Valor econômico, v. 16, n. 3979, 07/04/2016. Política, p. A9

Distância entre Renan e Jucá é jogo de cena

Vandson Lima

Integrantes do primeiro time de caciques do PMDB, o presidente do Congresso Nacional, senador Renan Calheiros (AL), e o novo presidente do PMDB, senador Romero Jucá (RR), não estão rompidos e nem o farão futuramente. A discordância em relação aos desdobramentos do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, ao desembarque do PMDB do governo e eventuais trocas de farpas entre eles, garantem aliados de ambos, é jogo combinado, no qual cada um desempenhará um papel, mas ao fim, ambos terminarão unidos e se auxiliando, seja qual for o desenlace do atual cenário.

Defensor nos últimos dias da tese de realização de uma eleição geral para debelar a crise política, Renan está absolutamente ciente de que a proposta é inviável tanto do ponto de vista político quanto legal. Anteontem, senadores envolvidos na discussão lhe lembraram, entre outros aspectos, que o mecanismo utilizado para destituir um presidente pela Constituição - o impeachment - exige apoio de 2/3 dos parlamentares da Câmara (342 votos) e do Senado (54 votos). Seria um absurdo jurídico, facilmente questionável,usar uma proposta de emenda à Constituição (PEC), que exige apoio menor, de apenas 3/5 dos parlamentares, para obter o mesmo efeito de saída antecipada do eleito.

No entanto, ontem Renan dobrou a aposta, trazendo à discussão a possibilidade de um plebiscito, no qual a população fosse consultada sobre a antecipação da escolha de presidente, governadores e congressistas e alteração no sistema de governo. O senador não está iludido, alegam os mais próximos. Joga com os instrumentos que tem para, em uma tacada, acertar vários alvos: agrada o governo Dilma e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, dificultando as pretensões do vice, Michel Temer, e mostrando serviço para o caso de o governo sobreviver ao processo de impedimento; ao mesmo tempo, evita ser tachado de governista, ficando em boa posição com os que pregam o impeachment, que não necessariamente defendem Temer como presidente; e por fim, fustiga o vice, mas se torna cada vez mais necessário a ele em um eventual governo, dada a rede de relações que Renan agrega, que se estende do parlamento a órgãos de controle como o Tribunal de Contas da União (TCU).

Já Jucá, ao tomar a frente nas ações do PMDB, se cacifa com Temer e a ala pró-impeachment da sigla. Mas não ficará na chuva se tudo der errado: além de ter a admiração de Lula, de quem foi líder de governo por oito anos, Jucá conta com uma dívida de gratidão de Renan em uma dificuldade recente: na última eleição para presidente do Senado, Renan quase foi inviabilizado por uma articulação de Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC), que foi seu adversário na disputa. Apoiado pela oposição e parte do PMDB, Silveira - que faleceu meses depois, em 2015 - disse que abriria mão do posto caso Renan fizesse o mesmo em prol de Eunício Oliveira (PMDB). Renan balançou, foi pressionado, mas Jucá lhe deu apoio, o que foi fundamental para Renan se reeleger presidente da Casa.

 

Uma cena mostra o verdadeiro molde da relação dos dois pemedebistas: em seu primeiro discurso após a confirmação no comando do PMDB, Jucá lançou da tribuna do Senado uma série de ataques a Renan, que acompanhava impassível na cadeira da presidência. Questionado depois se as palavras pesadas não distanciariam Renan de um eventual governo Temer, Jucá minimizou: "Vai nada. Ele vai vir conosco, tranquilo. Ele precisa fazer outro papel". Na outra ponta, Renan manteve a compostura e foi só elogios à ascensão de Jucá na burocracia partidária. Hoje, Renan e Jucá almoçaram juntos.