Correio braziliense, n. 19311, 09/04/2016. Política, p. 2

Maioria na comissão a favor do impeachment

Julia Chaib

Marcella Fernandes

Guilherme Waltenberg

A dois dias da votação na comissão do impeachment da presidente Dilma Rousseff, a oposição já conseguiu maioria para aprovar no colegiado o parecer pelo afastamento da petista. Levantamento feito pelo Correio mostra que, dos 65 titulares, pelo menos 34 são favoráveis à destituição de Dilma, um voto a mais do que os 33 necessários para aprovar o relatório do deputado Jovair Arantes (PTB-GO). Até segunda-feira, porém, o placar pode mudar. Há a expectativa de que alguns faltem, o que foi alvo de polêmica na sessão de ontem, que se estendeu durante a madrugada e não havia sido encerrada até o fechamento desta edição.

Independentemente do resultado, o texto precisa ainda ser analisado pelo plenário, onde precisa de 342 votos para que o processo siga para o Senado. A comissão retoma os trabalhos na segunda-feira, quando ocorrerá a votação. Há ao menos quatro partidos com divisões internas: PMDB, PP, PR e PSD. O governo tenta angariar votos dessas siglas. Em meio à “repactuação”, o Planalto negocia ministérios, que podem ser entregues após a votação do impeachment no plenário. Segundo o levantamento que levou em conta parlamentares que já declararam o voto abertamente ou falaram com a reportagem, 33 deputados acompanham o relator. Outros 20 são contrários e 11 se dizem indecisos.

Por ora, a maioria na comissão não se reflete nas diversas listas de previsão feitas por partidos no plenário. Governistas apontam 120 contra o afastamento e 265 a favor. Haveria pelo menos 106 votos garantidos do núcleo duro contrário ao impeachment.

Com oito nomes na comissão, o PMDB contabiliza dois votos pró-Dilma e quatro contra. Entre os indecisos, o deputado Washington Reis (RJ) tem dito a colegas que votará com o relator, apesar de ser aliado do líder Leonardo Picciani (RJ), próximo ao Planalto. Pré-candidato a prefeito de Duque de Caxias, Reis tem sofrido pressão dos eleitores. Ele cogitou inclusive encomendar uma pesquisa de opinião aos possíveis eleitores sobre o impeachment. Valtenir Pereira (MT), por outro lado, deve acompanhar Picciani. O líder do PP, deputado Aguinaldo Ribeiro (PB), não antecipou o voto. Três correligionários se posicionaram a favor da deposição e o deputado Roberto Brito (BA), contra. Embora rachado, a sigla decidiu permanecer na base.

No PR, o líder Maurício Quintella Lessa (MG) conversará com a bancada no fim de semana, mas o partido não fechará questão. Dois deputados da legenda na comissão votarão contra o impeachment. Quintella não declarou a posição. Édio Lopes seguirá a orientação partidária, a ser definida até segunda-feira. Partido do presidente da comissão, Rogério Rosso (DF), o PSD tem um integrante de cada lado. Rosso ainda não decidiu se votará na comissão, embora não haja impedimento técnico. A tendência é que se manifeste apenas em plenário. O quarto integrante da sigla no colegiado, deputado Julio César (PI), pode faltar na segunda-feira.

 

Rito

Em resposta a uma questão de ordem apresentada pelo deputado Paulo Magalhães (PSD-BA), o presidente do colegiado, deputado Rogério Rosso (PSD-DF), decidiu que, no fim da discussão, a Advocacia-Geral da União (AGU) terá 15 minutos para uma nova defesa de Dilma. A ida do titular da pasta, José Eduardo Cardozo, está confirmada. Rosso também definiu ainda que, na ausência de titulares, votarão os suplentes do bloco formado na comissão de acordo com a ordem de chegada, o que pode mudar o placar.

Oposicionistas acusaram o governo de pressionar integrantes para faltarem à votação. “Ou ele está com atestado de óbito ou tem que comparecer aqui. A gente não pode tolerar artimanhas, pressão do governo para inviabilizar a votação do impeachment”, afirmou o deputado Mendonça Filho (DEM-PE). O deputado Alex Manente (PPS-SP) chegou a apresentar questão de ordem para que fosse adotada votação nominal, por ordem alfabética, a fim de constranger os ausentes.

O procedimento é o mesmo que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) adotará em plenário. Rosso responderá ao pedido na segunda-feira, mas deve negá-lo, uma vez que o objetivo é encerrar a votação até as 19h. Pelo menos um deputado, Julio Cesar (PSD-PI), revelou ao Correio a intenção de faltar. “Eu nem queria ser titular na comissão. Estou avaliando. Existe a possibilidade de eu faltar e um suplente votar no meu lugar”, disse.

Ao longo da tarde e da noite de ontem, governistas e oposicionistas se revesaram em argumentos tanto jurídicos quanto políticos sobre o afastamento. “Não há pedalada fiscal. O que existe é pedalada jurídica para justificar o injustificável. O impeachment ilegal é contra a democracia”, disse o deputado Pepe Vargas (PT-RS). Líder do PDT, Weverton Rocha (MA) chegou a apresentar um voto em separado, contrário ao afastamento de Dilma. Já Benito Gama (PTB-BA) afirmou que o país vive uma “degradação em todos os sentidos”. “Estamos sendo levados para o caos, não somente nacional, mas internacional”, disse.

 

Crédito

Um dos dois principais argumentos do voto de Jovair Arantes (PTB-GO), as pedaladas são atrasos de repasses da União a bancos públicos. O relator entende que o mecanismo constituiu operação de crédito, acusação negada pelo governo.

