Valor econômico, v. 16, n. 3987, 19/04/2016. Brasil, p. A7

"Ninguém vai parar nada que o país não queira parar", diz FHC sobre Lava-Jato

André Guilherme Vieira

Cristiane Agostine

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) descartou ontem, em evento realizado pela Fundação Getulio Vargas, em São Paulo, que a Operação Lava-Jato fique ameaçada em um eventual governo comandado pelo PMDB, apesar de integrantes do partido estarem entre os principais investigados pela operação por suspeita de corrupção, como o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) e o próprio vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP).

Cotado para participar de um eventual governo Temer, o ex-ministro Nelson Jobim também desconversou sobre a possibilidade de haver uma "operação abafa" na Lava-Jato caso o PMDB assuma a Presidência. "Para acontecer uma coisa dessas teria que pressupor que o Ministério da Justiça tivesse influência no poder Judiciário. Não tem nenhuma influência sobre isso. É independente a questão da Lava-Jato. É uma questão judicial, não do poder Executivo", disse, depois de participar de evento na Fecomercio, em São Paulo.

Para o ex-presidente, "a Lava-Jato, como outras apurações, tem de ser feita, o Supremo Tribunal Federal chegará o momento em que terá de opinar também", disse. "É fundamental manter muito firme a ideia de que nós temos um Estado Democrático de Direito", disse FHC a jornalistas. O ex-presidente reuniu-se ainda ontem com o presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG), em sua residência.

Fernando Henrique minimizou o fato de o PMDB já estar se articulando para alterar dispositivos legais, como a lei da delação premiada, com o objetivo de tornar a ação da Lava-Jato menos eficaz. "Quantos parlamentares há do PMDB? Sessenta e poucos. É 12% do Congresso. Nenhum partido sozinho faz nada, pode querer o que quiser, não adianta. Se não houver uma opinião nacional ninguém faz nada, não leva adiante as transformações. Ninguém vai parar nada que o país não queira parar. O país quer avançar", avaliou.

Ao falar sobre a votação do impeachment da presidente Dilma Rousseff na Câmara, FHC disse que o processo não trouxe riscos à democracia. Para Fernando Henrique, o atual momento mostra um amadurecimento e fortalecimento da democracia. "Temos uma crise de desemprego, uma crise moral por causa da corrupção e uma crise de falta de lideranças políticas. No passado já se cogitaria qual seria o militar que viria. E hoje nós nem sabemos o nome do militar. Mas sabemos os nomes dos ministros do SupremoTribunal Federal. Isso é um fato sociológico da maior importância", avaliou o ex-presidente.

 

FHC afirmou que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva criou o "presidencialismo de cooptação", que resultou em um sistema viciado que "corrompeu a democracia". Ao responder se acreditava no presidencialismo de coalizão, durante perguntas da plateia em evento sobre corrupção e independência judicial, criticou as alianças feitas pelos governos do PT. "Temos um presidencialismo de cooptação. Um certo presidente, não preciso aqui dizer quem é, resolveu fazer alianças com partidos pequenos e seguir pela cooptação. Isso é corrupção, não tem como funcionar. Esse sistema corrompeu à democracia. A própria democracia está corroída", disse.