Valor econômico, v. 16, n. 3990, 25/04/2016. Política, p. A5

CRISE COMPROMETE AGENDA POSITIVA DE DINO NO MARANHÃO

Por: Marcos de Moura e Souza

Por Marcos de Moura e Souza | De São Luís

 

Uma vez por mês, um grupo de empresários do Maranhão visita o Palácio dos Leões, sede do governo, paradiscutir medidas que possam ajudar a economia e os negócios no Estado. Do outro lado da mesa, sentam-sesecretários de governo e, na maioria das vezes, o próprio governador. Flávio Dino se diz um socialista convicto. Ele é o primeiro e único governador que o PCdoB já elegeu no país desde sua criação, em 1922. Fiel à presidente Dilma Rousseff, a legenda é a mais tradicional da esquerda no Brasil e se norteia por escritos de Marx, Engels e Lênin. O conflito entre capital e trabalho está no DNA do partido.

"Se existe surpresa, é uma surpresa agradável", diz o presidente da Federação das Indústrias do Estado do Maranhão (Fiema), Edilson Baldez Neves sobre a experiência do governo comunista do Estado. Neves é um dos empresários que integram o conselho que participa das reuniões mensais com o governo. "As decisões são tomadas na hora, todos os encaminhamentos são feitos com os secretários. Eles estão ouvindo e negociando. Isso para a gente é uma surpresa muito agradável."

Flávio Dino conseguiu uma proeza dupla em 2014, quando foi eleito: além de pôr o PCdoB num governo, desbancou a família mais poderosa e influente do Maranhão, a família Sarney.

O adversário de Dino era Lobão Filho (PMDB), apoiado pela então governadora Roseana Sarney (PMDB), por seu pai, o senador José Sarney (PMDB) e pelo então ministro das Minas e Energia, Edison Lobão (PMDB). O PT maranhense - que era base de Roseana - também apoiou o filho do ministro. Os Sarney, nas contas de seus opositores, haviam eleito governadores por cerca de meio século. Em 2014, Dino ganhou no primeiro turno com 63,5% dos votos válidos.

Passado um ano e meio da vitória, o governador ainda tem popularidade alta, mas enfrenta dificuldades para pôr em prática, na velocidade que imaginava, promessas que empolgaram os maranhenses, especialmente os mais pobres.

No primeiro ano de governo, Flávio Dino, abriu os cofres. Pagou aumentos aos servidores e os professores, por exemplo, com 40 horas de aula por semana passaram a ter, segundo dados do governo, o segundo maior salário do país, de cerca de R$ 4,9 mil. O governo também lançou um pacote de obras de asfaltamento pelo Estado; concedeu R$ 70 milhões em isenções fiscais para impulsionar a iniciativa privada; montou um programa com uma série de serviços em 30 cidades com piores indicadores sociais pagando R$ 20 mil para médicos e R$ 9 mil para enfermeiros; e começou a substituir as indignas escolas que ainda funcionam em construções de barro e palha por escolas de tijolo e cimento.

Mas com o país em seu segundo ano de recessão, a agenda de Dino ficou cara.

"No ano passado a gente conseguiu andar bem, Neste ano, não conseguimos ampliar benefícios para servidores. Zero. É impossível. Não tem dinheiro. Alguns concursos, tivemos de adiar. E algumas coisas diminuímos o ritmo. No ano passado, por exemplo, tivemos obras asfaltamento em 100 cidades e neste ano, no máximo, vamos chegar a 30", disse o governador ao Valor.

administração de Dino tem aprovação de 65% da população. Assim que venceu, ele viu o número de aliados crescer. O PT, por exemplo, aderiu a ele e comanda hoje duas secretarias. O PSDB, seu aliado desde a campanha, tem o vice-governador e também duas pastas. A oposição na Assembleia Legislativa é pequena e representada por deputados ligados ao clã Sarney.

Críticos do governador, no entanto, dizem que ele é excessivamente centralizador, que montou um secretariado fraco, que iniciou a gestão fazendo agrados caros aos servidores, que as portas do governo só estão abertas para empresários amigos e que suas promessas começaram a travar sem ajuda do governo federal e com a economia parada.

Andrea Murad, deputada estadual pelo PMDB, bate na tecla da saúde. Acusa Dino de, ter piorado o atendimento e a estrutura nos hospitais e em unidades básicas porque o bolo de recursos caiu. Seu pai - cunhado da ex-governadora Roseana - foi secretário de Saúde por cinco anos nos governos dela.

Andrea também rebate o discurso do atual governo em relação aos Sarney. "Depois de muitos anos no poder é natural que haja desgaste. Mas é hipócrita esse discurso do Flávio Dino de colocar toda a culpa no passado para justificar o que ele não está fazendo". A campanha de Dino martelou a mensagem de que ele seria o novo depois de um período de 50 anos de poder dos Sarney. O discurso era contra o que ele classificava - e ainda o faz - de patrimonialismo escancarado que misturava negócios de governo com negócios privados. O exemplo mais visível de sua crítica está nos prédios e bens públicos com nomes da família Sarney. São escolas, hospitais, pontes, fóruns etc.

"É uma visão reveladora como se procurou eternizar supostos atributos individuais por intermédio do poder público", reclama Dino. Em 1º de janeiro de 2015, Dino assinou uma ordem estabelecendo que a partir daqueladata prédios públicos só poderiam receber nomes de pessoas que já tinha morrido e que não tinham ficha suja. O Ministério Público Federal gostou da ideia e passou a recomendar que a regra retroagisse. Resultado: o governo vem apagando nomes de prédios que homenageiam os Sarney. Exemplo recente é uma escola estadual em São Luís que se chamava Roseana Sarney e agora se chama João Evangelista Serra dos Santos.

Para o governador isso é o acessório. O principal diz respeito aos recursos. "Eu não tenho nenhuma empresa familiar, nem pessoal prestando serviços para o Estado, nem empresas de amigos. Nosso governo tem um ano e três meses e não tem nada do que se aproxime do patrimonialismo." Ele afirma que sua gestão até agora foi reconhecida por isso. "Nós saímos do último lugar no ranking da Controladoria-Geral da União e chegamos em primeiro lugar, em transparência, em controle de gastos públicos."

Com 7 milhões de habitantes, o Maranhão tem hoje como seus principais polos de negócios o porto de Itaqui, a duplicação de uma ferrovia da Vale, a ampliação da fábrica de celulose da Suzano, empresas de ferro gusa e oagronegócio, com destaque de feijão, milho e soja. Mas o Estado tem o histórico de ser um dos mais pobres do país. É o segundo em casos de hanseníase e o analfabetismo atinge 20% dos adultos.

Ex-juiz federal, ex-deputado federal, Flávio Dino, 47 anos, diz que sua "utopia ideológica" é um Maranhão que ofereça oportunidades iguais a todos. Em quatro ano é possível mudar algo? Ele diz que já pensa em 2018, numa reeleição.