhões para pagar servidores públicos. Outro item que pesou para as despesas obrigatórias ficarem mais salgadas foi a compensação ao INSS pela desoneração da folha de pagamento. Esse gasto, que o governo buscou reduzir no ano passado, subiu R$ 1,8 bilhão, para R$ 18,5 bilhões.

 

Redução

R$ 19,4 bi é a projeção do governo para a queda na arrecadação de tributos cobrados pela Receita Federal neste ano

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Planalto adia votação de mudanças no cálculo da dívida

Por: Daniel Carvalho, Carla Araújo e Igor Gadelha

 

Mobilizado desde o início da manhã, o Palácio do Planalto conseguiu ontem adiar por mais uma semana a votação do Projeto de Decreto Legislativo (PDC) que susta parte do decreto da União que alterou o cálculo do indexador que corrige os contratos de renegociação da dívida de Estados e municípios. A apreciação do texto, que já h avia sido adiada da semana passada para esta, agora deve ocorrer na próxima terça-feira.

Em reunião com o ministro Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo) e líderes de partidos da base na Câmara, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, apelou para que os aliados tentassem derrubar o projeto na votação que estava prevista para a tarde. O ministro explicou aos líderes que o texto traz um risco fiscal "muito grande". O governo calcula que a aprovação do texto significaria uma perda de arrecadação de R$ 300 bilhões. Barbosa ainda telefonou para o governador de Santa Catarina, Raimundo Colombo (PSB), prometendo uma reunião da presidente Dilma Rousseff com os governadores nesta sexta-feira. Colombo, então, entrou em contato com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e com o deputado Esperidião Amin (PP-SC), autor do projeto, solicitando o adiamento da votação.

"Os governadores informaram que a presidente vai convocá-los para reunião a respeito do indexador da dívida dos Estados. Concordamos em adiar a votação", explicou Amin ao justificar o pedido de adiamento. A postergação foi vista como positiva, mas o governo evitou considerá-la uma vitória.  Após pressão dos governadores, o Planalto publicou decreto, ainda no final de dezembro, para regulamentar a troca do indexador de contratos de financiamento. Antes do decreto, esses contratos eram corrigidos pelo IGP-DI mais juros de 6% a 9%. Com a publicação da nova regra, ficou estabelecido como indexador o índice de inflação, o IPCA, mais 4% ao ano ou, a Selic, taxa básica de juros definida pelo Banco Central, se essa for menor.

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Governo e PT tentam reagir à pauta própria do Congresso

Bancada do PT no Senado quer priorizar votação de propostas como imposto maior para os mais ricos

Por: Ricardo Brito e Adriana Fernandes

 

O governo da presidente Dilma Rousseff e a bancada do PT no Congresso costuram uma forma de reagir à pauta independente de projetos econômicos que os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), pretendem votar no primeiro semestre. Por ora, no entanto, a reação do Executivo e dos parlamentares petistas não é articulada, mas visa a impedir a imposição de uma pauta que os dois peemedebistas têm defendido à revelia da orientação do Palácio do Planalto.

A avaliação de aliados dos dois peemedebistas é que o governo, em meio à crise que pode levar ao afastamento da presidente e ao agravamento da recessão, não tem tido capital político nem mesmo com o apoio do partido da presidente para levar a diante uma agenda econômica que recupere a confiança dos investidores e restabeleça um ambiente de segurança jurídica para os negócios.

A agenda de Renan e Cunha, conforme mostrou o Estado ontem, deverá conter propostas que contrariam as prioridades do governo ou do PT, como a concessão de independência ao Banco Central, a proibição de mudanças em contratos de concessão, a fixação de teto para o endividamento da União e as reformas tributária e previdenciária. Eles também querem uma pauta própria que privilegie Estados e municípios.

Na área econômica e no Planalto, a orientação é continuar a priorizar a aprovação neste primeiro semestre das propostas do ajuste fiscal, como a recriação da CPMF e a Desvinculação das Receitas da União (DRU), e ainda abrir caminho para tentar votar as futuras reformas fiscal e da Previdência.

Até o momento, porém, ainda não há uma articulação entre integrantes do governo para impedir o avanço das agendas de Renan e Cunha. "A estratégia é conversar", resumiu uma fonte do Palácio do Planalto. No Ministério da Fazenda, o discurso é o mesmo. Mas há uma percepção também no governo de que a investida contra a agenda econômica é mais na tentativa de isolar e desgastar a presidente num momento de desgaste político e embate com o PT.

O novo líder do governo no Senado, Humberto Costa (PT-PE), admitiu que a pauta costurada por Renan Calheiros tem uma visão "mais liberal". A bancada do PT, que Costa comandava até virar líder do governo, apresentou ontem ao presidente do Senadouma pauta de matérias para ser incluída na agenda "expressa" de votação.

A bancada listou como prioridades propostas que aumentam a cobrança de impostos dos mais ricos, como a tributação sobre lucros e dividendos e a instituição de um IPVA para transporte de luxo (lanchas, iates, etc). No encontro, Renan fez um aceno ao PT ao destacar que a pauta do partido será um "contraponto ao que já foi apresentado. "E preciso que todos os blocos partidários sejam respeitados", disse. No caso do projeto de independência do Banco Central, o PT ainda não afirmou o discurso. Humberto Costa afirmou que, mesmo com a mudança de Jucá - que incluiu a ideia do duplo mandato para o BC: controle da política monetária e garantia de empregos não acredita que a bancada apoiará a proposta. "Não acredito que, a princípio, isso mudaria a nossa opinião a favor da independência do BC, mas sem dúvida representaria um avanço importante", disse.

 

Negociação

''Não acredito que, a princípio, isso (o estabelecimento de um duplo mandato para o Banco  Central) mudaria a nossa opinião a favor da independência do BC, mas sem dúvida representaria um avanço importante."

Humberto Costa

LÍDER DO GOVERNO NO SENADO

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