Título: Da rede para a rua
Autor: Mariz, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 13/10/2011, Política, p. 2

Organizado por meio da internet, protesto pela ética na política reuniu 20 mil pessoas na Esplanada dos Ministérios

Poderia ser mais um tradicional 12 de outubro. Mas, neste ano, a missa em homenagem à Nossa Senhora Aparecida e os brinquedos infláveis para a criançada tiveram de dividir espaço, na Esplanada dos Ministérios, com uma multidão de indignados com os rumos da política no Brasil. Articulada pela internet, a Marcha contra a Corrupção reuniu cerca de 20 mil pessoas, segundo estimativas da Polícia Militar do Distrito Federal. Jovens, adultos, idosos e famílias inteiras caminharam pacificamente do Museu da República até a Praça dos Três Poderes pedindo mais transparência e ética na política. Embora o número de manifestantes tenha sido bem menor do que os 40 mil contabilizados no primeiro protesto do grupo, durante as comemorações do Sete de Setembro, o resultado de ontem é comemorado pelos organizadores. Houve protesto ontem em várias cidades do país, mas em nenhuma o número de manifestantes superou o de Brasília.

"Muita gente veio, de forma espontânea, nesta marcha que é nossa, de todo mundo. Todos pelo fim da corrupção", disse Lucianna Kalil, uma das organizadoras do protesto. Em uma hora e quarenta minutos de manifestação, muitos foram os alvos; Jaqueline Roriz, deputada federal que se livrou da cassação recentemente; José Dirceu, apontado como o "comandante" do mensalão; José Sarney, o presidente do Senado. Em relação à presidente Dilma Rousseff, o tom era ameno, quase que de aviso sobre os malfeitos. "Oh, Dilma, preste atenção, o brasileiro não quer mais corrupção", bradavam.

A ambulante Telma Ferreira, de 32 anos, moradora de Planaltina, ficou sabendo do protesto pela televisão. "Vim porque cansei de receber três ou quatro deputados durante as eleições na minha casa. Eles pedem para a gente trabalhar na campanha, fazer boca de urna e depois desaparecem. Tenho meu valor. Quero respeito." Vestida com uma camiseta do movimento Remédio para o Brasil é VNC (vergonha na cara), aproveitou a multidão para vender balas e chicletes. "Além de ganhar um trocado, tenho que pagar a condução", explicou.

A massa de manifestantes pertencia, porém, quase em sua totalidade, à classe média. Com óculos caros, tênis da moda e celular de última geração, eles registravam com entusiasmo os momentos e personagens mais marcantes do protesto, muitos deles fantasiados ou carregando cartazes engraçados. Daniela Kalil, irmã de Luciana e também organizadora do evento, arrisca um palpite sobre a ausência de pessoas de renda mais baixa. "Panfletamos em todas as cidades do DF. Talvez por não se acharem parte de Brasília elas não se mobilizem tanto. Mas acredito que, cada vez mais, todos estão percebendo a importância de protestar", diz Daniela.

Os rostos jovens, com alguns traços ainda infantis, destacaram-se entre a multidão de gente que invadiu a Esplanada ontem ¿ muitos trajando camisetas pretas e empunhando vassouras pela "faxina" política. Um dos grupos mais engajados era o Juventude Consciente, que reuniu mais de 1,4 mil estudantes de escolas secundárias de Brasília. A maior parte deles nem sequer tem título de eleitor ainda.

Desde o protesto do Sete de Setembro, o grupo que organizou a marcha de ontem repete exaustivamente que é apartidário, sem vinculação política ou de qualquer natureza. Talvez por isso a procedência de um trio elétrico usado ontem durante a marcha tenha causado certo desconforto. Entre os próprio organizadores, havia várias explicações diferentes, incluindo "oferta de uma pessoa que não quer se identificar " e "algo que foi bancado pela organização e será pago com a venda das camisetas da marcha". Até que Lucianna Kalil, uma das mentoras do movimento, disse que o veículo havia sido cedido pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), como no primeiro protesto.

O apoio ficou explícito nos discursos anteriores ao início da caminhada. Presidente da OAB no DF, Francisco Caputo destacou a disposição da entidade de lutar em favor da honestidade na política. "É uma honra Brasília sediar o maior movimento contra a corrupção do país. Somos 720 mil advogados atentos aos rumos do país e vamos cobrar o fim da corrupção", afirmou ele.