Valor econômico, v. 3956, n. 16, 04/03/2016. Política, p. A12

Cunha torna-se réu em decisão unânime

Por: Carolina Oms

Por Carolina Oms | De Brasília

 

O Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou ontem a abertura de ação penal contra o presidente da Câmara,Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Com a decisão unânime, ele será réu em ação penal da Operação Lava-Jato eprocessado por suposto uso do cargo para pressionar empresas a pagar propina em dois contratos com aPetrobras.

Todos os ministros, no entanto, rejeitaram a parte da denúncia que apontava participação no acerto inicial para os desvios nos contratos de navios-sonda, que teriam ocorrido entre 2006 e 2007, recomendando que a denúncia seja acolhida parcialmente. A parte não aceita da representação estava lastreada apenas em delações premiadas. Ainda assim, o procurador-geral, Rodrigo Janot, saiu satisfeito do tribunal: "Foi ótimo, primeira denúncia da Lava-Jato recebida."

O STF também aceitou a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra a ex-deputada Solange Almeida. À PGR, a atual prefeita de Rio Bonito (RJ) apresentou requerimentos na Comissão de Fiscalização eControle da Câmara usados por Cunha para pressionar pelo pagamento de propina.

Os ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli foram vencidos ao discordar da inclusão de Solange. Assim como Celso de Mello, Toffoli e Gilmar não anteciparam seus votos ontem, seguindo sugestão do presidente da Corte,Ricardo Lewandowski, para evitar que a sessão terminasse muito tarde devido ao voto do relator, Teori Zavascki.

Apesar de avaliar que os elementos apresentados pela PGR ainda não são suficientes para uma condenação, Toffoli opinou favoravelmente pelo prosseguimento das investigações.

O ministro Gilmar Mendes aproveitou o seu voto para fazer críticas indiretas ao PT. Para ele, o "petrolão é o filhote maior do mensalão". Sem citar o partido que governa o Brasil há mais de uma década, Mendes afirmou que "petrolão e mensalão se tornaram modo de governança no país".

Em um dos votos mais incisivos do julgamento, o ministro Celso de Mello disse estar cada vez mais convencido de que "os fatos delituosos objetos de investigação no âmbito da Lava-Jato nada mais constituem que episódioscriminosos, fragmentos delinquenciais que compõem um vasto painel do assalto e da tentativa de captura do Estado e de suas organizações por uma dada organização criminosa identificada por um contexto de umdenominador comum entre petrolão e mensalão".

O voto de Teori já havia sido seguido pelos ministros Rosa Weber, Cármen Lúcia, Roberto Barroso, Edson Fachin e Marco Aurélio. Luiz Fux está fora do país e não participou das sessões.

A decisão de ontem enfraquece Cunha e dá fôlego às tentativas de tirá-lo da presidência da Câmara. Além do processo em tramitação no Conselho de Ética da Câmara, Janot pediu que o STF afaste o deputado. O pedido, no entanto, não tem data para ser analisado. Pela primeira vez um presidente da Câmara responderá a um processo criminal.

O presidente do Senado, Renan Calheiros, tem seis inquéritos tramitando contra ele somente na Operação Lava-Jato, mas só é réu em uma ação de improbidade, que corre na área cível, onde o julgamento é feito pela Justiça de primeira instância e não pelo STF. O julgamento de Renan nesta ação ainda não tem data prevista.

Cunha afirmou ontem que "o Supremo já afastou 70% das acusações da denúncia e não existem elementos das demais acusações".