Correio braziliense, n. 19322, 20/04/2016. Política, p. 2

Renan recua e frustra os planos de Dilma

Guilherme Waltenberg

No primeiro dia de definições do rito de tramitação do impeachment no Senado, a presidente Dilma Rousseff sofreu derrotas significativas. Mais cedo, em reunião de líderes partidários, a maioria definiu que a escolha dos integrantes da comissão do impeachment será feita levando em conta o tamanho dos blocos partidários e não dos partidos, conforme queriam os governistas. Mais tarde, o Presidente do SenadoRenan Calheiros (PMDB-AL), teve que recuar, após os apelos da oposição, e antecipar a votação da indicação dos integrantes do colegiado para a próxima segunda, dia em que não terá sessão deliberativa.

Com isso, a votação do parecer da comissão especial do impeachment no Senado — que pode acarretar o afastamento por até 180 dias da presidente Dilma Rousseff — deve ocorrer até 12 de maio, dado o calendário estabelecido para o processo. Após a eleição dos integrantes do colegiado, será feita a instalação da comissão especial, quando começa a contar o prazo de até 10 dias úteis para análise do material e posterior votação do parecer pelo grupo de 21 senadores. Passadas 48 horas, o texto poderá ser votado no plenário.

Citado como suposto beneficiário de propinas no valor de R$ 6 milhões oriundas de desvios da Petrobras em delação premiada do ex-diretor da Área Internacional da estatal, Nestor Cerveró, e alvo de oito inquéritos no Supremo Tribunal Federal — um deles dividido em duas investigações —, Renan previa inicialmente votar o pedido de impeachment de Dilma em 17 de maio, já que queria realizar a escolha dos integrantes da comissão especial apenas na terça-feira. Dessa forma, sem contar segundas e sextas-feiras como prazo para as ações, o prazo final poderia ser estendido.

Após pressão da oposição, que criticava o prolongamento do processo e o fato de segundas-feiras não contarem como parte do prazo, Renan remarcou a data. O entendimento veio após intervenção do presidente do PSDB, Aécio Neves (PSDB-MG). Uma série de integrantes da oposição partiu para o embate direto com o Presidente do Senado. É o caso do senador Ronaldo Caiado (DEM-GO), segundo quem Renan estava procrastinando o enterro de um “cadáver insepulto”, em referência ao governo. “A população é quem sofre. O tema tem relevância para o país”, prosseguiu. A ação não obteve resultado.

Aécio, por sua vez, adotou um tom mais moderado, dizendo que acatava as decisões do Presidente do Senado, mas pediu que houvesse deliberações relacionadas ao impeachment de segunda a sexta, independentemente da sessão ser ou não ordinária. “Não cobrarei antecipação de prazos, mas não deixarei de me manifestar quando eu vir que prazos possam ser cumpridos com mais celeridade. Não será compreensível se, na segunda-feira subsequente, não iniciarmos os trabalhos dessa comissão. O razoável é que Vossa Excelência possa permitir que já na segunda haja eleição e composição”, afirmou o presidente tucano. Renan acatou a sugestão.

Se a votação em plenário for realizada em 12 de maio e caso Dilma seja afastada, ainda não há prazo definido para a votação do julgamento final da presidente. Alguns senadores e técnicos do Senado especularam nesta terça-feira que o processo pode ser estendido até o fim de setembro, perto das eleições municipais de outubro. O cronograma será fechado com a participação de servidores do Supremo Tribunal Federal.

 

Composição

Em reunião realizada na manhã de ontem, ficou definido que a comissão de 21 senadores seria definida a partir da proporcionalidade dos blocos partidários no Senado, não dos partidos individualmente. Com 18 senadores, o PMDB terá cinco representantes no grupo. O grupo da oposição, com 16 congressistas do PSDB, DEM e PV, poderá indicar quatro. Já o de apoio ao governo, com 14 senadores do PT e PDT, terá os mesmos quatro.

Com 10 senadores, os blocos do PP e PSD e do PSB, PPS, PCdoB e Rede terão três indicados cada. O grupo que inclui PTB, PR, PSC, PRB e PTC, apesar de ter 10 parlamentares, terá apenas dois indicados. Os partidos têm até segunda-feira para escolher os seus representantes. Caso não o tenham feito, o Presidente do Senado poderá fazê-lo compulsoriamente.

O roteiro definido nesta terça-feira também deve impedir que o governo emplaque o relator ou o presidente do colegiado. Esses dois cargos, estratégicos para a condução dos trabalhos, serão escolhidos em votação de colegiado. Senadores do PT admitem que, com essa regra, serão derrotados no voto se eventualmente lançarem candidatos a esses postos.

Sobre a delação de Cerveró, Renan disse que as denúncias são fantasiosas. “Não há absolutamente nada contra mim. Essas delações dizem que alguém ouviu dizer, que o mercado fala... Não há nada contra mim porque eu nunca cometi irregularidade”, disse o senador. Segundo ele, nenhum político está imune a investigações. (Com agências)

 

Passo a passo

Confira como será o andamento da admissibilidade do pedido de impeachment no Senado

 

Ontem

» Leitura do relatório no plenário

 

Segunda-feira

» Eleição da comissão. A instalação do colegiado poderá ser feita no mesmo dia ou ficar para a terça-feira. A partir deste momento, começa a contar o prazo de 10 dias úteis de funcionamento da comissão

 

5 ou 6 de maio

» Votação do parecer na comissão especial. A partir daí, começa a contar o interstício regimental de 48 horas para inclusão do pedido de impeachment na ordem do dia do plenário

 

12 de maio

 

» Data prevista para a votação em plenário do parecer da comissão. Caso seja aprovado por maioria simples (41 votos), Dilma é afastada por até 180 dias da Presidência

_______________________________________________________________________________________________________

 

Tentativa de aparar arestas 

Após a decisão do Presidente do SenadoRenan Calheiros (PMDB-AL), de não acelerar o rito do impeachment no Senado Federal, aliados do vice-presidente Michel Temer já articulam para semana que vem uma reunião entre os dois caciques do PMDB. A ideia é aparar arestas entre eles e permitir que corra maior fluidez o processo de afastamento da presidente Dilma Rousseff na Casa.

Na avaliação de alguns aliados de Temer, a resistência de Renan em permitir o avanço do processo mais rapidamente no Senado tem como pano de fundo uma disputa de poder entre os dois dentro do partido.

Segundo esses aliados, já haveria um entendimento de que seria muito difícil barrar o processo contra Dilma no Senado. Dessa forma, alguns senadores avaliam que quanto mais rápido o processo correr, menos danos seriam causados à economia. Um dos aliados, inclusive, citou a reação pouco animadora da bolsa de valores nos dias que se seguiram à aprovação do impeachment pela Câmara. Na segunda, houve queda de 0,63% nas ações, e ontem alta de 1,54%.

 

Um dos senadores que teria ficado irritado com Renan é justamente Romero Jucá (PMDB-RR), um dos principais interlocutores do debate econômico dentro do partido. Ele teria compartilhado com aliados a visão de que a criação de empecilhos para o andamento do processo traria como única consequência a piora no cenário macroeconômico. Eunício de Oliveira (PMDB-CE), líder do partido no Senado, é um dos nomes ao lado de Renan nessa empreitada. (GW)