Título: Reconstruir o euro
Autor: Figueiredo, Odail
Fonte: Correio Braziliense, 17/10/2011, Economia, p. 9

A crescente onda de protestos mundo afora contra o poder dos bancos, os políticos, o desemprego, a incerteza em relação ao futuro (os alvos são muitos e difusos) deu tons mais dramáticos ao cenário no qual os líderes mundiais (a tarefa não está mais exclusivamente nas mãos dos europeus) tentam encontrar a saída para a crise que se abate sobre a Zona do Euro. Até agora, ela não está clara, apesar dos progressos feitos em alguns pontos: todos estão de acordo que é preciso capitalizar o sistema financeiro da região para evitar a quebra de instituições, o que só tornaria a situação muito pior, e consolidar mecanismos para refinanciar as dívidas dos países em dificuldades. Mas ainda não há um entendimento sobre a maneira de alcançar esses objetivos.

Com seus 440 bilhões de euros agora integralizados, o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira, criado para socorrer as economias mais complicadas, pode não ser suficiente para dar conta do recado, sobretudo se for necessário incluir na fatura as enormes dívidas da Espanha e da Itália. No fim de semana, ministros do G-20, que reúne países industrializados e os principais emergentes, discutiram o aumento de aportes ao Fundo Monetário Internacional para que a entidade possa ter maior engajamento nessa tarefa. Com a oposição dos Estados Unidos e da Alemanha, o assunto ficou pendente e deve ser retomado no encontro de cúpula do grupo, no início de novembro.

Quanto mais o tempo passa, no entanto, mais grave a situação fica. A palavra agora está com os líderes da União Europeia. Eles prometem apresentar, na reunião que terão no próximo domingo, uma "estratégia global", que já teria seus principais pontos acertados entre franceses e alemães, os dois principais sócios da união monetária. O plano ainda não é conhecido, mas ninguém duvida que os europeus, que, afinal, são mesmo os maiores responsáveis pelo encaminhamento das soluções, estão diante de uma tarefa gigantesca. Já não se trata apenas de fazer voltar a funcionar o mercado de títulos e fortalecer os bancos ¿ até para que o sistema financeiro possa absorver o que parece ser um inevitável calote parcial da Grécia, cuja dívida, superior a 150% do PIB, tornou-se incobrável.

Depois de apagar o incêndio, será preciso reconstruir o edifício da moeda comum adotada hoje por 17 nações do continente. A restauração de divisas nacionais, mesmo que a hipótese seja considerada só no caso de países menores, como a Grécia, é inconcebível, pois poderia causar desequilíbrios ainda mais perigosos, dada a teia de relações comerciais e financeiras estabelecida entre as economias. Pelo que se vê, os líderes tentarão avançar no sentido oposto: ampliar a governança do bloco, o que implica reduzir o poder dos governos nacionais em matéria fiscal e financeira, para evitar a repetição dos deficits que fizeram eclodir a crise. Mais adiante, será preciso pensar em mecanismos para diminuir as diferenças de produtividade entre as economias. Nada é fácil, nem pode ser resolvido a curto prazo, o que deixa aberta a possibilidade de que a incerteza será ainda prolongada.