Correio braziliense, n. 19317, 15/04/2016. Política, p. 3

Iniciativa repercute mal

Hédio Ferreira Júnior

Mariana Pedroza

Júlia Chaib

A judicialização do processo de impeachment no Supremo Tribunal Federal (STF) trava o cabo de guerra entre governo e oposição também no Judiciário. Enquanto os primeiros reclamam de uma ação golpista capitaneada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), os que querem a destituição da presidente Dilma Rousseff tratam a tentativa como um “esperneio” do Palácio do Planalto.

A Advocacia-Geral da União (AGU) pede a nulidade do processo que corre na Câmara (até o fechamento desta edição o julgamento não havia terminado). Enquanto isso, na noite de ontem, a Suprema Corte votou uma ação direta de inconstitucionalidade que questionava a ordem em que os parlamentares serão chamados na sessão deste domingo. No entendimento do PCdoB, autor da ação, o rito proposto por Cunha de alternar a chamada por estados do Norte e do Sul, alternadamente, não seria legítimo e deveria ser por ordem alfabética de parlamentar.

Por 7 votos a 2, a maioria dos ministros decidiu que a votação do impeachment será como foi já proposto pela presidência da Casa em conformidade regimental: por estado, do Norte para o Sul, alternadamente, e seguirá alternando com estados de outras regiões — indeferindo-se, assim, a ação do PCdoB. Os mandados de segurança que pediam a invalidação desse rito também foram indeferidos pela maioria.

Eduardo Cunha considerou correta a decisão do Supremo de manter a ordem estabelecida por ele na análise do impeachment.  “Há uma tentativa de judicializar que é mais um ‘juris esperniandi’ na falta de votos para postergar e tentar anular o processo”, disse. Segundo Cunha, a ideia de que ele se tornará vice-presidente da República caso o vice-presidente Michel Temer assuma o governo é “história da carochinha” para provocar debate político. “O presidente da Câmara substitui eventualmente o presidente, ele nunca sucede”, afirmou.

Oposicionista do governo Dilma desde quando seu partido, o PP, se posicionava como integrante da base aliada, o deputado Jerônimo Goergen (RS) trata como um ato de desespero “contraditório” o questionamento do Planalto sobre o rito e a validade do parecer aprovado na comissão especial de impeachment. Ele questiona a pressa que o governo havia declarado, tão logo a ação foi colocada em andamento, no fim do ano passado, e que agora pode ser retardada caso o Supremo anule seu efeito.

Confiante na vitória da oposição em plenário — que precisará cravar pelo menos 342 votos necessários para derrubar Dilma —, Goergen comemorou a decisão do STF e ironizou a pressão dos aliados do governo para que o sistema de alternância por regiões substituísse o que antes havia sido proposto, começando primeiro pelos estados do Sul e concluindo no Norte. “Antes teríamos como primeiro placar 1 a 1. Agora já vamos começar com oito a zero, já que toda a bancada de Roraima está do nosso lado”, disse, sobre o primeiro estado que a votar no plenário.

Para o líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (PE), os governistas estariam fazendo barulho porque sabem das chances cada vez maiores de derrota no próximo domingo. O democrata acha que a ordem de votação em nada irá alterar o resultado favorável àqueles que defendem a destituição da presidente Dilma. “É um esperneio. Essa atitude deles confirma que a gente tem voto. Começando pelo Sul ou pelo Norte”, disse o líder. “Não vai ter espaço para que esse processo recue”, completou Mendonça.

Presidente da comissão especial que analisou a admissibilidade do processo na Câmara, Rogério Rosso (PSD-DF) lembrou a análise do impedimento do ex-presidente Fernando Collor, em 1992, em que o advogado de defesa não falou nenhuma vez.  A fala de Rosso rebate um dos questionamentos feitos pela Advocacia-Geral da União (AGU), de que a defesa de Dilma não foi ouvida no mesmo dia em que os denunciantes. “Eu deu espaço duas vezes para o Cardozo e fui criticado por isso. Onde está o cerceamento?”, disse.

 

Regras

Do lado governista, deputados defenderam que a judicialização do processo de impeachment não é um problema e está previsto nas regras do jogo. Sobre a primeira derrota do governo na sessão, o deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA) defendeu que toda essa situação só aconteceu porque “passou por manobras do Cunha que fez de tudo para favorecer a decisão dele.”

A principal crítica que o governo faz ao rito definido pelo presidente da Câmara dos Deputados diz respeito a uma possível indução de votos. Segundo ele, seria mais justo que um deputado de Roraima votasse, logo em seguida viesse um parlamentar do Rio Grande do Sul, em seguida outro de Roraima e assim sucessivamente.  Sobre a tentativa do governo de anular todo o processo do impeachment, Chico Alencar (Psol-RJ) foi taxativo ao achar que poderiam ter sido mais ágeis na apresentação da ação. “Anular o processo inteiro agora é uma medida tardia. Essa é uma característica do atual governo e acho que isso pode ter pouca eficácia”, explicou.

 

Frases

"Antes teríamos como primeiro placar 1 a 1. Agora já vamos começar com oito a zero, já que toda a bancada de Roraima está do nosso lado”

Jerônimo Goergen (PP-RS), deputado

 

"Há uma tentativa de judicializar que é mais um ‘juris esperniandi’ na falta de votos para postergar e tentar anular o processo”

Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara dos Deputados

 

"É um esperneio. Essa atitude deles confirma que a gente tem voto. Começando pelo Sul ou pelo Norte”

Mendonça Fiolho (DEM-PE), deputado

 

"Eu deu espaço duas vezes para o Cardozo e fui criticado por isso. Onde está o cerceamento?”

Rogério Rosso (PSD-DF), deputado

 

"Anular o processo inteiro agora é uma medida tardia. Essa é uma característica do atual governo e acho que isso pode ter pouca eficácia”

 

Chico Alencar (Psol-RJ), deputado