O globo, n. 30230, 13/05/2016. País, p. 22

Dilma terá garantidos mais direitos que Collor

Presidente afastada poderá continuar morando na residência oficial e contará com gabinete pessoal de 15 servidores
Por: André de Souza/ Evandro Éboli/ Renata Mariz
 
 
ANDRÉ DE SOUZA, EVANDRO ÉBOLI  
E RENATA MARIZ
opais@oglobo.com.br
 

Dilma Rousseff foi afastada temporariamente do cargo, mas ainda manterá alguns direitos típicos de um presidente da República. Ela poderá, por exemplo, continuar morando na residência oficial do Palácio da Alvorada. O salário bruto de R$ 30.934,70 — que fica pouco abaixo dos R$ 23 mil quando descontados imposto de renda e contribuição com a Previdência — também está mantido. Dilma terá ainda a seu dispor um gabinete com servidores públicos, segurança pessoal, assistência à saúde, transporte aéreo e terrestre. Em 1992, quando foi afastado, Fernando Collor teve redução salarial e a maioria de seus pedidos negados.

Os direitos garantidos durante o afastamento de Dilma estão listados no mandado de intimação lido na manhã de ontem pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), durante a sessão que aprovou a continuidade do processo do impeachment. Também foi publicada no Diário Oficial da União a nomeação de 15 servidores para seu Gabinete pessoal. O cargo mais alto, de secretário-executivo, ficará com Giles Azevedo, que era assessor especial e homem de confiança da presidente afastada.

 

COLLOR FEZ LISTA EXTENSA DE EXIGÊNCIAS

Outro nomeado é Jorge Rodrigo Araújo Messias, que será assessor especial. Ele foi exonerado do cargo que ocupava até agora: subchefe para Assuntos Jurídicos da Casa Civil. Messias, ou “Bessias”, como ficou conhecido, foi o servidor citado por Dilma em telefonema com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva — designado para levar o termo de posse que daria a Lula o cargo de ministro da Casa Civil. A conversa, gravada pela Polícia Federal com autorização do juiz Sérgio Moro foi interpretada como uma forma de tentar evitar uma eventual prisão de Lula, uma vez que, como ministro, ele passaria a ter foro privilegiado e só poderia ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Em 1992, quando Fernando Collor ficou três meses afastado temporariamente até a cassação definitiva do seu mandato, as negociações sobre os direitos que teria nesse período foram mais tensas.

A lista de pedidos do hoje senador era extensa, como mostrou o GLOBO em 7 de outubro daquele ano: acesso à residência oficial da Granja do Torto, 20 assessores, um helicóptero para deslocamentos curtos, dez carros oficiais, cinco motos, oito seguranças, passagens aéreas gratuitas para viagens nacionais e internacionais e apoio logístico de órgãos públicos e embaixadas caso resolvesse sair de Brasília.

À época, o vice-presidente Itamar Franco, alçado à condição de presidente em exercício, se assustou com a lista, e as negociações não prosperaram. Segundo Henrique Hargreaves, que foi ministro da Casa Civil de Itamar, Collor teve o que era previsto na lei do impeachment: um carro oficial com dois motoristas, seguranças e o salário reduzido. A assessoria de Collor, no entanto, afirma que ele ficou “à míngua”. Nessa época, o ex-presidente morou na sua residência particular em Brasília, a Casa da Dinda.

O processo do impeachment ainda não acabou. O julgamento de fato começa agora e, só depois de concluído, ficará definido se Dilma será afastada definitivamente do cargo ou se será absolvida. Se o processo não terminar em 180 dias, ela também poderá voltar ao posto.

Na tentativa de retomar o cargo, a equipe de defesa de Dilma, em princípio, continuará trabalhando em Brasília. Chefiado pelo agora exadvogado-geral da União José Eduardo Cardozo, o grupo já começa a rever estratégias. Haverá menos recursos ao Supremo Tribunal Federal (STF), e maior foco nos senadores.

 

EQUIPE CONTA COM DESGASTE DE TEMER

Além dos argumentos jurídicos, está no horizonte contar com um eventual desgaste do governo do presidente em exercício, Michel Temer. A avaliação é de que a crise econômica a ser enfrentada com medidas impopulares e a oposição do PT no Congresso poderão tornar os senadores mais simpáticos às razões de Dilma para não ser impedida.

Embora não esteja descartada uma nova tentativa de recorrer ao STF contra o processo do impeachment, a avaliação é de que chegou a hora de recuar. Segundo advogados que vêm auxiliando Cardozo, a cada derrota no Supremo, cresce a impressão, na opinião pública e entre os senadores, de que o processo é legítimo e não carrega os vícios alegados pela defesa. Por esse motivo, uma nova ação ao STF terá de ser muito bem avaliada, tanto na questão jurídica a ser argumentada quanto em relação ao melhor momento político.

A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zawascki, que negou o pedido de anulação feito pela defesa na última terça-feira, um dia antes da sessão no Senado, frustrou a equipe. Apesar de o Supremo ter dado sinais de que se intrometeria o mínimo possível no impeachment, havia a expectativa de uma decisão favorável vinda de Teori.

O temor da defesa era que o mandado de segurança que pedia a anulação caísse nas mãos do ministro Gilmar Mendes, crítico do governo é que já havia negado um pedido parecido, protocolado pelo então deputado Wadih Damous (PT-RJ). Mas a esperança de uma decisão favorável de Teori, que ficou responsável pelo recurso, foi frustrada.