Correio braziliense, n. 19327, 25/04/2016. Cidades, p. 20

Economia de R$ 45 milhões

Thiago Soares

Isabella de Andrade

O corte no salário de 21 mil servidores do Governo do Distrito Federal (GDF) deve representar uma economia aos cofres públicos de aproximadamente R$ 45 milhões por ano. Eles terão  parte do vencimento cortado, por decisão judicial. Trata-se de uma gratificação incorporada aos contracheques, com base em artigo de uma lei considerado inconstitucional, em 2013, pelo Conselho Especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT). Em ação proposta pela Procuradoria-geral de Justiça do DF, os desembargadores consideraram que a despesa, criada por meio de emenda parlamentar, contraria a Lei Orgânica do DF por conter vício de iniciativa. Apenas o Executivo poderia propor o benefício, que representou uma incorporação de décimos aos salários dos servidores.

Um recurso protocolado pela Procuradoria Geral do DF foi julgado improcedente, em despacho, de fevereiro, pelo ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF). O debate jurídico transitou em julgado em 29 de março e o STF mandou o processo de volta ao Tribunal de Justiça do DF, para cumprimento da decisão. Na ação, a Justiça considerou inconstitucional o artigo 5º da Lei nº 4.584/2011, que transformou a incorporação da remuneração de servidores comissionados em Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada (VPNI). As vantagens eram somadas aos vencimentos desde 2011. Segundo a Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão (Seplag), o cálculo, ainda em aberto, aponta para uma redução, aproximadamente, de R$ 3,4 milhões mensais na folha do Executivo. Os servidores atingidos integram várias secretarias e órgãos da administração direta.

Os cálculos ainda são estimados, uma vez que é necessário fechar as folhas salariais de cada órgão para conhecer o montante final do corte. Na época, a lei incorporou gratificações à remuneração do servidor efetivo em função de confiança havia mais de 10 anos até a data da publicação da lei. As decisões judiciais garantiram um efeito “Ex tunc”, ou seja, não retroativo. Dessa forma, os servidores não deverão devolver os recursos que receberam neste período.

Em um universo de 200 mil servidores do GDF, a decisão afeta 10% entre ativos e aposentados. A Seplag ressalta que os valores indevidos pagos até então já serão retirados esse mês. “Não se pode dizer que os salários serão reduzidos, mas sim que valores pagos indevidamente deixarão de ser feitos em razão da decisão judicial proferida. Reforçando: não é decisão do governo nem se trata de corte salarial, mas de acolhimento de decisão judicial, dado que a gratificação era ancorada em lei distrital, julgada inconstitucional pelo TJDF”, detalhou o governo, em nota pública.

 

Servidor público há mais de 26 anos, Paulo Rios, 57, considera a decisão da Justiça como uma retirada de direitos da categoria. “Estão retirando benefícios nossos. Não temos culpa pelo erro. Isso deixa a gente apreensivo, num momento de dificuldades econômicas”, lamentou. Rios ainda não fez os cálculos de quanto perderá no contracheque.

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Decepção em momento de crise

Os movimentos sindicais calculam que os beneficiados com as gratificações devem sofrer impacto entre R$ 200 a R$ 500, a depender dos cargos exercidos na época. O presidente do Sindicato dos Servidores Públicos do Distrito Federal (Sindser-DF), André Luiz da Conceição, acredita que, em uma época em que servidores não tiveram reajustes se torna uma situação desconfortável a retirada da gratificação. “Estamos estudando o processo para viabilizar uma ação para evitar que os servidores tenham essa perda financeira”, afirmou. De acordo com o sindicalista, os afetados fazem parte de diversos órgãos do GDF — a maioria perto da aposentadoria.

O doutor em ciências políticas e administração pela Universidade de Brasília (UnB) José Matias-Pereira avalia que decisões judiciais que suspendem benefícios aprovados por lei causam um grande desconforto entre os servidores públicos. “Há um número significativo de pessoas que incorporaram o benefício ao salário e, no momento seguinte, em que essas vantagens são cortadas, há um impacto financeiro na vida e na família dessas pessoas”, afirma.

 

No entanto, resssalta o cientista político, não resta alternativa ao governo, quando há uma decisão judicial, principalmente à qual não cabem mais recursos,que não seja o corte. “O ideal é que as decisões sejam tomadas num período mais curto possível, para evitar danos econômicos e também para não criar expectativas nesses servidores que estão recebendo”, diz José Matias. O especialista destaca que órgãos de controle precisam melhorar o seu nível de desempenho e priorizar essas questões que são mais relevantes.