Valor econômico, v. 17, n. 4011, 24/05/2016. Política, p. A8

Machado também gravou Renan e Sarney

Conversa com Jucá é um dos elementos apresentados pelo ex-presidente da Transpetro, que busca delação

Por: André Guilherme Vieira / Letícia Casado / Carolina Oms

 

O ex-senador e ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado também gravou conversas que manteve com outros líderes do PMDB,o presidente do Senado Renan Calheiros (AL) e o ex-presidente da República e ex-senador José Sarney, além da conversação mantida com o ministro licenciado e senador Romero Jucá (RR). A informação foi confirmada ao Valor por fontes com acesso à negociação da delação premiada de Machado, que está em estágio avançado na Procuradoria-Geral da República (PGR). Ele já está prestando depoimentos aos investigadores.

As novas gravações foram feitas com um telefone celular e estão em poder do ministro Teori Zavascki, relator da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), que agora vai avaliá-las. Os áudios fazem parte do material apresentado pela defesa de Machado como proposta de delação premiada. O acordo é negociado com a PGR desde o ano passado, porque envolve políticoscom foro privilegiado.

Em março deste ano, o ex-presidente da Transpetro gravou a conversa mantida com Romero Jucá, na casa do pemedebista, em que ele sugeriu uma "mudança" no governo federal que resultaria em um acordo para "estancar a sangria" que seria resultado da Lava-Jato. A gravação, cuja transcrição foi revelada ontem pelo jornal Folha de S. Paulo, levou Jucá a pedir licença do cargo de ministro do Planejamento a partir desta terça-feira.

Nos depoimentos para sua delação premiada, Sérgio Machado revelou o que sabe sobre o loteamento político da Transpetro para o PMDB. Ele contou como se daria a destinação de propinas desviadas da subsidiária da Petrobras a parlamentares.

Mas na avaliação de investigadores da operação, faltavam às informações prestadas por Machado evidências do comprometimento de pemedebistas que ele relacionou ao esquema. As gravações foram o expediente encontrado pelo ex-presidente da Transpetro para mostrar que as pessoas que acusou conhecem a corrupção na estatal.

Agora ministro licenciado, Romero Jucá é alvo de seis investigações que tramitam no STF, duas das quais referentes à Lava-Jato. Ele está entre os investigados no principal inquérito em que se apura o crime de formação de quadrilha para desvios dos cofres da Petrobras em benefício de diversos partidos.

O ministro do Supremo, Marco Aurélio Mello, autorizou a quebra dos sigilos bancário e fiscal de Jucá entre 1998 e 2002 e ordenou o fornecimento de informações sobre transações realizadas pelo pemedebista e oito empresas no período. A determinação ocorreu nos autos de inquérito que apura suspeita de desvios de verbas federais em obras municipais, e que há 12 anos se arrasta no STF.

Jucá também é investigado no suposto esquema de compra de medidas provisórias que está na mira da Operação Zelotes. A relatora desse inquérito no STF é a ministra Cármen Lúcia.

Na semana passada, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu ao Supremo a abertura de inquérito contra integrantes da cúpula do PMDB para apurar o suposto pagamento de propina na construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. Além de Jucá, são alvos da procuradoria Renan Calheiros e os senadores Valdir Raupp (PMDB-RO) e Jader Barbalho (PMDB-PA).

Jucá é ainda investigado no STF em procedimento instaurado em 2010 para apurar "possível existência de crime de falsidade ideológica, desvio de contribuições previdenciárias e contra a ordem tributária, que teriam sido praticados, em tese, pelo Senador Romero Jucá", segundo o inquérito que tem como relator na Corte o ministro Gilmar Mendes.

Jucá também figura em uma investigação sigilosa, também relatada pelo ministro do Supremo Teori Zavascki.

O ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, é afilhado político de Renan e foi indicado para presidir a empresa em 2003, com a chancela do senador. Na época, Renan também presidia o Senado.

A nomeação foi acertada com o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que cumpria o primeiro ano de seu mandato.

