O globo, n. 30.212, 25/04/2016. Opinião, p. 17

SAÍDA DE EMERGÊNCIA

Liberar a União de gastos obrigatórios, temporariamente, é saída emergencial para estancar colapso das finanças públicas

Q ualquer que seja o desfecho do processo de impeachment — embora o mais provável seja mesmo o afastamento da presidente Dilma — daqui para frente todos os governantes pensarão mil vezes antes de sair chutando o balde nas finanças públicas, como ocorreu em 2013/ 2014. Joaquim Levy, que era uma das pessoas mais indicadas para promover o ajuste à frente do Ministério da Fazenda, preferiu jogar a toalha. Nelson Barbosa foi tocando como pôde e agora certamente o que vem por aí é alta de impostos, dentro de um programa de emergência nacional que virá certamente acompanhado de pedidos de desculpas por parte do presidente em exercício Michel Temer na segunda quinzena de maio.

Governadores e prefeitos só não embarcaram nessa mesma canoa porque já não contam mais com bancos públicos para se apoiarem. Mesmo assim, vários empurraram o rombo para a frente atrasando pagamentos de fornecedores ou inflando a conta de “restos a pagar”. As reformas estruturais têm sido proteladas porque campanhas políticas populistas as associaram a um discurso neoliberal, de direita, ainda que o seu propósito seja exatamente o de evitar que a economia passe por situações semelhantes como o atual. Se ficarmos de braços cruzados, chegaremos a um ponto que os velhinhos aposentados serão “caçados” e “abatidos” nas ruas, especialmente se forem servidores inativos.

No plano emergencial o que pode ser feito por um governo interino, ao menos enquanto o Senado não der o veredicto final sobre o impeachment, é a chamada Desvinculação das Receitas da União ( DRU) em um considerável percentual. Por esse mecanismo, a União fica desobrigada de gastar obrigatoriamente quase 90% das receitas em áreas pré- definidas, impedindo que se faça um remanejamento provisório de uma para outra. Sem essa flexibilidade, fica inviável se acertar as finanças públicas em um quadro de estagnação econômica. Para o lançamento do Plano Real, isso também foi feito.

É possível

Se bem administrado, uma rede hospitalar filantrópica pode ser financeiramente autossustentável. É o que vem provando na prática o Hospital São José, no Rio. Junto com o Santa Catarina, em São Paulo, o São José gera os superávits necessários para garantir o restante da rede ( 33 unidades, em sete estados) mantida por uma congregação de irmãs, em Petrópolis. Lá a congregação mantém um hospital ( Santa Teresa) que se tornou referência na Região Serrana. Cirurgias ortopédicas às vezes levam pacientes a fazer caminho inverso, da capital para o interior.

O São José está no grupo “top” de hospitais da Zona Sul do Rio, posição que divide com o Samaritano, o pró- Cardíaco e a Clínica São Vicente. Mas para garantir os superávits financeiros — assim como o Santa Catarina — o São José não consegue atender pacientes do Sistema Único de Saúde, função que fica a cargo do restante da rede. A gestão do São José é profissional. Paulista de Guaratinguetá, Nélisson do Espírito Santo passou cinco anos em um hospital da rede em Teresópolis. Há três está no Rio, cuidando da administração e das finanças do São José. A parte médica fica a cargo do cardiologista Augusto Neno.

Na praia

Ainda há espaço para hotéis de porte médio, ou grandes, administrados pelos donos, sem vinculação com redes internacionais ou nacionais? O Praia Ipanema Hotel manteve essa opção, mas a nova geração da família que está à frente do hotel percebeu que tinha de oferecer algo a mais para atrair hóspedes. De origem síria, a família proprietária do hotel começou nos negócios com uma loja de tecidos na Rua da Alfândega, na região conhecida como Saara ( o nome é apenas uma alusão ao enorme deserto, pois é a sigla de Sociedade dos Amigos das Adjacências da Rua da Alfândega). A segunda geração passou a investir em imóveis, quando surgiu a oportunidade de construir o primeiro hotel da orla de Ipanema, o Sol. Aprenderam com a experiência e construíram o Praia décadas atrás.

A quarta geração assumiu, reformou o restaurante e criou área para reuniões e pequenas convenções de executivos. O próximo passo é abrir uma varanda do bar para a rua, no térreo. Querem ser conhecidos como “ipanemenses”, ou seja, como um hotel capaz de dar todas as dicas sobre a vida do bairro. A estratégia parece estar dando certo, pois têm mantido ocupação média acima de 70%.

Na “UTI”

A crise econômica vem multiplicando o número de empresas que buscam reestruturar dívidas, por meio de negociação. Algumas consultorias até se especializaram nesse trabalho. A Alvarez& Marsal, uma das principais, está envolvida diretamente com 35 desses processos, além de cinco outros já na fase de recuperação judicial. Eles sempre recomendam aos clientes que tentem a restruturação numa fase em que isso ainda é possível. Mas muitos preferem esticar a corda até chegar à recuperação judicial, a antiga concordata, quando tudo fica mais demorado e geralmente mais doloroso.