Correio braziliense, n. 19301, 30/03/2016. Política, p. 2

ALIANÇA DE 13 ANOS TERMINA EM 3 MINUTOS

CRISE NA REPÚBLICA » PMDB anuncia rompimento com Dilma Rousseff em solenidade rápida e procura o PSB, o PSDB e o DEM para discutir o cenário político e planejar o futuro. Kátia Abreu resiste em deixar o Ministério da Agricultura
Por: PAULO DE TARSO LYRA E GUILHERME WALTENBERG

PAULO DE TARSO LYRA

GUILHERME WALTENBERG

Especial para o Correio

 

Em uma solenidade que durou parcos três minutos, aos gritos de “Fora PT” e “Brasil para frente, Temer presidente”, o diretório nacional do PMDB sacramentou ontem o desembarque oficial do governo de Dilma Rousseff. O gesto político, a menos de três semanas da data prevista para que o processo de impeachment seja votado no plenário da Câmara, representa uma perspectiva concreta de mudança no eixo do poder. Hoje, o presidente nacional do PP, senador Ciro Nogueira (PI), terá um encontro com senadores e deputados da legenda para definir os rumos a serem tomados. Além de conversar com o PSDB e o DEM, Temer já procurou o PSB para sinalizar a disposição ao diálogo. “Temer precisará fazer uma ampla coalizão nacional. Se ficar no varejo, cai em seis meses”, alertou um deputado do PSDB.

O encontro com o PSB foi institucional. Temer convidou o presidente nacional da legenda, Carlos Siqueira, para uma reunião na noite de segunda-feira. “Falamos sobre a conjuntura econômica e política. Temer me disse que tentou manter o diálogo com a presidente Dilma e que não foi possível. Mas que gostaria de deixar um canal de comunicação com o PSB.” Siqueira reconheceu que existe uma possibilidade de mudança de governo. “Mas nós só aceitaremos conversar em torno de um eixo programático, com projetos estruturantes para o país”, disse ele.

A reunião do diretório nacional ontem também serviu como uma tentativa para o próprio PMDB mostrar que tem um plano para o país. “A população brasileira não aguenta mais a situação econômica. Estamos no terceiro ano de recessão, o desemprego só aumenta. E o governo não tem um projeto para nos tirar da crise. O PMDB tem”, disse ao Correio o presidente da Fundação Ulysses Guimarães, Moreira Franco, referindo-se ao programa Uma ponte para o futuro.

Líder do PP na Câmara, o deputado Aguinaldo Ribeiro (PB), disse que o partido vai se reunir hoje para definir o caminho. Mas defende que a legenda não fique atrelada ao caminho tomado pelo PMDB. “Não podemos pautar nossas decisões com base nas escolhas de outros partidos.” Ele também sugere que haja uma orientação partidária em relação ao processo de impeachment. “Liberar totalmente a bancada representaria um enfraquecimento partidário”, acredita Ribeiro.

 

Bolsa

A grande questão no momento é que, mesmo sem a caneta em mãos, o PMDB de Temer se transformou em polo de atração. A bolsa de valores subiu com a decisão de rompimento dos peemedebistas e atingiu 52 mil pontos no meio da tarde. “Hoje, o mercado compra um carro velho vendido pelo PMDB. Pode ser que, lá na frente, cheguemos à conclusão de que o carro não é essa coisa toda, engasga, consome muito. Mas, hoje, a aposta é nesse carro”, disse um analista de mercado, pedindo sigilo.

“O governo só tem chances de vitória contra o impeachment se conseguir demonstrar que tem votos para barrá-lo, se possível ainda na Câmara. A luta agora é para reverter a expectativa de poder”, disse um peemedebista, que ainda se mantém fiel ao Planalto. Foi essa perspectiva de que Temer está mais próximo de chegar ao Planalto do que Dilma de permanecer nele que virou, por exemplo, os votos do diretório do PMDB no Rio.

Anotações às quais o Correio teve acesso mostram que, até a quinta-feira da semana passada, 12 dos 14 votos do diretório fluminense eram favoráveis a Dilma. Mas o presidente estadual do PMDB do Rio, Jorge Picciani, deseja manter o filho Leonardo na liderança da bancada e ampliar os espaços no governo federal, restrito hoje ao Ministério de Ciência e Tecnologia. “O diretório do Rio é hoje o maior do país. Eles querem negociar mais prestígio em um eventual governo Temer”, reconheceu um cacique do partido.

Por enquanto, a ordem é entregar todos os cargos. Henrique Eduardo Alves (RN) já deixou o Turismo. Eduardo Braga, Minas e Energia, e Mauro Lopes, Aviação Civil, sinalizaram que farão isso em breve. “Se, individualmente, alguém quiser ocupar uma posição, vai ter que avaliar o tipo de consequência e o tipo de costura que vai ter com a sociedade”, afirmou o senador Romero Jucá (RR), vice-presidente do PMDB.

O deputado Osmar Terra (PMDB-RS) focou o discurso na atual ministra da Agricultura, Kátia Abreu. Mais cedo, em entrevista a rádio, a ministra mostrou-se contrariada com a hipótese de deixar o cargo. Ela mantém uma boa relação com a presidente Dilma Rousseff. “Ela tem que sair do partido, se não sair do governo, sai do partido. Ela não tem apoio para isso, no PMDB não tem nenhum”, bradou Terra.

“O PMDB foi apenas utilizado nesse tempo todo de aliança para votar as matérias que eles decidiam, nunca para participar de formulação de nada. Não tem sentido de o PMDB ficar sócio de um governo impopular com medidas que não concordamos”, criticou o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

 

Frases

“A população brasileira não aguenta mais a situação econômica. Estamos no terceiro ano de recessão, o desemprego só aumenta”

Moreira Franco, presidente da Fundação Ulysses Guimarães

 

“Se, individualmente, alguém quiser ocupar uma posição, vai ter que avaliar o tipo de consequência e o tipo de costura que vai ter com a sociedade”

Romero Jucá, senador e vice-presidente do PMDB

 

“Não tem sentido de o PMDB ficar sócio de um governo impopular com medidas que não concordamos”

Eduardo Cunha, presidente da Câmara