Nova regra elevará gasto com benefícios em R$ 23,7 bi por ano

18/04/2016

A mudança nas regras da aposentadoria por tempo de contribuição que entrou em vigor em dezembro, com a flexibilização do chamado fator previdenciário, vai agravar ainda mais as contas da Previdência Social. Segundo estudo inédito do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada ( Ipea), prestes a ser publicado, a despesa com pagamento de benefícios aumentará o equivalente a 0,4% do Produto Interno Bruto ( PIB) daqui a 45 anos.

Atualmente, os desembolsos com o regime previdenciário equivalem a 7,49% do PIB. Pelo fator previdenciário anterior, essa despesa em 2060 seria de 15,26% do PIB. Mas, com as novas regras, os gastos com os benefícios devem chegar a 15,65% do PIB daqui a 45 anos. Assim, a partir de 2060, o governo terá uma despesa extra anual que, a valores do PIB de hoje, corresponde a R$ 23,7 bilhões.

As despesas com os benefícios já começaram a subir, mas os técnicos do Ipea calculam que o movimento deve ser sentido com mais força a partir de 2024.

AUMENTO DA DESIGUALDADE

A mudança também tem potencial para aumentar a desigualdade de renda, segundo o estudo. O argumento é que quem se aposenta por tempo de contribuição recebe benefícios maiores na comparação com aqueles trabalhadores que se aposentam por idade, na cidade ou na área rural, e aqueles que recebem benefício assistencial.

Em janeiro de 2015, o valor médio das aposentadorias por tempo de contribuição ficou em R$ 1.632, enquanto aqueles trabalhadores que se aposentaram por idade ou por invalidez receberam, em média, R$ 793 e R$ 988, respectivamente. Aposentadorias rurais e benefícios assistenciais são limitados a um salário mínimo.

Para Luis Henrique de Paiva, um dos autores do estudo, a perspectiva de piora do peso do regime de aposentadoria nas contas públicas torna urgente a reforma da Previdência, independentemente de eventual mudança de governo. Segundo o especialista, o problema precisa ser enfrentado apesar das condições políticas pouco favoráveis hoje.

— A tendência é que, quanto mais se demora, mais dura terá que ser a reforma previdenciária — destacou Paiva.

A aposentadoria por tempo de contribuição pode ser requerida com 30 anos de recolhimento para o INSS, no caso de mulheres, e 35 anos, no caso dos homens. Com a recente mudança na lei, os trabalhadores podem se aposentar com o salário integral ao atingir 85/ 95 ( soma de idade e tempo de contribuição para mulheres e homens). A tabela começa a subir a partir de 2018, até atingir 90/ 100, em 2026.

Antes, era obrigatório cumprir a regra do fator previdenciário — mecanismo que leva em conta a idade do trabalhador ao requerer aposentadoria, tempo de contribuição e expectativa de vida —, o que invariavelmente reduz o valor do benefício no caso de trabalhadores mais jovens. Agora, esse mecanismo é opcional.

— O fator se mostrou um instrumento muito efetivo no sentido de segurar as despesas com aposentadorias em idade precoce — mencionou Paiva.

O estudo mostra que, entre 2000 e 2015, o fator ajudou a reduzir as despesas do INSS em R$ 75 bilhões. Só em 2015, foram R$ 14,1 bilhões.

A mudança nas regras a partir de dezembro de 2015 já surtiu efeito nas contas da Previdência este ano, segundo dados do Ministério do Trabalho e Previdência : no pr imeiro bimestre foram concedidas 29.613 aposentadorias por tempo de contribuição, com valor médio de R$ 2.397, um gasto de R$ 71 milhões; no mesmo período de 2015, foram 23.490 benefícios com valor médio de R$ 1.873 — uma despesa de R$ 44 milhões.

A flexibilização do fator foi uma derrota imposta ao governo pelo Congresso, durante as discussões da proposta que alterou as regras da pensão por morte. A medida era defendida pelos parlamentares do PT como uma forma de beneficiar os mais pobres, que foram forçados a entrar no mercado de trabalho mais cedo, o que o estudo do Ipea rebate.

LONGE DO RESTO DO MUNDO

A pesquisa ressaltou que o Brasil se distanciou ainda mais da realidade internacional. Em 177 países pesquisados, somente 13 permitem aposentadoria sem exigência de idade mínima. Mas, nesses casos, há travas para inibir aposentadorias precoces, como redução e proibição de acúmulo de benefícios.

 

O globo, n. 30205, 18/04/2016. Economia, p. 38

O Ipea alerta ainda que a fixação da idade mínima em 55/ 60 ( mulheres) ou 60/ 65 ( homens) não será suficiente para equilibrar as contas da Previdência e que será preciso impor uma idade única para todos. Além disso, propõe a revisão do privilégio da pensão por morte, que continua integral, outro ponto que coloca o Brasil fora da curva na comparação internacional.