O globo, n. 30.157, 01/03/2016. País, p. 6

MPF apura se Lula recebeu vantagens no cargo

Ex-presidente decide não depor sobre reformas em tríplex; para procuradores, investigação deve ser federal

Por: Carolina Brígido/ Cleide Carvalho/ Luiza Souto

 

- BRASÍLIA E SÃO PAULO- O Ministério Público Federal suspeita de que o ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu vantagens pessoais de empreiteiras — as reformas no sítio em Atibaia e no tríplex no Guarujá, ambos em São Paulo — enquanto exercia o mandato. A informação está em um ofício assinado pelo coordenador da força- tarefa da Operação LavaJato, o procurador da República Deltan Dallagnol, e pelos demais integrantes do grupo.

O documento foi enviado ontem ao Supremo Tribunal Federal como resposta do MP a pedido feito por Lula na sexta-feira. O ex- presidente quer que as investigações contra ele sejam suspensas até a definição sobre que órgão é indicado para conduzir os casos: se o Ministério Público de São Paulo ou o Ministério Público Federal. A defesa de Lula também pede que as apurações saiam do âmbito da Lava- Jato.

“Importante considerar ainda que parte das vantagens, que constituem o objeto da investigação, foram supostamente auferidas pelo suscitante durante o mandato presidencial, o que justifica, por si só, a competência federal”, diz o ofício de Dallagnol.

Ontem, os advogados de Lula e Marisa Letícia informaram que o casal não vai comparecer ao depoimento marcado para quinta- feira pelo promotor Cássio Conserino, de São Paulo, na investigação sobre o tríplex no Guarujá. Os advogados protocolaram no Ministério Público de São Paulo explicações por escrito e impetraram habeas corpus no Tribunal de Justiça de São Paulo para que o casal não seja levado a depor coercitivamente.

“O comparecimento seria um ato meramente formal. E, pela lei, a condução coercitiva serve somente para vítima e testemunha, então ele não poderia obrigálos a depor”, escreveu o advogado de Lula, Cristiano Zanin. A defesa diz ter receio de novos enfrentamentos entre militantes petistas e anti- Lula. Afirma também que, além do receio relacionado à segurança do casal, há considerações de “ordem pública” na decisão de não comparecer para depor.

Em nota, os promotores Cassio Conserino e Fernando Henrique de Moraes Araújo informaram que não tinham a intenção de conduzir Lula coercitivamente, e atribuíram o pedido a possível erro: “Talvez tenham utilizado modelo padrão para notificação de testemunhas, uma vez que nessa hipótese é possível”.

Na defesa por escrito, os advogados afirmam que Lula só soube da compra do sítio ( por Fernando Bittar e Jonas Suassuna) em 13 de janeiro de 2011, dois dias antes de ir pela primeira vez ao local. O imóvel tinha apenas dois quartos e as condições eram precárias. Por isso, segundo a defesa, o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo da família, ofereceu a reforma. “Depois, diante de algumas dificuldades técnicas, a obra foi concluída por uma empresa situada a cerca de 50 km do sítio Santa Bárbara”, diz o documento. A defesa não informa qual foi a empresa. Pelas investigações, Odebrecht e OAS bancaram a reforma.

No STF, o pedido de Lula está nas mãos da ministra Rosa Weber. Se ela conceder a liminar, as investigações estarão suspensas até o julgamento final da ação e o ex- presidente ficará livre de prestar depoimento ao Ministério Público de São Paulo sobre o caso tríplex.

A defesa alega que o objeto das investigações do MP de São Paulo e do MPF é o mesmo, e que uma pessoa não pode ser investigada pelo mesmo fato em dois processos. No entanto, Dallagnol explica que o Ministério Público de São Paulo investiga apenas as transferências de empreendimentos da Cooperativa Habitacional dos Bancários ( Bancoop) para a OAS. O caso do tríplex surgiu a partir dessa investigação, mas os procuradores já teriam transferido as suspeitas para o MPF, onde atua a Lava- Jato.

Dallagnol também afirmou que a força- tarefa da Lava- Jato apura “supostas vantagens indevidas recebidas pelo suscitante ( Lula)” — inclusive a respeito dos imóveis de Atibaia e de Guarujá. Portanto, seriam duas investigações diferentes. E, como há a suspeita de que Lula teria sido beneficiado durante o mandato, o foro federal é o mais adequado. Nesse caso, as investigações sobre os imóveis devem ficar no Paraná.

No pedido ao STF, a defesa volta a negar que Lula seja dono de qualquer das propriedades. E afirma que as apurações não guardam nexo algum com o escândalo da Petrobras.

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Janot pede nova investigação contra Cunha

Peemedebista tenta adiar julgamento e insiste em projetos que oneram governo

Por: Isabel Braga

 

- BRASÍLIA- O procurador- geral da República, Rodrigo Janot, pediu a abertura de nova investigação no Supremo Tribunal Federal ( STF) envolvendo o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ). O pedido de abertura de inquérito, segundo informou o “Jornal Nacional”, foi baseado na delação premiada dos empresários da Carioca Engenharia Ricardo Pernambuco Júnior e Ricardo Pernambuco.

