Título: Tribunais surgiram em 2010
Autor: Decat, Erich
Fonte: Correio Braziliense, 12/10/2011, Política, p. 2

Os países europeus que sediaram uma Copa do Mundo nos últimos 20 anos, como Itália (1990), França (1998) e Alemanha (2006), e as outras nações que receberam o megaevento no período, Estados Unidos (1994), Japão e Coreia do Sul (2002), foram dispensados da instalação de tribunais de exceção, estruturas paralelas de Justiça que a Federação Internacional de Futebol (Fifa) pressiona para ver implementadas no Brasil em 2014. A África do Sul estreou o modelo na Copa do ano passado e viveu uma série de confusões e distorções jurídicas.

Os africanos atenderam à imposição da Fifa e, agora, o governo brasileiro prepara o terreno para a instalação do mesmo modelo em 2014. A Lei Geral da Copa, em tramitação na Câmara, prevê a criação de juizados especiais, varas, turmas ou câmaras especializadas para o julgamento de demandas decorrentes do evento, de um simples furto a uma disputa comercial. Os tribunais a serem criados funcionariam independentemente da estrutura jurídica já existente.

O Correio mostrou ontem que esses tribunais de exceção são alvo de uma saraivada de críticas, inclusive no Supremo Tribunal Federal (STF). O ministro Marco Aurélio Mello disse ser "impossível" imaginar essa estrutura no Judiciário brasileiro. Já o ministro Gilmar Mendes considera que os tribunais concorreriam com os juizados especiais já criados, alguns dentro de estádios de futebol. Ontem, foi a vez de o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, criticar a proposta. "Isso não faz sentido, agride a soberania nacional. Os tribunais privilegiam os interesses da Fifa, que se acha a dona do mundo."

Encontros Um levantamento do Correio com especialistas em direito desportivo e profissionais que atuaram em Copas passadas revela que os tribunais de exceção só existiram na África do Sul. Uma legislação especial chegou a ser criada para garantir o funcionamento dessas câmaras. Uma das distorções registradas foi o tratamento diferenciado a turistas brancos e negros. As varas ficaram sobrecarregadas, como conta o advogado Eduardo Carlezzo, que esteve na África do Sul para a Copa do Mundo. Ele lembra que não conseguiu assistir a um jogo da semifinal porque o avião em que estava foi impedido de pousar na cidade de Durban, em função do congestionamento aéreo. "Pensei em acionar um desses juizados especiais, mas desisti depois de ver a bagunça que existia. Perdi o jogo e US$ 600, valor do bilhete."

A Fifa sustenta, em resposta ao Correio, que a iniciativa dos tribunais de exceção "partiu do próprio governo da África do Sul". "Segurança é um assunto que diz respeito ao país sede. A Fifa tem confiança nas autoridades brasileiras no que diz respeito a isso." Reuniões entre representantes da Fifa, da Casa Civil e do Ministério do Esporte, a partir de amanhã, vão definir ajustes na Lei Geral da Copa. "A Fifa está trabalhando em conjunto com as autoridades do país sede para chegar a uma solução apropriada que irá garantir o necessário para um evento bem sucedido e que, ao mesmo tempo, respeite a legislação local", diz a entidade.

O governo evita comentar o assunto. Os órgãos responsáveis atribuem uns aos outros a responsabilidade pela análise do tema. Advocacia-Geral da União (AGU) e Casa Civil, ligada diretamente à Presidência, sustentam que quem deve se pronunciar sobre os tribunais de exceção é o Ministério do Esporte. "A Lei Geral da Copa já contempla as exigências da Fifa", limita-se a dizer o ministério, por meio da assessoria de imprensa. A Alemanha, em 2006, modificou algumas leis em função da Copa . É o caso da suspensão temporária de um tratado que permite que cidadãos europeus circulem sem passaporte na Europa.

PF investigará Ricardo TeixeiraRicardo Teixeira, presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e do Comitê Organizador da Copa do Mundo de 2014, será alvo de inquérito da Polícia Federal. A corporação, que iniciará as investigações até o fim da semana, quer apurar a suspeita de remessa ilegal de dinheiro ao Brasil e lavagem de dinheiro. A abertura de inquérito foi pedida pelo procurador Marcelo Freire, do Ministério Público Federal do Rio de Janeiro, no fim de setembro. A investigação será centrada nas denúncias feitas pela emissora britânica BBC, de que Teixeira e dois integrantes do comitê executivo da Fifa teriam recebido propina, na década de 1990, da empresa de marketing ISL, falida em 2001. Teixeira nega as acusações.