 

O placar//  Na comissão do impeachment, 34 deputados se declaram favoráveis ao pedido de afastamento de Dilma, 20 são contra e 11 se dizem indefinidos.

 

PMDB (8)

Leonardo Picciani (RJ)    NÃO

Washington Reis (RJ)    INDEFINIDO

Valtenir Pereira (MT)    INDEFINIDO

Lúcio Vieira Lima (BA)    SIM

Osmar Terra (RS)    SIM

Mauro Mariani (SC)    SIM

Leonardo Quintão (MG)    SIM

João Marcelo Souza (MA)    NÃO

 

PT (8)

Henrique Fontana (RS)    NÃO

Wadih Damous (RJ)    NÃO

Paulo Teixeira (SP)    NÃO

Arlindo Chinaglia (SP)    NÃO

Zé Geraldo (PA)    NÃO

Pepe Vargas (RS)    NÃO

José Mentor (SP)    NÃO

Vicente Candido (SP)    NÃO

 

PSDB (6)

Bruno Covas (SP)    SIM

Carlos Sampaio (SP)    SIM

Jutahy Junior (BA)    SIM

Nilson Leitão (MT)    SIM

Paulo Abi-akel (MG)    SIM

Shéridan (RR)    SIM

 

PP  (5)

Aguinaldo Ribeiro (PB)    INDEFINIDO

Jerônimo Goergen (RS)    SIM

Júlio Lopes (RJ)    SIM

Paulo Maluf (SP)    SIM

Roberto Brito (BA)    NÃO

 

PSB (4)

Fernando Coelho Filho (PE)    SIM

Tadeu Alencar  (PE)    SIM

Danilo Forte (CE)    SIM

Bebeto (BA)    INDEFINIDO

 

PR (4)

Maurício Quintela Lessa (MG)    INDEFINIDO

José Rocha (BA)    NÃO

Edio Lopes (RR)    INDEFINIDO

Vicentinho Junior (TO)    NÃO

 

PSD (4)

Rogério Rosso (DF)    INDEFINIDO

Julio Cesar (PI)    INDEFINIDO

Paulo Magalhães (BA)    NÃO

Marcos Montes (MG)    SIM

 

DEM (3)

Mendonça Filho (PE)    SIM

Rodrigo Maia (RJ)    SIM

Elmar Nascimento (BA)    SIM

 

PTB (3)

Benito Gama (BA)    SIM

Jovair Arantes (GO)    SIM

Luiz Carlos Busato (RS)    SIM

 

PRB (2)

Vinícius Carvalho (SP)    SIM

Jhonatan de Jesus (RR)    SIM

 

PDT (2)

Weverton Rocha (MA)    NÃO

Flávio Nogueira (PI)    NÃO

 

Solidariedade (2)

Fernando Francischini (PR)    SIM

Paulo Pereira da Silva (SP)    SIM

 

PSC (2)

Eduardo Bolsonaro (SP)    SIM

PR. Marco Feliciano (SP)    SIM

 

Pros (2)

Eros Biondini (MG)    SIM

Ronaldo Fonseca (DF)    SIM

 

PTdoB (1)

Silvio Costa (PE)    NÃO

 

PPS (1)

Alex Manete (SP)    SIM

 

PCdoB (1)

Jandira Feghali (RJ)    NÃO

 

PSol (1)

Chico Alencar  (RJ)    NÃO

 

PTN (1)

Bacelar (BA)    Não

 

PEN (1)

Junior Marreca (MA)    INDEFINIDO

 

PHS (1)

Marcelo Aro (MG)    SIM

 

PV (1)

Evair Melo (ES)    SIM

 

PMB (1)

Weliton Prado (MG)    INDEFINIDO

 

Rede (1)

 

Aliel Machado (PR)    INDEFINIDO

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Citações de religiosos e historiadores

Durante as mais de 12 horas previstas para discussões na comissão do impeachment, deputados citaram desde o papa Bento XVI ao filósofo Montesquieu. Foram 118 inscritos, sendo 46 contra e 72 a favor do afastamento. Nesta conta, os deputados Bebeto (PSB-BA) e Aliel Machado (Rede-PR) — sem votos oficialmente declarados — se inscreveram em ambas as listas. A relação não expressa fielmente a posição do parlamentar. Ontem, os integrantes da comissão puderam falar por 15 minutos. Já os não integrantes tiveram direito a 10 minutos.

As contradições entre os parlamentares a favor e contra o impeachment tomaram forma de metáforas e referências históricas. “Bento XVI, reconhecendo a incapacidade diante de enormes desafios, optou pela renúncia”, disse o deputado Evair de Melo (PV-ES), que citou ainda São Tomás de Aquino, Santo Agostinho e o historiador francês do século XIX Alexis de Tocqueville. Já o deputado JHC (PSB-AL) lembrou Montesquieu para criticar a falta de relação harmoniosa entre os três Poderes no governo da presidente Dilma Rousseff.

Em um momento de descontração, o presidente da comissão, deputado Rogério Rosso (PSD-DF), anunciou que, com a previsão de a comissão entrar pela madrugada do sábado, ele ofereceria “pão, manteiga e queijo”. Do fundo, um deputado respondeu: “mortadela”, em referência ao apelido que defensores do impeachment deram aos manifestantes pró-governo. “Não, não é mortadela, é manteiga”, rebateu Rosso, arrancando risos.

 

Após acordo com líderes pela manhã, ficou definido que a comissão não trabalharia no fim de semana. As discussões serão retomadas às 10h de segunda-feira. Às 17h, terão início os procedimentos de votação. Dois deputados de cada lado podem falar e líderes têm um minuto para se manifestarem. A previsão é encerrar a deliberação até as 19h. (MF, JC e GW)