Valor econômico, v. 16, n. 3988, 21/04/2016. Política, p. A10

Ex-assessor de Delcidio compromete Dilma e Cardozo em delação premiada

Leticia Casado

O assessor parlamentar Diogo Ferreira, que trabalhou para o senador Delcídio do Amaral (sem partido-MS), confirmou ontem em delação premiada informações do parlamentar sobre uma suposta tentativa da presidente Dilma Rousseff e do ministro da Advocacia Geral da União (AGU), José Eduardo Cardozo, de obstruir a Operação Lava-Jato. Delcidio e Diogo foram presos em novembro do ano passado, por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF), acusados de tentarem impedir a colaboração de outro delator, o ex-diretor de área internacional da Petrobras, Nestor Cerveró.

A trama descrita por Ferreira teria tido a participação não só de Delcídio, Dilma e Cardozo, mas também do ministro do Superior Tribunal de Justiça Marcelo Navarro. A nomeação de Navarro, em 2015, teria sido condicionada por Dilma a que ele votasse em linha favorável a presos da Lava-Jato, incluindo o julgamento de habeas corpus de Marcelo Odebrecht.

Ferreira disse que não esteve com a presidente da República ou com os ministros, mas que ouviu histórias contadas pelo senador.

Ele disse que Delcídio lhe contou ter tido um encontro particular com a presidente "a qual lhe pedira, na ocasião, que obtivesse de Marcelo Navarro o compromisso de alinhamento com o governo para libertar determinados réus importantes" da Lava-Jato e falou "expressamente em Marcelo Odebrecht". Ferreira relatou uma mensagem trocada com Navarro marcando reunião com o senador.

Sobre o ex-presidente Luiz Inacio Lula da Silva, Ferreira disse que ele teria tentado embaraçar a Lava-Jato ao coordenar esquema para pagar à família de Cerveró para que ele não fizesse delação. Os pagamentos teriam sido bancados pelo pecuarista José Carlos Bumlai e por seu filho Maurício, negociados por Delcídio e operacionalizados por Ferreira e Edson Ribeiro, então advogado de Cerveró.

Ferreira disse ter ido três vezes a São Paulo pegar dinheiro destinado por Maurício Bumlai para entregar a Ribeiro e comprar o silêncio de Cerveró. Delcídio disse que cada pagamento foi de R$ 50 mil.

Na primeira viagem, entrou em um carro no aeroporto "e no soalho havia uma sacola com uma caixa de um vinho". O motorista lhe disse "que aquela era a encomenda de Mauricio Bumlai". Ele voltou ao terminal, esperou Ribeiro e entregou a sacola. Na segunda, Ferreira se encontrou com Maurício Bumlai, foram a uma agência bancária e o empresário lhe entregou um envelope branco. Depois, Ribeiro lhe encontrou no hotel e guardou o envelope em uma pasta verde.

Na terceira, Ferreira foi abordado no aeroporto por um homem chamado Alexandre, eles entraram em um carro e Alexandre lhe passou uma sacola, "ao que se recorda da loja Renner, com uma caixa de sapatos fechada com fita adesiva; que havia um buraco na caixa de sapatos, permitindo ao depoente ver, como efetivamente viu, que havia dinheiro em espécie em seu interior".

 

O ministro Cardozo disse ser "absolutamente inverossímil" a versão de que houve negociação do governo federal no STJ. Ele disse que a decisão sobre a soltura não era monocrática, então nem haveria sentido em negociar com apenas um ministro. O ministro Navarro reiteirou que nunca conversou sobre favorecimento a executivos presos pela Lava-Jato. Cristiano Zanin, que defende Lula, nega que o ex-presidente tenha interferido e disse que delação não é prova. A defesa dos Bumlai diz que Maurício jamais deu dinheiro a Diogo Ferreira e que já prestou esclarecimentos sobre o assunto.