Valor econômico, v. 16, n. 3987, 19/04/2016. Brasil, p. A7

CNA encontra-se com Temer para dar apoio e apresentar pauta do setor

Cristiano Zaia

Comprometido com uma posição pró-impeachment de Dilma Rousseff, um dia após a Câmara autorizar a abertura do processo de impeachment da presidente o presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), João Martins, disse aoValorque vários presidentes de entidades patronais de setores como a indústria o comércio e os transportes devem manifestar apoio ao vice-presidente Michel Temer na semana que vem, em encontro em São Paulo.

Na ocasião, que ainda está sendo acertada pelo empresariado, as confederações, aí incluída a própria CNA, vão "provocar" Temer para que faça um pacto com o setor empresarial para recuperação da economia brasileira no caso de o pemedebista assumir a Presidência da República. A ideia também é apresentar seus pedidos para um eventual novo governo do pemedebista.

O maior envolvimento da CNA no xadrez de Brasília acontece num momento em que a crise política mexe diretamente com a estrutura de poder interna da rede de federações e sindicatos da entidade, que já vem declarando guerra aberta contra a ministra da Agricultura, Kátia Abreu, amiga e defensora ferrenha de Dilma.

Segundo Martins, a palavra de ordem entre os diretores da instituição é impedi-la de retomar a presidência da entidade - a ministra é presidente licenciada da CNA desde o início de 2015. Várias federações devem sugerir a Kátia que renuncie ao comando da Confederação e se "for necessário vamos convocar novas eleições".

Em fala dura, Martins avalia que a posição de Kátia Abreu como liderança política máxima do setor do agronegócio "chegou ao fim" e que ela cometeu um "suicídio político" no momento em que escolheu defender o atual governo e "cortou o cordão umbilical" que tinha com os produtores rurais e com a própria CNA.

"A diretoria [da CNA] já se posicionou que não aceita mais o retorno dela à presidência e as federações estão com esse mesmo propósito", destacou ele, lembrando que 26 das 27 federações de agricultura e pecuária vinculadas à entidade não apoiam a volta da ministra. "A casa está consciente de que vamos aos extremos para evitar o retorno dela, e essa não é uma palavra dopresidente, e sim de todos os diretores", frisou.

Martins sempre foi um dos principais aliados de Kátia nos oito anos em que ela presidiu a entidade de classe e, ao longo do ano passado - o primeiro da gestão da senadora à frente do ministério -, esteve leal à ministra e totalmente alinhado com as bandeiras políticas dela. Diz, contudo, que sua relação como atual presidente da CNA com Kátia Abreu, enquanto permanecer ministra da Agricultura, "vai parar". O aprofundamento da crise política e o fato de Kátia não ficar do lado do segmento rural em relação aogoverno levou a essa situação, explica.

Em reunião na semana passada com a CNA, 14 entidades representativas do setor, a maioria delas presididas por empresários aliados ou amigos de Kátia Abreu manifestaram apoio à estratégia da CNA a favor do impeachment de Dilma. Entre elas estavam a Aprosoja (produtores de soja), a Abiec (indústria do setor de carne bovina), a Abramilho (produtores de milho) e a Abrafrutas(produtores e exportadores de frutas).

Quando questionado, porém, se tinha pretensões de se candidatar a presidente da CNA, Martins, que é vice-presidente da entidade eleito na chapa de Kátia, diz que não está em campanha para o cargo e que apenas será candidato caso a diretoria colegiada apoiá-lo. "Hoje é um consenso da casa blindar a CNA de qualquer interferência político-partidária, isso não podemos permitir".

 

Em sua conta no Twitter, a ministra disse na madrugada de ontem, que continua ao lado de Dilma "acreditando em sua honestidade" e que ela "não roubou e não cometeu crime de responsabilidade". Procurada pela reportagem, Kátia não quis comentar as declarações de Martins.