PELO MUNDO Votação tem grande destaque no exterior

18/04/2016

A aprovação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff repercutiu no exterior. Nas suas edições de domingo, os jornais “The Guardian”, “The New York Times” e “El País” já apresentaram reportagens que retratavam o clima político do país. Ao longo do dia ontem, as versões online atualizaram o andamento da votação na Câmara dos Deputados. Houve pequenos protestos em Nova York e em Washington. Além de chamar a atenção da imprensa internacional, o processo, que poderá levar ao afastamento definitivo da presidente, foi acompanhado por líderes latino-americanos. Os governos da Bolívia, da Venezuela e do Equador manifestaram apoio à Dilma.

Faltando menos de uma semana para a cúpula de chefes de Estado da União de Nações Sulamericanas ( Unasul), com data marcada para o próximo dia 23 de abril, em Quito, a crise política brasileira passou a ser o assunto dominante da agenda regional. Embora a Unasul, como bloco, tenha manifestado, em nota oficial, que o impeachment de Dilma “levaria à perigosa criminalização do exercício de governo por razões de índole simplesmente políticas”, nem todos os membros concordam em aderir à denúncia de um suposto golpe contra a mandatária.

Na Argentina, o presidente Mauricio Macri mantém firme sua decisão de não se intrometer em assuntos internos do Brasil. Ontem, altos representantes de seu governo reiteraram a confiança da Casa Rosada nas instituições brasileiras.

— O Brasil é nosso sócio por excelência. Confiamos em suas instituições — disse ao GLOBO o secretário de Assuntos Estratégicos do governo argentino, Fulvio Pompeo.

NICOLÁS MADURO: PÉSSIMA NOTÍCIA

O funcionário, principal assessor do presidente em assuntos internacionais, assegurou que “juntos, Brasil e Argentina temos grandes oportunidades para nossos povos”. A Casa Rosada jamais falou em golpe no Brasil, nem o fará. Segundo fontes do Executivo argentino, Macri “acompanha de perto a situação brasileira com preocupação porque o Brasil é nosso principal sócio. Mas não vamos nos meter em questões internas”.

Já os presidentes da Venezuela, Nicolás Maduro; do Equador, Rafael Correa e da Bolívia, Evo Morales, defenderam publicamente o governo do PT e denunciaram "um golpe cívico, midiático e judicial no Brasil". Ontem, Maduro republicou em sua conta no Twitter imagens de manifestações pró- PT no Rio de Janeiro. Para o chefe de Estado venezuelano, que tem no governo do PT um de seus principais aliados políticos no continente, a saída de Dilma do governo é uma péssima notícia.

Os questionamentos ao impeachment de Dilma foram reforçados por declarações do secretário geral da Unasul, o colombiano Ernesto Samper, e da Organização de Estados Americanos ( OEA), o uruguaio Luis Almagro.

— Não existe acusação de caráter penal contra a presidente, ela está sendo acusada de má gestão nas contas públicas em 2014. Esta é, em todo caso, uma acusação de caráter político, que não justifica um processo de destituição — assegurou Almagro, que esteve recentemente em Brasília.

 

JORNAL ESPANHOL FALA EM “DIA D"

A situação política brasileira criou um clima de caos entre os governos da região, que afetará a cúpula da Unasul. Vários presidentes já confirmaram que não participaram do encontro. Segundo fontes argentinas, o Palácio do Planalto informou às autoridades do bloco que quem for representar o Brasil poderia não representar o governo Dilma Rousseff.

— O governo quis deixar claro que talvez quem vá pelo Brasil não represente os interesses do governo do PT. Hoje não se sabe quem irá e o próprio Macri não decidiu ainda se estará presente — confirmou a fonte.

O jornal “New York Times” publicou, em sua edição impressa, reportagens sobre eleitores desiludidos com o governo Dilma. Segundo o jornal americano, a falta de esperança entre a classe trabalhadora foi o sintoma mais forte da perda de apoio da presidente entre a população.

“É difícil encontrar muito apoio entre os eleitores da classe operária que antes eram fortes apoiadores do Partido dos Trabalhadores, o grupo de esquerda que desafiou o regime militar uma geração atrás e depois chegou ao poder prometendo uma sociedade mais justa”, escreveu o “NYT”.

O espanhol “El País” chamou o domingo de “Dia D” de Dilma . A reportagem fez um perfil da presidente, que é descrita como uma tecnocrata que não herdou os poderes de negociação de seu mentor, o ex- presidente Lula. “De um lado, há um congresso adverso e inimigo. Do outro, uma presidente com personalidade que não sabe ceder nem render- se”, disse a reportagem. Em outro trecho, o “El País” explicou que, “quando os deputados aliados de Rousseff — agora na trincheira dos que são a favor do impeachment — procuravam a presidente para pedir verbas para obras em seus estados, ela os recebia com a mesma consideração que a qualquer outro deputado”, disse o texto.

Na versão online, já após o início da votação, o “El País” classificou a Câmara como um Parlamento com cenas de circo que decidiria o futuro de Dilma. Já a britânica “The Economist” apresentou uma reportagem sobre possíveis cenários após o afastamento de Dilma Rousseff.

 

O globo, n. 30205, 18/04/2016. País, p. 30