O globo, n. 30197, 30/04/2016. País, p.6

Cardozo pede que tucano se afaste de relatoria de comissão

Ministro diz que Anastasia pertence ao partido de autor do processo

O advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, defendeu a presidente Dilma na comissão do impeachment e questionou a isenção do relator, o tucano Antonio Anastasia. O advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, anunciou ontem que questionará formalmente à comissão especial do Senado que analisa o impeachment a eleição do senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) como relator do processo contra a presidente Dilma Rousseff. Cardozo vai apresentar até segunda-feira recurso pedindo a “suspeição regimental” de Anastasia, alegando que o PSDB controla todo o processo. Segundo o advogado-geral, o PSDB seria um dos autores do pedido, o que geraria a suspeição. A tática da defesa e dos senadores ligados a Dilma, em especial do PT, foi tentar desgastar Anastasia.

JORGE WILLIAMSegredo. O advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, cochicha com relator da comissão, Antonio Anastasia

Após os representantes da acusação terem falado na comissão na quinta-feira, ontem foi a vez de Cardozo e os ministros Nelson Barbosa (Fazenda) e Kátia Abreu (Agricultura), durante mais de nove horas, fazerem a defesa de Dilma. Eles afirmaram não haver crime de responsabilidade.

"SUSPEIÇÃO OBJETIVA"

Cardozo afirmou que, pelo fato de o jurista Miguel Reale Jr. ser filiado ao PSDB — tendo sido ministro da Justiça no governo Fernando Henrique Cardoso — e da jurista Janaina Conceição Paschoal ter sido contratada pelo partido para fazer um parecer sobre a viabilidade ou não do impeachment, a legenda deveria ser reconhecida como autora do pedido, gerando a suspeição de Anastasia.

— Não pode, com todas as vênias que tenho para com o senador Anastasia, alguém do mesmo partido relatar este processo. Há uma suspeição objetiva — afirmou Cardozo. — Um partido não pode tomar conta de um processo de impeachment dessa maneira. Não é correto do ponto de vista ético nem regimental.

O presidente da comissão, Raimundo Lira (PMDB-PB), reiterou que um eventual impedimento de Anastasia já foi rejeitado pela comissão. Os senadores petistas também fizeram ataques ao tucano. Ao final da sessão, Anastasia disse que essa polêmica já foi superada e disse que vem sendo vítima:

— É bom lembrar que o STF , quando julgou o rito como um todo, entendeu que nenhum parlamentar tem impedimento. Já houve decisão do Senado, por larga maioria, de que não há impedimento.

Outro ponto de polêmica foi sobre a ampliação ou não da denúncia. Anastasia disse que citará a Operação Lava-Jato em seu parecer a ser entregue na próxima quarta-feira, sem dar mais detalhes. A tendência é que repita o que ocorreu na Câmara, onde o assunto foi mencionado, mas não foi incluído na denúncia.

Após se encontrar com o ministro do STF Ricardo Lewandowski no fim da tarde de ontem, Raimundo Lira disse que só serão consideradas pelo Senado as denúncias aceitas pela Câmara dos Deputados — ou seja, uma “pedalada” fiscal envolvendo o Plano Safra no Banco do Brasil e a edição de decretos de créditos suplementares sem o aval do Congresso Nacional. O parlamentar negou a possibilidade de indícios da Lava-Jato serem incluídos no processo.

POLÍTICA FISCAL CRIMINALIZADA

José Eduardo Cardozo disse que, se quiserem incluir a LavaJato, conseguirão a “nulidade” do processo, argumentando que o STF já decidiu que a denúncia inclui apenas “pedaladas” e decretos orçamentários.

O ministro Nelson Barbosa foi o primeiro a falar, fazendo uma exposição técnica sobre os decretos suplementares de 2015 e as “pedaladas fiscais” do mesmo ano, temas que embasam a denúncia. Ele afirmou que nos dois casos houve mudança de jurisprudência do Tribunal de Contas da União (TCU) e que o governo federal passou a adotar os procedimentos recomendados quando a decisão da Corte foi definitiva. Disse esperar que os senadores compreendam a inexistência de qualquer crime que tenha sido praticado pela presidente e fez um desabafo ao final da reunião:

— Devido ao clima generalizado de criminalização da política fiscal, o governo hoje está de mãos atadas e não pode hoje ajudar a economia. Não devemos criminalizar a política fiscal. Os governadores estão certos e por isso os Tribunais de Contas não os penalizaram e isso também revela a correção da presidente. É preciso ter os mesmos pesos e medidas para analisar as contas federais e as estaduais. A vítima não é só a presidente, é a população brasileira.