Valor econômico, v. 16, n. 3988, 21/04/2016. Política, p. A8

Tempo joga contra mudança da meta fiscal

Ribamar Oliveira

Raphael Di Cunto

Thiago Resende

Se confirmado o afastamento da presidente Dilma Rousseff no Senado, o vice-presidente Michel Temer pode ter poucos dias depois de sua posse para articular um acordo político que permita aprovar a mudança da meta fiscal deste ano antes do dia 22 de maio. Caso isso não aconteça, Temer será obrigado a assinar um decreto de contingenciamento das despesas da União, que vai paralisar a administração federal, sob pena de criar um pretexto para que se entre com um pedido de impeachment contra ele.

Na hipótese de Temer não tomar posse antes do dia 22 de maio, Dilma será obrigada a adotar medidas drásticas de contenção de gastos, pois dificilmente conseguirá aprovar a mudança da meta fiscal. O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), não deixou dúvidas sobre isso ontem. Ele afirmou que não há condições políticas de aprovar a mudança na meta de superávit primário enquanto houver incertezas sobre a continuidade do governo.

"O Senado deveria se posicionar rapidamente (sobre o pedido de afastamento da presidente Dilma) porque a Câmara dos Deputados dificilmente participará de sessão do Congresso Nacional para votar esse projeto (de mudança da meta)", disse Cunha. "Do ponto de vista político, a Câmara já não reconhece mais esse governo".

O líder do DEM na Câmara, Pauderney Avelino (AM), disse que o seu partido votará pela rejeição de todas as medidas provisórias e obstruirá outros projetos em pauta na Casa enquanto o Senado não decidir pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff. "Não vamos dar nenhum suspiro para esse governo em estado terminal", disse.

A mudança da meta, que consta da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), tem que ser aprovada em sessão do Congresso, depois de ser discutida e votada pela Comissão Mista de Orçamento (CMO). O problema é que, até agora, a CMO sequer teve os seus membros indicados pelos líderes partidários. Por isso mesmo, não possui presidente e o projeto que muda a meta fiscal inscrita na LDO ainda não tem relator designado.

Os líderes partidários teriam até o quinto dia útil do mês de março para indicar, ao presidente do Congresso Nacional, Renan Calheiros (PMDB-AL), os representantes de suas bancadas na CMO. Isto não foi feito neste ano por causa da chamada janela partidária, pois a legislação permitiu que os parlamentares mudassem de partido. Depois que acabou o prazo para a mudança de partido, teve início a análise do pedido de impeachment da presidente Dilma, que paralisou todas as demais iniciativas da Câmara.

A Constituição exige que a Comissão Mista de Orçamento discuta e aprove o projeto de mudança da LDO, antes da votação da matéria pelo plenário do Congresso. O regimento comum das duas Casas prevê, no entanto, que o presidente do Congresso pode avocar para o plenário o projeto de lei de mudança da LDO e designar um relator. Mas isso precisa ter a concordância dos líderes partidários. O problema é que o próprio presidente da Câmara disse ontem que sequer concorda com a realização da reunião do Congresso para aprovar a mudança na LDO antes da definição sobre o impeachment.

A mudança da meta de superávit primário é necessária porque o entendimento definido pelo Tribunal de Contas da União (TCU), ao votar o processo sobre as chamadas "pedaladas fiscais", foi de que o governo não pode editar decreto de crédito suplementar se já avaliou que não é possível cumprir a meta de superávit primário definida na LDO para o ano. Para 2016, a meta é de R$ 30,5 bilhões.

No fim de março, pressionada pela queda continuada da receita da União neste ano, a presidente Dilma encaminhou ao Congresso um projeto de lei com a mudança da meta fiscal. Dilma pediu autorização para que o déficit primário chegue até R$ 96 bilhões.

 

No dia 22 de maio, o governo terá que apresentar o relatório de avaliação de receitas e despesas relativo ao segundo bimestre deste ano. A arrecadação continua em queda. Em março, a receita federal caiu 6,96%, em termos reais, na comparação com o mesmo mês de 2015. Dependendo do resultado de abril, o governo provavelmente terá que aumentar ainda mais o déficit previsto para este ano.