O globo, n. 30.207, 20/04/2016. País, p. 12

Direito ao esquecimento não pode ser censura, diz Barroso

Ministro do Supremo defende permanência de textos na internet

“Retirar matéria é censura. Matéria foi escrita e vai existir sempre” Luís Roberto Barroso Ministro do Supremo Tribunal Federal

-BRASÍLIA- O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), defendeu ontem que o chamado direito ao esquecimento não pode ser usado como desculpa para retirar do ar uma matéria jornalística publicada na internet. Segundo ele, isso é censura. O ministro é relator de uma ação da Editora Abril contra uma decisão da 7ª Vara Cível da Comarca do Rio de Janeiro, mantida pelo Tribunal de Justiça (TJ) do estado, determinando a exclusão de uma reportagem no site da revista “Veja Rio”. Em dezembro, ele deu uma liminar favorável à editora e, ontem, a Primeira Turma do STF começou a discutir a questão.

DIVULGAÇÃO/STFDefesa. O ministro Luís Roberto Barroso, do STF, afirma que obrigar a retirada de matéria jornalística publicada na internet é forma de censura

REFERÊNCIA: DECISÃO NA EUROPA

Barroso fez uma referência à decisão tomada em 2014 pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, determinando que os cidadãos do continente podem pedir aos sites de buscas que removam links sobre si considerados “irrelevantes, inadequados ou desatualizados”. Barroso lembrou, porém, que a ação na Europa diz respeito aos sites de busca, e não àqueles onde as matérias foram publicadas.

— Retirar matéria é censura. Matéria foi escrita e vai existir sempre. A discussão que ocorreu na Corte de Justiça europeia foi a de retirar a referência em site de busca. A referência era movida contra o Google. E a referência e o pedido não era para retirar matéria, porque retirar matéria sempre será censura — disse Barroso.

O ministro destacou que não viu erros no texto publicado, e que os questionamentos de Pierre Constâncio Mello Mattos Thomé de Souza, retratado na reportagem intitulada “Um bicão na alta-roda”, ocorreram pelo enfoque dado pela revista, com comentários críticos.

— Aqui, nesse fato concreto, é uma matéria que descreve uma personalidade e faz comentários críticos. Acho até que não são ofensivos. Então, você achar que pode suprimir a matéria que foi escrita, isso é censura. Isso não é nem direito ao esquecimento. Direito ao esquecimento é uma postulação de retirar do site de busca — afirmou o ministro.

A reportagem, publicada pela revista “Veja Rio” em junho de 2013, traçava um perfil de Pierre Thomé de Souza, carioca especializado em relações pessoais (segundo sua própria definição), que conseguia circular entre personagens famosos como os atores Arnold Schwarzenegger e Will Smith e o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama.

Barroso acrescentou que, caso haja erro, a pessoa pode pedir a retificação.

— A censura virtual ou a censura de papel é a mesma coisa. Agora, se tiver um erro, você tem direito à retificação, você tem o direito de resposta — afirmou Barroso.

“PRESERVAÇÃO DA IMAGEM E DA HONRA”

O julgamento na Primeira Turma foi suspenso por um pedido de vista do ministro Luiz Fux. Em fevereiro, o Ministério Público Federal (MPF) tinha se posicionado pela rejeição do recurso da Abril. Em parecer, o subprocurador-geral da República Paulo Gustavo Gonet Branco destacou que a decisão da Justiça do Rio não se baseou na Lei de Imprensa, revogada pelo próprio STF em 2009.

“Diferentemente, cingiu-se a reconhecer que a matéria jornalística, publicada em junho de 2013, teria exaurido seu papel de informação, não sendo razoável a manutenção da divulgação no sítio eletrônico da empresa reclamante. Reconheceu, ainda, ser aplicável ao caso o chamado ‘direito ao esquecimento’, para preservação da honra e imagem do ora interessado”, escreveu o subprocurador.