O Ministério Público quer apurar suspeita de crime de corrupção e lavagem de dinheiro. Segundo o “Jornal Nacional”, os procuradores querem apurar indícios de que Cunha teria solicitado propina do consórcio formado pelas empreiteiras Odebrecht, OAS e Carioca Christiani Nielsen Engenharia, que atuavam na obra do Porto Maravilha. De acordo com a assessoria de Cunha, ele ainda não foi notificado do pedido da procuradoria.

Enquanto age no STF para tentar adiar o julgamento de amanhã em que os ministros podem decidir torná- lo réu por envolvimento no escândalo da Petrobras, o presidente da Câmara insiste na votação de propostas que podem aumentar o rombo orçamentário do governo. Cunha marcou sessão extraordinária hoje para votar a proposta que susta o decreto presidencial que alterou regras para o cálculo da dívida de estados e municípios.

Se a denúncia for recebida pelo STF, o inquérito contra Cunha será transformado em ação penal e ele será o primeiro réu da Lava- Jato com foro especial. O inquérito investiga se Cunha recebeu propina de US$ 5 milhões. Os advogados alegam que, antes desse julgamento, o tribunal precisa analisar, em sessão prévia, dois recursos apresentados por Cunha. A decisão de adiar ou não o julgamento caberá ao relator da Lava- Jato no STF, ministro Teori Zavascki.

Enquanto isso, Cunha também insistirá na apreciação de emenda constitucional que amplia gradualmente o piso que o governo federal tem de investir em Saúde. Cunha nega que esteja agindo para aprovar em plenário matérias que comprometem o caixa do governo em época de crise. Segundo ele, trata- se apenas de revogar um artigo que levou o governo a legislar por decreto, o que não pode ocorrer:

— Você não pode dizer que revogar um artigo de um decreto provoca despesas. O que está em discussão é que o decreto interpreta a lei de forma diferente. Isso é discurso de quem está ciente de que o decreto extrapolou sua razoabilidade e invadiu a interpretação da lei. O governo acabou legislando por decreto.

Cunha voltou a dizer que não vê problema em se manter na presidência da Câmara.

— Ao se tornar réu não significa que ninguém é condenado, significa apenas a continuidade da ação — insistiu ele.

Para mostrar determinação em manter o funcionamento da Câmara, Cunha disse que pretende levar a reforma tributária a plenário, após a Semana Santa. Também criou comissões para analisar a mudança na forma de licitação das áreas do pré- sal e o papel da Petrobras e para discutir a reforma da Previdência.

No STF, os advogados argumentam que a análise dos recursos não pode ocorrer na mesma sessão do julgamento da denúncia, “a fim de se evitar uma tramitação tumultuada do processo penal”. Segundo o pedido, o julgamento da denúncia só pode ocorrer se as provas já tiverem sido apresentadas. Como os recursos pendentes tratam da defesa, eles precisariam ser analisados antes pelo plenário.

O ministro Luís Roberto Barroso, do STF, negou ontem pedido de Cunha para impedir que o presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo ( PSD- BA), dê voto sobre o andamento do processo de sua cassação. ( Colaborou Carolina Brígido).

    Órgãos relacionados:

    • Câmara dos Deputados

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    Alckmin chama PSDB de 'partido-cartório'

    ‘ Não estamos acostumados com essa disputa democrática’ , diz governador sobre prévias

    Por: Silvia Amorim

     

    - SÃO PAULO- Antes mesmo de sair o resultado do primeiro turno das prévias do PSDB em São Paulo, os dois pré- candidatos derrotados, o deputado Ricardo Tripoli e o vereador Andrea Matarazzo, se uniram anteontem à noite e declararam guerra ao vencedor, João Doria, para o segundo turno da disputa.

    A ofensiva veio em forma de um pedido de impugnação da pré- candidatura de Doria por abuso de poder econômico, elaborado em conjunto pelas duas campanhas. A disputa deve bater às portas do PSDB nacional, caso a cassação de Doria seja deferida pelo diretório municipal. Os dirigentes da sigla convocaram reunião para ontem à noite, mas a decisão só deve ser anunciada nos próximos dias.

    O resultado do primeiro turno foi divulgado na madrugada de ontem, após votação marcada por pancadaria e apuração tumultuada. Doria ficou em primeiro lugar, com 43% dos votos dos 6.216 filiados, e disputará o segundo turno, no próximo dia 20, com Matarazzo, que somou 33%. Tripoli obteve 22%.

    Mais do que escolher o candidato do PSDB, a prévia está marcada por interesses na eleição de 2018. Doria é apoiado pelo governador Geraldo Alckmin, que quer se candidatar ao Planalto. Matarazzo tem a seu lado o senador José Serra, também com pretensões em 2018. É ainda apoiado pelo ex- presidente Fernando Henrique e o senador Aloysio Nunes.

    A expectativa agora é para a manifestação de apoio de Tripoli. Ele disse que vai se reunir com apoiadores para decidir. O clima é belicoso entre Doria e Matarazzo. Em uma rede social, o vereador se disse “indignado com o abuso do poder econômico, o uso da máquina pública” pelo adversário. Alckmin classificou como “ridículas” as acusações: “O problema é que ainda não estamos acostumados com essa disputa democrática. Estamos acostumados a ‘ partido- cartório’, de livro de ata, que decide o candidato em mesa de restaurante, com vinho importado”. ( Colaborou Stella Borges).

      Senadores relacionados:

      • Aloysio Nunes
      • José Serra