Correio braziliense, n. 19303, 01/04/2016. Política, p. 6

Barbosa nega irregularidades

Marcella Fernandes

 

O governo começou a defesa da presidente Dilma Rousseff na comissão do impeachment com foco nos aspectos técnicos. O ministro da Fazenda e ex-titular do Planejamento, Nelson Barbosa, negou irregularidades em decretos suplementares editados pela Presidência e nas chamadas “pedaladas fiscais” — atrasos de repasses da União para bancos públicos. De acordo com os autores do pedido — os juristas Helio Bicudo, Janaína Paschoal e Miguel Reale Júnior — as manobras fiscais configuram crime de responsabilidade.

“Considero não haver base legal para o pedido de impedimento da presidente da República”, afirmou Barbosa, em audiência pública na comissão do impeachment. De acordo com ele, nenhum dos seis decretos mencionados modificou a programação financeira de 2015. “Você vai ao mercado com uma lista. No caminho, alguém liga e diz ‘em vez de comprar um quilo de arroz, compre dois’, mas você continua com 100 reais no bolso”, disse.

Barbosa destacou que os mecanismos fiscais estavam ainda de acordo com a interpretação do Tribunal de Contas da União (TCU) à época. E que o governo acatou o entendimento adotado a partir de 2015. Até o primeiro semestre de 2014, a conta de suprimentos, usada para equilibrar repasses entre a União e bancos públicos, tinha saldo excessivamente negativo para União, mas no mesmo ano o governo zerou o saldo, segundo o ministro.

Barbosa destacou que as acusações aceitas pela Câmara se referem ao atual mandato da petista, conforme pedido aceito pelo presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), em dezembro, quando determinou “não ser possível a responsabilização da Presidente da República por atos anteriores ao mandato vigente”. Ontem, Cunha afirmou que a comissão tem autonomia para mudar a abrangência de datas.

Doutor em direito tributário, o professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) Ricardo Lodi Ribeiro reforçou a defesa feita por Barbosa. “O parlamento não está autorizado a suprimir o mandato da presidente da República. Falta de apoio no parlamento, impopularidade ou o conjunto geral da obra não objeta pedido de impeachment”, afirmou. Ele ressaltou que houve  mudança no entendimento do TCU quanto às pedaladas e que até 2014 o mecanismo fiscal não havia sido questionado. Também destacou que os decretos não configuram operação de crédito.

Durante e após a fala de Lodi, houve momentos de tensão. O deputado Fernando Francischini (SD-PR) leu o diálogo entre o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva e Barbosa sobre a possibilidade de interferência na Receita Federal e insistiu que o petista venha se explicar na comissão. Rosso esclareceu que o ministro não precisaria responder ao deputado, porque esse não é o tema da reunião.

 

Defesa política

Na próxima segunda-feira, acaba o prazo de entrega da defesa de Dilma. De acordo com o vice-líder do governo, deputado Paulo Teixeira, o ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), José Eduardo Cardozo, representará a petista na comissão. A data será acertada em uma reunião administrativa do colegiado na manhã de hoje.

Os petistas dão como certa a judicialização do processo. “Temos três frentes de atuação: o Congresso, a sociedade e o STF”, afirmou Paulo Teixeira. A oposição conta 346 votos pró-impeachment, quatro a mais do que o necessário em plenário.

A partir da defesa, começa o prazo de cinco sessões plenárias para o relator na comissão, deputado Jovair Arantes (PTB-GO), entregar seu parecer.

 

Colaborou Guilherme Waltenberg

 

Frase

"O parlamento não está autorizado a suprimir o mandato da presidente da República. Falta de apoio no parlamento, impopularidade ou o conjunto geral da obra não objeta pedido de impeachment”

 

Ricardo Lodi Ribeiro, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro