Correio braziliense, n. 19320, 18/04/2016. Política, p. 2

CÂMARA AUTORIZA IMPEACHMENT

CRISE NA REPÚBLICA » Vitorioso na votação, PMDB articula base de futuro governo com a oposição e pressiona Senado por uma decisão rápida sobre o afastamento; PT tenta dar sobrevida para o mandato de Dilma e fala até em aprovar eleições diretas
Por: PAULO DE TARSO LYRA, JULIA CHAIB, HELENA MADER, EDUARDO MILITÃO, GUILHERME WALTENBERG E INGRID BORGES

PAULO DE TARSO LYRA

JULIA CHAIB

HELENA MADER

EDUARDO MILITÃO

 

GUILHERME WALTENBERG

Especial para o Correio

 

INGRID BORGES

Especial para o Correio

 

Quando o deputado Bruno Araújo (PSDB-PE) foi chamado ao microfone para proferir o seu voto, o painel eletrônico marcada 23h06 e 341 votos favoráveis ao impeachment da presidente Dilma Rousseff. Quis a contabilidade política que o voto decisivo aprovando a admissibilidade do processo de afastamento de Dilma viesse da terra natal do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A partir de hoje, o país tem um governo de fato instalado no Palácio do Planalto e um governo em processo acelerado de construção com epicentro no Palácio do Jaburu.

Às 23h48 foi proferido o resultado final: 367 votos favoráveis ao impeachment, 137 contrários, sete abstenções e duas ausências. O processo segue agora para o Senado, onde, provavelmente, na semana pós-feriado de 21 de abril será instalada uma comissão para analisar o caso. Em seguida, o processo é encaminhado ao plenário e, possivelmente em 11 de maio, será apreciada pelos senadores. Se a maioria simples — 42 senadores — considerar que o processo deve ser aberto, Dilma é automaticamente afastada por um período de até 180 dias. Ao fim desse, tempo, Temer pode assumir definitivamente o poder.

O caminho, no entanto, será tumultuado. O governo não descarta judicializar o processo, na tentativa de ganhar uma sobrevida ao mandato de Dilma Rousseff. A Operação Lava-Jato segue em curso e novas delações devem surgir, complicando a vida do PT e do PMDB. Na véspera do feriado de 21 de abril, o Supremo Tribunal Federal vai analisar se o Lula pode assumir a Casa Civil. Ainda há um grupo de senadores, entre eles Cristovam Buarque (PPS-DF), defendendo a realização de eleições gerais.

“Eu não sei se esse é o momento ideal para discutir esse tema. Para as eleições gerais serem realizadas, existem dois caminhos: o primeiro é uma renúncia de Dilma e Temer e eu duvido que ele renuncie. A outra é a aprovação de uma emenda constitucional, que exige 308 votos, quorum que nós não temos”, disse, abatido, o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE). “Não tem nada de eleição geral”, afirmou o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE).

As maiores bancadas na Casa firmaram acordo para que o senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) fique com a presidência e a senadora Ana Amélia (PP-RS), com a relatoria. Tucanos do Senado não queriam Anastasia como relator para não vincular o impeachment ao PSDB. A oposição dá praticamente como certa a aprovação do processo no Senado. Na semana anterior à votação na Câmara, uma das diversas listas de contagem de votos, a relação do PMDB previa ao menos 51 senadores a favor da destituição de Dilma.

A previsão é de que a comissão seja constituída na próxima semana. A votação da admissibilidade ocorreria em 10 de maio e a análise final no plenário, em setembro. A intenção do Presidente do SenadoRenan Calheiros (PMDB-AL), é a de não interferir no curso do processo na Casa e seguir os prazos previstos. Para o cenário se confirmar, é necessário ver como Renan se comportará. Caso demore a anunciar a data de votação, é um indício de que está favorável ao governo, então dificilmente aceitaria os nomes propostos, embora Anastasia e Ana sejam considerados moderados.

 

Articulações

Aliados do vice-presidente Michel Temer disseram que ainda há um longo caminho e que a agenda de reuniões a partir de hoje ainda está em aberto. Eles não creem, contudo, que o PT consiga êxito no processo de judicialização, especialmente após a derrota na última sexta-feira, quando, por 8 votos a 2, os ministros mantiveram a sessão de votação para ontem.

Reconduzido à presidência do PTB há pouco mais de uma semana, Roberto Jefferson disse que Temer precisa apresentar rapidamente uma agenda para o país que retome os empregos e o crescimento econômico. “Ele precisa também conversar diretamente com os trabalhadores e a sociedade”, defendeu o petebista. Jefferson cobrou também um endurecimento no relacionamento com os movimentos sociais. “Tem que cobrar CNPJ e transparência. Que história é essa de que ´vamos para o Brasil, São Paulo e o Paraná´? Movimento social não pode ser um valhacouto de terroristas”, afirmou.

Partidos que apoiaram a abertura do processo de impeachment admitem que os próximos dias — ou meses — serão difíceis. “Temer vai enfrentar uma oposição dura aqui na Casa e os movimentos sociais inflamados”, disse o deputado Júlio Delgado (PSB-MG). “As regras do jogo político foram quebradas. Isso é péssimo. Caberá ao PT e aos movimentos possíveis combater essa ilegalidade, de preferência dentro dos limites democráticos”, rebateu o ministro licenciado do Desenvolvimento Agrário, Patrus Ananias.

Existe ainda a dúvida sobre quais as legendas que apoiariam a gestão Temer. “Daremos apoio parlamentar, porque será um governo de salvação nacional. Mas não defendo que, em um primeiro momento, ocupemos cargos”, defendeu o deputado Marcus Pestana (PSDB-MG).

 

Frase

“As regras do jogo político foram quebradas. Isso é péssimo. Caberá ao PT e aos movimentos possíveis combater essa ilegalidade, de preferência dentro dos limites democráticos”

Patrus Ananias (PT-MG), deputado

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