O Estado de São Paulo, n. 44727, 02/04/2016. Política, p. A8

STF DIVULGA TEXTO SOBRE AFASTAMENTO DE TEMER

Minuta sem assinatura de Marco Aurélio diz que Câmara deve abrir comissão contra vice
Por: Gustavo Aguiar

 

Gustavo Aguiar / BRASÍLIA

 

Minuta de decisão em caráter liminar, divulgada ontem por engano da assessoria de imprensa do Supremo Tribunal Federal, determina que o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), aceite pedido de impeachment contra o vice-presidente da República, Michel Temer, e instale uma comissão especial na Casa para analisar o processo. O assunto está sob análise do ministro Marco Aurélio Mello, que, procurado após a divulgação do documento, negou que já tivesse despachado sobre o caso e afirmou que só vai divulgar seu entendimento a respeito na próxima segunda-feira. Minuta é uma espécie de rascunho de um documento como um contrato, um projeto ou uma decisão judicial. O texto só se torna oficial se for chancelado pelos envolvidos, isto é, se tiver a assinatura de um magistrado, no caso de decisões judiciais. Minutos depois da divulgação do documento, a assessoria de imprensa do STF informou que o despacho estava em elaboração e ainda não havia sido assinado pelo ministro, tratando-se, portanto, de um “erro de comunicação”. Se o entendimento contido na minuta for confirmado por Marco Aurélio, Temer ficará na mesma condição da presidente Dilma Rousseff, que é alvo de pedido de impeachment analisado por uma comissão especial na Câmara. A minuta trata de pedido do advogado mineiro Mariel Márley Marra, que requereu ao Supremo o desarquivamento de denúncia apresentada à Câmara contra Temer. Ele sustenta que o peemedebista cometeu crime de responsabilidade e atentado contra alei orçamentária ao assinar, como presidente em exercício durante viagens internacionais de Dilma, quatro decretos que autorizavam a abertura de crédito suplementar sem autorização do Congresso e em desacordo com a meta fiscal vigente. A manobra é a mesma que baseia o procedimento contra a petista em análise na comissão do impeachment. Conforme o texto divulgado pelo Supremo, Marco Aurélio entende que Cunha extrapolou suas atribuições ao arquivar o pedido de afastamento protocolado pelo advogado. Ao presidente da Câmara, caberia apenas analisar aspectos formais da denúncia, decidindo sobre sua admissibilidade. Contudo, Cunha teria julgado indevidamente o mérito do caso, ao entender que não há indícios de que o vice-presidente cometeu crime de responsabilidade. A análise do mérito, diz a minuta, deve ser feita pela por um colegiado formado por vários partidos. “Embora tenha reconhecido, de maneira expressa, a regularidade formal da denúncia, (Cunha) procedeu a verdadeiro julgamento singular de mérito, no que assentou a ausência de crime de responsabilidade praticado pelo Vice-Presidente da República, desbordando, até mesmo, de simples exame de justa causa”, diz a minuta. No texto, o ministro pondera que não emite nenhum juízo sobre a conduta de Temer, revelada na edição dos decretos citados por Marra. “Ante o quadro, defiro parcialmente a liminar para, afastando os efeitos do ato impugnado, determinar o seguimento da denúncia, vindo a desaguar na formação da comissão especial, a qual emitirá parecer (sobre o pedido de impeachment)”, escreveu Marco Aurélio, conforme a minuta divulgada.

 

Rejeição. No pedido ao Supremo, o advogado solicitou também que o impeachment de Dilma fosse suspenso até uma decisão final sobre o caso do vice-presidente. Esse pedido é rejeitado na minuta. O advogado argumenta ainda que há tempo para incluir a denúncia contra Temer no processo já aberto contra Dilma. Marco Aurélio defendeu nesta semana, publicamente, que o impeachment de Dilma não seria suficiente para resolver a crise pela qual passa o País. Ele sugeriu que a presidente pode ter razão quando afirma que a falta de fundamento jurídico da denúncia pode caracterizar o afastamento como “golpe”

 

CRONOLOGIA

 

Do consenso à ‘precipitação’

 

Funasa

Cinco dias antes da reunião do Diretório Nacional do PMDB, a presidente Dilma Rousseff exonera um aliado do vice Michel Temer da presidência da Funasa por se recusar a abrir espaço para indicações do PTN e PMB.

 

Turismo

O ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves (foto), se antecipa ao Diretório Nacional do PMDB e pede exoneração do cargo. Alega que o diálogo “se exauriu” e diz que seu partido está diante de escolher seu caminho “sob a presidência de meu companheiro de tantas lutas, Michel Temer”.

 

Desembarque

Na reunião do Diretório Nacional, na terça, o PMDB oficializa seu desembarque do governo e determina que seus filiados entreguem os ministérios e os cargos que ocupam no Executivo em duas semanas. Os presidentes da sigla, Temer, e do Senado, Renan Calheiros, não vão ao encontro.

 

Degola

A presidente Dilma Rousseff exonera, na sequência do rompimento com o PMDB, o diretor-geral do Dnocs, um diretor da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e o vice-presidente de Riscos da Caixa, todos ligados à sigla. Os ministros da legenda no governo, no entanto, não entregam suas pastas, expondo assim um racha.

 

Precipitação

O presidente do Senado, Renan Calheiros, esquenta o debate sobre a divisão na legenda ao declarar que o rompimento de seu partido com o governo foi “precipitado”. Seus aliados afirmam que houve quebra de acordo por parte do grupo ligado a Temer combinado no dia da eleição que reconduziu o vice-presidente ao comando da sigla.