Correio braziliense, n. 19329, 27/04/2016. Política, p. 3

Renan entre gregos e troianos

Paulo de Tarso Lyra

Julia Chaib

Aliado da presidente Dilma Rousseff em sua batalha pela sobrevivência e sem querer comprar brigas desnecessárias com um cada vez mais provável governo de Michel Temer, o Presidente do SenadoRenan Calheiros (PMDB-AL), veste o uniforme da imparcialidade de presidente do Congresso e equilibra-se entre gregos e troianos na batalha política travada no país.

Ontem, Renan reuniu-se com movimentos sociais contrários ao impeachment pela manhã e, à tarde, encontrou-se com Lula e Dilma. Hoje, será visitado, em audiências separadas, por Michel Temer e pelo presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves. Segundo apurou o Correio, Lula e Dilma pediram as conversas com Renan. Já os encontros com Temer e Aécio foram marcados pelo peemedebista.

“Eu vou continuar conversando com todos. Conversar não arranca pedaço. Eu hoje (ontem) recebi os movimentos sociais, os prefeitos que estão com Dilma. Amanhã (hoje), vou conversar com o vice-presidente Michel Temer e, logo em seguida, com o presidente do PSDB, senador Aécio Neves”, disse. Renan afirmou acreditar que o papel do Presidente do Senado é esse para demonstrar isenção e responsabilidade.

“Conversar para tentar construir convergência com todos os atores desta crise política e pensando no Brasil, na necessidade de se ampliar a previsibilidade política e constitucional, eu, a cada dia, entendo que preciso fazer muito mais nessa direção.” Um aliado de Renan explicou que as conversas com Temer e Aécio já estavam pré-acertadas. Mas a decisão de confirmá-las para hoje foi tomada após o peemedebista ter sido procurado ontem pelos petistas. “Ele vai fazer isso sempre. Se alguém do lado A o procurar, ele vai atender. Mas também não deixará de conversar com o lado B. Ele não quer ser acusado, depois, de estar privilegiado um deles”, explicou um aliado.

Um desafeto de Renan provocou o Presidente do Senado, lembrando que ele é um dos investigados na Operação Lava-Jato. “Quanto mais ele puder se equilibrar em torno de quem possa dar-lhe sustentabilidade política e guarida contra as investigações, mais seguro vai se sentir”, criticou o peemedebista.

Outra interpretação é de que, ao agir assim, Renan tenta diferenciar-se do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Também investigado na Lava-Jato, Cunha é réu no Supremo Tribunal Federal, algo que Renan ainda não é. O presidente da Câmara claramente trabalhou na aprovação do processo de impeachment na Casa e vem sendo hostilizado por setores da sociedade que defendem o combate à corrupção. Renan não pretende atrair para si holofotes desnecessários neste momento de crise política.

 

Eleições

O Presidente do Senado negou que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenha feito qualquer apelo para que sejam convocadas novas eleições. “Ele não tratou de antecipação de eleições, de convocação de novas eleições e isso não seria o caso”, disse. Eleições gerais — ou, pelo menos, para presidente da República — é uma das teses que vêm sendo defendidas pelo governo para evitar o colapso de Dilma e do PT. Mas o próprio Lula já vem desistindo da ideia, alegando que ela faria sentido se Dilma escapasse do impeachment, hipótese considerada cada vez menos provável.

Renan também afirmou que ele não teceu comentários sobre as movimentações do vice para montar um eventual futuro ministério. “Ele não comentou sobre isso e demonstrou muita preocupação com os desdobramentos da crise política e com a defesa dos valores democráticos”, disse.

O senador alagoano também pretende manter o tom de neutralidade nas indicações para um possível ministério de Temer. “Eu não apoio, não indico, não avalizo nem nome para nenhuma pasta”, disse ele, durante reunião com senadores na presidência da Casa. Já o PSDB decidiu que o partido não indicará quadros para um eventual governo Temer. Mas, caso o vice queira, basta fazer o convite à direção do partido, que avaliará, mas não deve se opor. “O que queremos é um compromisso com essa agenda: aprofundamento das investigações da Lava-Jato, reforma de Estado, reforma política para que não tenhamos número excessivo de partidos”, disse o senador Aécio Neves (PSDB-MG).

 

Frase

“Eu vou continuar conversando com todos. Conversar não arranca pedaço”

 

RENAN CALHEIROS (PMDB-AL), PRESIDENTE DO SENADO