O Estado de São Paulo, n. 44727, 02/04/2016. Política, p. A5

MORO VÊ RELAÇÃO DE CASO COM MORTE DE PREFEITO DO PT

Para o juiz, repasse de R$ 6 mi para empresário preso ontem, alvo da Carbono 14, pode estar ligado a assassinato ocorrido em 2001
Por: Eliuzabeth Lopes/ Ricardo Brandt/ Júlia Afonso

 

O juiz federal Sérgio Moro, que conduz os processos da Lava Jato, afirmou ser “possível” o esquema criminoso alvo da Operação Carbono 14, que envolve o repasse de R$ 6 milhões para o empresário Ronan Maria Pinto, dono do Diário do Grande ABC, manter “alguma relação com o homicídio, em janeiro de 2002, do então Prefeito de Santo André, Celso Daniel (PT)”. A 27.ª fase deflagrada ontem prendeu o empresário e o ex-secretário geral do PT Silvio Pereira. “É ainda possível que este esquema criminoso tenha alguma relação com o homicídio, em janeiro de 2002, do então Prefeito de Santo André, Celso Daniel, o que é ainda mais grave”, escreveu Moro em seu decreto de prisão. Para a força-tarefa da Lava Jato, o crime contra Celso Daniel é uma das hipóteses que justificariam o suposto crime de extorsão, que teria sido praticado por Ronan e resultado no repasse fraudulento dos R$ 6 milhões. Outra hipótese é de chantagem relacionada a revelação pública de esquemas de corrupção envolvendo administrações petistas. Um dos elementos que leva a Lava Jato a considerar a relação do assassinato com a chantagem como origem do repasse foi o depoimento do empresário mineiro Marcos Valério, operador de propinas no mensalão, em 2012. Ele participou diretamente da operação de lavagem para repasse dos valores a Ronan. Segundo o operador, o pagamento serviria para que o empresário parasse de “chantagear” o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o então chefe de gabinete da Presidência, Gilberto Carvalho, e o então ministro da Casa Civil, José Dirceu– preso desde março, pela Lava Jato. “Se confirmado o depoimento de Marcos Valério, de que os valores lhe foram destinados em extorsão de dirigentes do Partido dos Trabalhadores, a conduta é ainda mais grave, pois, além da ousadia na extorsão de na época autoridades da elevada Administração Pública, o fato contribuiu para a obstrução da Justiça e completa apuração dos crimes havidos no âmbito da Prefeitura de Santo André”, afirma Moro.

 

Competência. A Lava Jato não investiga o assassinato nem vai reabrir o caso. Não compete ao Ministério Público Federal a investigação sobre crimes de homicídio–que deve ser feito pelo Ministério Público Estadual. O procurador da República Diogo Castor de Mattos, da força-tarefa da Lava Jato, afirmou que “o objeto dessa operação (Carbono 14) é esclarecer o esquema de lavagem de dinheiro do Banco Schahin e saber a razão do empresário Ronan Maria Pinto ter recebido R$ 6 milhões (do total desse empréstimo)”. No despacho em que determinou a prisão dos dois alvos e a condução coercitiva de outras duas pessoas ligadas ao PT – o ex-tesoureiro Delúbio Soares e o jornalista Breno Altman –,Moro cita um depoimento prestado pelo irmão de Celso Daniel, Bruno José Daniel, ouvido pelos procuradores da Lava Jato em janeiro. “Relatou em síntese que, após o homicídio, lhe foi relatada a existência desse esquema criminoso e que envolvia repasses de parte dos valores da extorsão ao Partido dos Trabalhadores. O fato lhe teria sido relatado por Gilberto Carvalho e por Miriam Belchior (ex-mulher de Celso Daniel e atual presidente da Caixa Econômica Federal). O destinatário dos valores devidos ao Partido dos Trabalhadores seria José Dirceu”, registra Moro. / ELIZABETH LOPES, RICARDO BRANDT e JULIA AFFONSO

 

‘Grave’

“É possível que este esquema criminoso tenha alguma relação com o homicídio do prefeito Celso Daniel, o que é mais grave”

Sérgio Moro

JUIZ FEDERAL