Correio braziliense, n. 19304, 02/04/2016. Política, p. 2

A conexão entre três escândalos

Eduardo Militão

A 27ª fase da Operação Lava-Jato, deflagrada ontem para aprofundar apuração sobre um empréstimo do Banco Schahin considerado forjado para o Partido dos Trabalhadores, ligou os desvios da Petrobras não só com o mensalão, mas também com casos de corrupção na Prefeitura de Santo André, cidade que foi administrada por Celso Daniel, cujo assassinato até hoje rende polêmica (veja na página 3). As apurações atingem indiretamente o ex-presidente Lula e reforçam a existência de uma operação-abafa no PT.

Foram presos o ex-secretário-geral do PT Sílvio Pereira, o Silvinho, e o empresário Ronan Maria Pinto, dono do jornal Diário do Grande ABC e da empresa de transporte Expresso Santo André. Os federais ainda levaram o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, condenado por corrupção ativa no mensalão, e o jornalista Breno Altman, ligado a José Dirceu, para prestarem depoimento em condução coercitiva. Ontem, Ronan e Altman negaram as acusações. Não foram localizados os defensores de Delúbio e Silvinho. O escritório que defendia Delúbio no mensalão disse que não poderia comentar a Lava-Jato porque não fora contratado para esse caso.

Os investigadores encontraram provas bancárias que mostram o “caminho do dinheiro” para confirmar depoimentos prestados pelo pecuarista José Carlos Bumlai, por dois banqueiros do Schahin e pelo publicitário Marcos Valério, condenado a 38 de prisão no mensalão. Todos afirmam que um empréstimo do banco, de R$ 12 milhões, foi feito em 2004 para o PT em nome do pecuarista e que parte dele, quase R$ 6 milhões, chegou aos bolsos de Ronan Maria Pinto a pedido do partido. O motivo desse repasse, que foi compensado por um contrato da Petrobras de US$ 1,5 bilhão anos depois, é a grande dúvida na cabeça dos investigadores (veja arte).

Segundo o banqueiro Salim Schahin, que fechou acordo de delação, Delúbio disse que o PT tinha interesse no empréstimo e que a Casa Civil, à época chefiada por José Dirceu,  procuraria o banqueiro. Dias depois, o empresário afirma ter recebido telefonema de Dirceu. Só falaram amenidades, “mas a mensagem estava entendida”, narrou o delator. Dirceu foi condenado no processo do mensalão,  em novembro de 2012, a 10 anos e 10 meses de prisão, que, com recursos dos advogados, foi diminuída para 7 anos e 11 meses.

O envolvimento de Bumlai, amigo de Lula, tem potencial para atingir o ex-presidente, da mesma maneira que a montagem do quebra-cabeça que comprovaria a existência de uma operação-abafa para não prejudicar a imagem de Lula e do PT.

 

Empréstimo

O juiz Sérgio Moro autorizou, e 50 policiais cumpriram 12 mandados judiciais, sendo oito de busca e apreensão, em São Paulo, na capital e nas cidades de Santo André, Osasco e Carapicuíba. As detenções de Silvinho e Ronan são temporárias e devem durar cinco dias, se não forem prorrogadas por Moro.

O ex-secretário do PT foi preso porque recebeu cerca de R$ 500 mil da empreiteira OAS, de acordo com o procurador Diogo Castor de Mattos (veja na página 4). Delúbio foi conduzido a depor porque Bumlai e os banqueiros Salim Schahin e Sandro Tordin disseram que ele participou da reunião em que ficou acertado obter um empréstimo para o PT em nome do pecuarista. Altman foi levado porque Enivaldo Quadrado, condenado no mensalão, disse que ele lhe pagou uma multa imposta pelo Supremo Tribunal Federal com cerca de R$ 145 mil em dinheiro vivo, repasse considerado suspeito por se ignorar a origem dos recursos. Valério ainda citou o jornalista nas negociações com Ronan para tentar suspender suposta “extorsão” contra petistas, como Dirceu e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A assessoria de Ronan disse que ele não tem relação com os fatos mencionados, embora já tenha sido condenado a 10 anos de prisão, por esquema de corrupção no sistema de transporte de Santo André. “Mais uma vez, o empresário reafirmará não ter relação com os fatos mencionados e estar sendo vítima de uma situação que, com certeza, agora, poderá ser esclarecida de uma vez por todas”, diz nota distribuída ontem. “Todas as denúncias que o envolveram ao longo dos anos foram ou estão sendo investigadas e Ronan Maria Pinto vem sendo defendido e absolvido. A mais recente, uma sentença de primeira instância, onde houve condenação, encontra-se em grau de recurso.”

 

Breno Altman disse, em texto publicado em rede social, no qual faz críticas à Lava-Jato e ao juiz Sérgio Moro, que não há provas de seu envolvimento no caso. “Não foi apresentado, durante o interrogatório, qualquer prova ou indício de meu eventual envolvimento no caso investigado, de suposto empréstimo ao empresário Ronan”, disse ele. Os advogados de Sílvio Pereira, Mariângela Tomé e André Mendes Machado, não retornaram recado deixado em seu escritório ontem.