Correio braziliense, n. 19300, 29/03/2016. Política, p. 2

PMDB DÁ INÍCIO AO DESEMBARQUE DO GOVERNO

CRISE NA REPÚBLICA » Na véspera de o partido anunciar o rompimento com Dilma, Henrique Eduardo Alves pede demissão do Ministério do Turismo. Decisão do partido de deixar a base de apoio será tomada por aclamação
Por: PAULO DE TARSO LYRA, JULIA CHAIB E MARCELLA FERNANDES

PAULO DE TARSO LYRA

JULIA CHAIB

MARCELLA FERNANDES

 

O PMDB sacramenta hoje, em reunião do diretório nacional, o desembarque do governo federal. Ontem mesmo o ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves, entregou a carta de exoneração.  A decisão será por aclamação, para mostrar uma coesão interna rumo ao pós-Dilma Rousseff e para esconder do Planalto o tamanho do PMDB que ainda pode ser pressionado na batalha para se evitar o impeachment.

Principal beneficiário, o vice-presidente Michel Temer sequer aparecerá na reunião, para não dar argumentos aos adversários de que é um “conspirador contra a democracia”. Além de Temer, o Presidente do Senado,Renan Calheiros (PMDB-AL), que concordou com a decisão por aclamação no encontro de hoje, não comparecerá.

Os ministros que se sentirem constrangidos com o rompimento também estão liberados de comparecer ao encontro, mas terão até 12 de abril para deixar os respectivos cargos — é quando se completam 30 dias desde a convenção do partido. Diretores de estatais e de bancos públicos também seguirão o mesmo caminho. Apadrinhados do PMDB que estiverem no segundo e terceiros escalões estão autorizados a permanecer onde estão.

A proposta de abandonar a disputa no voto e partir para o consenso foi discutida com Temer em encontro entre o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE), e pelo vice-presidente do partido, senador Romero Jucá (RR), na noite de domingo. Temer sugeriu a ambos que procurassem Renan, já que, além dos ministros, ele era a maior resistência até então. Os senadores fizeram isso na tarde de ontem. E só após o aval do parlamentar alagoano Temer se deslocou para a residência oficial do Presidente do Senado para selar o acordo.

O primeiro ministro a abandonar o barco foi o ex-presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). Em carta entregue ontem à presidente Dilma, Henrique agradeceu à petista pela confiança e “respeitosa relação” que tiveram por 11 meses, antes de explicar a razão da demissão. “Pensei muito antes de fazê-lo, considerando as motivações e desafios que me impulsionaram a assumir o ministério. Mas o momento nacional coloca agora o PMDB diante do desafio maior de escolher o seu caminho”, afirma Henrique na carta. O peemedebista diz que o diálogo “se exauriu”.

O posicionamento de alguns ministros ainda suscita dúvidas no PMDB. A principal incógnita é como se comportará a ministra da Agricultura, Kátia Abreu. Amiga pessoal da presidente, ela tem sido muito pressionada pelos ruralistas a deixar o governo. Há pouco menos de um mês pensou seriamente nessa possibilidade, especialmente após a sinalização de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva assumiria um cargo no Executivo Federal.

Ela então teria o salvo-conduto para deixar o ministério e voltar ao Senado para votar contra o impeachment, alegando que a coalizão ficara para trás e havia se transformado em um governo militante. Mas Kátia balança, por ser fiel à presidente. Poderá até reassumir o mandato de senadora e lutar contra o afastamento da presidente. Mas são grandes as chances de ela deixar o PMDB e retornar ao PSD.

Os outros dois ministros que geram expectativas são Eduardo Braga (Minas e Energia) e Marcelo Castro (Saúde). Braga tem feito discursos explícitos a favor da democracia, mas não deve ter dificuldades em acompanhar a decisão partidária. Não agrada a Castro deixar o ministério, mas ele já recebeu sinais do Planalto de que Dilma deseja que ele entregue o posto. O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), criticou a resistência de ministros da legenda em deixar as pastas. “Vai parecer que estão apegados aos cargos e que os cargos são mais importantes que o interesse partidário”, afirmou.

 

Quem é quem

Confira o que pensa cada um dos ministros do PMDB

 

Eduardo Braga, Minas e Energia

O ministro faz um discurso em defesa da democracia, da institucionalidade, mas vai acompanhar o partido sem traumas se a decisão for pelo desembarque

 

Kátia Abreu, Agricultura

Está pressionada pela base ruralista, que classifica o atual governo de militantes, após a entrada de Lula. Foi aconselhada a acompanhar o partido, mas pode se recusar a deixar o cargo ou ir para o PSD, pela amizade que nutre por Dilma.

 

Helder Barbalho, Portos

Filho do senador Jader Barbalho, que resistia à tese de o partido deixar o governo. Mas por ser fiel à legenda e à maioria partidária, se a decisão for por aclamação, não deve apresentar empecilhos ao desembarque

 

Henrique Eduardo Alves, Turismo

Pediu exoneração ontem. Foi para o governo por não ter mandato e para garantir o foro privilegiado. É presidente do diretório do Rio Grande do Norte e terá dificuldades para se contrapor a uma decisão partidária

 

Celso Pansera, Ciência e Tecnologia

Indicação pessoal do líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani. Não lhe agrada deixar o ministério, mas não tem força para comprar uma briga com o diretório do PMDB fluminense

 

Marcelo Castro, Saúde

Também indicação de Leonardo Picciani. Da mesma forma que Henrique, é presidente do diretório stadual do PMDB piauiense e enfrenta pressão das bases eleitorais. Dilma sinaliza para ele entregar o cargo

 

Mauro Lopes, Secretaria Nacional de Aviação Civil

Está em fim de carreira e já havia dito a interlocutores que ser ministro coroaria a trajetória política. Foi nomeado à revelia da direção partidária. O diretório de Minas apoia o rompimento