Título: Falta de governo assusta BCE
Autor: Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 05/10/2011, Economia, p. 10

Bruxelas ¿ A menos de um mês para deixar o cargo, o presidente do Banco Central Europeu (BCE), o francês Jean-Claude Trichet, atacou ontem os governos da Zona do Euro pela incapacidade de tomar ações efetivas que ponham fim à crise que, a cada dia, empurra a região para a recessão. As críticas endossam a visão dos analistas, que veem na falta de líderes o pior dos problemas da Europa. Nem o presidente da França, Nicolas Sarkozy, nem a chanceler alemã, Angela Merkel, têm mostrado capacidade suficiente para unir os 17 países do bloco em torno de uma solução definitiva para a crise da Grécia, que pode arrastar para o buraco Itália, Portugal, Espanha e Irlanda. No mercado, os governantes são vistos como zumbis, definição que inclui o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama.

"Temos um grande problema de governabilidade", advertiu Trichet, em seu último pronunciamento no Parlamento Europeu. Segundo ele, apesar de todos os alertas, não se vê um movimento efetivo para reverter o excessivo nível de endividamento dos países. Ele ressaltou que, em junho, sugeriu a criação de um ministério das Finanças da Zona do Euro, que ficaria encarregado de supervisionar o orçamento dos países integrantes da união monetária. Mas não foi ouvido.

Trichet, cujo mandato de oito anos à frente do BCE terminará em 31 de outubro, afirmou que fez seguidas advertências sobre a gestão da crise, mas de pouco adiantou. "Houve um processo contínuo de mensagens aos governos", ressaltou. A seu ver, as posições do BCE não devem ser vistas como pressão, mas como alertas importantes. "Não ditamos nada, esse não é o nosso papel", emendou.

Já em processo de despedida, Trichet, que será substituído pelo italiano Mario Draghi, aproveitou o discurso no Parlamento para defender o BCE das críticas por causa do programa de compra de títulos de governos em dificuldades com o objetivo de baixar as taxas de juros. "Algumas vozes dizem que fomos longe demais, outras dizem que fomos pouco. Temos o cuidado de sermos o mais prudente possível", disse. "Negar a realidade da crise mais grave desde a Segunda Guerra Mundial seria um erro terrível", assinalou.

Acusado frequentemente de ser mais severo com os governos do que com os bancos, Trichet disse que as instituições financeiras devem mudar suas regras de funcionamento. "São necessárias mudanças drásticas. Não somos complacentes com eles (bancos). Continuamos pedindo que reforcem seus fundos próprios, que não se comprometam com pacotes de compensação de governo."