Título: Complô duvidoso
Autor: Tranches, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 14/10/2011, Mundo, p. 14

Casa Branca envia emissários para expor versão sobre planos do Irã de assassinar o embaixador saudita em Washington. Especialistas questionam dados da inteligência norte-americana

Os Estados Unidos deram início a uma campanha internacional para convencer outros governos da participação do Irã em um complô para matar o embaixador da Arábia Saudita em Washington, ao mesmo tempo em que veem crescer, internamente, a desconfiança e o ceticismo. Na imprensa norte-americana, especialistas e políticos levantam toda sorte de questionamentos sobre a versão segundo a qual dois iranianos teriam planejando atentados na capital americana, com o aval de Teerã e ajuda até de narcotraficantes mexicanos. Mesmo agentes envolvidos na investigação manifestam dúvidas. Ao falar pela primeira vez sobre a denúncia, levada a público na terça-feira pelo FBI (polícia federal dos EUA), o presidente Barack Obama manteve um tom resoluto e garantiu que seu governo não faria a denúncia se não tivesse como comprová-la.

Uma comitiva formada por "várias autoridades" norte-americanas visitará países estratégicos, como China e Rússia, membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, e a Turquia, potência regional aliada de Washington e vizinha do Irã. Uma fonte do Departamento de Estado afirmou à agência de notícias France-Presse que as "equipes de informação" são compostas por pessoas "inteiradas dos detalhes do plano e da maneira como ele foi descoberto".

São justamente os detalhes do complô que, para muitas pessoas nos EUA, inclusive do governo, ainda não foram esclarecidos. Sites dos principais veículos de comunicação trouxeram ontem reportagens e artigos de opinião que questionavam desde dados operacionais até os possíveis objetivos do Irã em patrocinar um ato que poderia desencadear um grande conflito. O episódio foi mais que suficiente para recrudescer a tensão perene entre Washington e Teerã e acirrar as relações entre o regime islâmico e seus vizinhos.

Autor de um artigo divulgado no site do CNN, o diretor de estudos de política externa do Instituto Cato, Justin Logan, afirmou ao Correio que a maior dúvida, para ele, é quanto ao propósito do governo iraniano com o atentado. "Se tudo acontecesse de acordo com o plano e o embaixador saudita) realmente fosse morto, o que deveria ocorrer em seguida? O que exatamente o Irã tinha a intenção de começar?", reforça.

Na opinião de Logan, o crime organizado no México não teria qualquer interesse em se envolver em uma crise de tamanha proporção, considerando a quantia que receberia pelo suposto atentado ¿ US$ 1,5 milhão, valor irrisório para o volume de dinheiro que o narcotráfico movimenta. "Por que a inteligência iraniana procuraria alguém no México para executar um trabalho como esse?"

Inconsistente Funcionários norte-americanos revelaram ao jornal The Washington Post que o esquema do suposto ataque se mostrou tão confuso e insólito que encontraram dificuldade em acreditar na participação do governo iraniano. "O que vimos parecia ser inconsistente com o padrão observado no passado", afirmou uma das fontes ao jornal, se referindo a outras ações atribuídas à Força Quds, divisão da Guarda Revolucionária, unidade militar de elite do Irã.

Desde que revelou a trama, o governo Obama tem sido pressionado a dar mais explicações sobre o envolvimento dos suspeitos com o regime dos aiatolás. Ao falar do caso pela primeira vez, o presidente prometeu "sanções mais duras" contra Teerã e reiterou não ter dúvidas quanto ao envolvimento de altos escalões da República Islâmica. "Não teríamos apresentado a denúncia a menos que soubéssemos exatamente como provar as afirmações", alegou. Washington e Teerã não mantêm relações diplomáticas diretas há mais de 30 anos. O Departamento de Estado afirmou, porém, que os dois países estabeleceram um "contato direto" na quarta-feira para falar sobre o incidente, mas não foi revelado como exatamente ocorreu a conversa. A porta-voz do órgão, Victoria Nuland, apenas garantiu que ela não ocorreu no Irã.

Aviso à Coreia do Norte O presidente Barack Obama ameaçou ontem a Coreia do Norte com mais isolamento e pressão diplomática, caso insista em fazer "novas provocações" como as que sacudiram a Ásia no ano passado. Depois de ter recebido na Casa Branca o colega sul-coreano, Lee Myung-Bak Lee, o presidente americano reiterou o convite ao regime comunista norte-coreano para que cumpra seus compromissos internacionais relativos ao desarmamento nuclear e cesse as intimidações à vizinha do sul. "A aliança entre os EUA e a Coreia (do sul) está mais forte do que nunca", disse o anfitrião. "Nossos governos falam a uma só voz e assim prosseguiremos."