Machado temia ser preso a partir das revelações feitas por dois delatores da Lava-Jato: o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa e o lobista Fernando Soares, o "Baiano".

A defesa de Romero Jucá pediu à PGR acesso às gravações das conversas com Sérgio Machado.

Os advogados dele querem saber se "foi determinada a abertura de investigação, ainda que, na visão do ora requerente, não haja absolutamente qualquer ilegalidade nos referidos diálogos".

A assessoria de Sérgio Machado informou que ele não se pronunciaria sobre o assunto.

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Ex-senador tentou ser governador do Ceará

Por: Claudia Schuffner

 

O ex-senador Sergio Machado pertence a uma linha tradicional da política no Ceará. O pai, Expedito Machado, foi deputado e ministro de Viação e Obras Públicas no governo Jango. O presidente da Transpetro por onze anos ingressou na vida pública, contudo, como um dos renovadores do cenário do poder cearense.

Machado residiu o Centro Industrial do Ceará (CIC) até 1986, impulsionando a candidatura ao governo cearense de Tasso Jereissati, pelo PMDB. Após a vitória, tornou-se secretário de Governo.

Foi ainda coordenador da campanha vitoriosa de Ciro Gomes à prefeitura de Fortaleza em 1988 e dois anos depois elegeu-se a deputado federal pelo PSDB. Em 1994, chegou ao Senado e tornou-se líder da bancada.

Machado nunca foi um político de carisma. Contava com o patrocínio de Tasso para chegar ao governo do Ceará, mas foi preterido em 2002 pelo colega de Senado Lúcio Alcântara, que havia sido prefeito de Fortaleza. O então tucano rompeu com o partido e ingressou no PMDB. Candidato a governador sem o apoio de um postulante à presidência, sequer foi para o segundo turno. Machado foi indicado para presidir a Transpetro em 2003, com aval de Renan Calheiros, então líder do PMDB no Senado.

O período em que Sergio Machado presidiu a Transpetro no governo do PT foi mais longo do que o de José Sergio Gabrielli na presidência da Petrobras. Ele ficou na empresa de junho de 2003 a fevereiro de 2015. A saída de Machado não aconteceu sem resistências. Segundo uma fonte do Valor, Machado só saiu da Transpetro depois que a PricewaterhouseCoopers, auditores da Petrobras, informou que não assinaria nenhum balanço da companhia que tivesse um envolvido no esquema de corrupção da empresa assinando junto.

Naquela altura, o depoimento do ex-diretor Paulo Roberto Costa informando que tinha recebido R$ 500 mil em espécie de Sérgio Machado tornava impossível a manutenção no cargo. Mesmo assim ele resistiu três meses, renovando licenças sem vencimento. A primeira vez que o assunto foi apresentado ao conselho de administração, em 2014, o então ministro da Fazenda e presidente do conselho, Guido Mantega, interrompeu a reunião para ligar para Brasília, e os colegas esperaram cerca de 40 minutos. QuandoMantega voltou do telefonema, pediu para suspender a reunião do conselho sem que uma decisão sobre o afastamento de Machado fosse discutida.

A presidência da Transpetro só ficou vaga depois da demissão coletiva de toda a diretoria de Graça Foster, em fevereiro do ano passado. Machado levou o laptop e celular da companhia e demorou para devolver apesar dos insistentes pedidos da comissão de investigação da Petrobras. O executivo também teria estado presente no jantar em que líderes do PMDB pediram US$ 6 milhões para apoiar a manutenção de Nestor Cerveró na diretoria internacional da Petrobras, conforme foi relatado em delação premiada doex-diretor.

Em dezembro do ano passado a Polícia Federal, durante a operação batizada da Catilinárias, foi autorizada uma busca e apreensão na casa de Machado em Fortaleza. O Ministério Público do Rio de Janeiro investigava há tempos a evolução patrimonial do presidente da Transpetro. Machado é dono da TV Jangadeiro (Rede SBT), de Fortaleza.

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