Valor econômico, v. 17, n. 4.010, 23/05/2016. Brasil, p. A3

Meirelles quer nova rodada de responsabilidade fiscal de Estados

Na negociação, governo oferecerá carência maior e alongamento

Por: Leandra Peres/ Ribamar Oliveira/ Fábio Pupo/ Marta Watanabe

 

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, quer transformar a renegociação das dívidas estaduais numa nova rodada de responsabilidade fiscal no país. Essa é a orientação que ele deu à equipe nas conversas com os governadores que devem ser retomadas essa semana. Já está definido que o modelo básico incluirá uma moratória nos pagamentos de empréstimos, que ogoverno prefere chamar de carência, e algum alongamento no prazo dos financiamentos originais. O custo de um adiamento nas despesas com os juros poderá superar R$ 36 bilhões num ano, segundo dados do próprio governo.

A Fazenda já sinalizou aos governadores que está finalizando a proposta. As contrapartidas exigidas vão se concentrar principalmente nas despesas com salários e contratações, apontadas como os principais ralos das finanças estaduais. Deverá, no entanto, haver uma ênfase maior na venda de ativos dos Estados, modelo que foi a base dos acordos ao longo da década de 90quando os governadores se desfizeram dos bancos estaduais. Para evitar maior judicialização da discussão, a Fazenda quer que a solução esteja encaminhada antes do prazo de 60 dias dado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nas ações em que deu aos Estados direito de pagar juros simples sobre a dívida com a União.

Os governadores insistirão numa moratória integral no pagamento com juros por um ano na dívida com a União e com bancos públicos como BNDES, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil. Acreditam que a necessidade do governo federal de votar reformas estruturais no Congresso melhora seu poder de barganha. Além disso, os governadores apostam na mesma estratégia que o governo federal. Assim como Meirelles, ao anunciar o déficit de R$ 170,5 bilhões nas contas desse ano, os governadores querem limpar todos os passivos que estão acumulados em seus caixas e fazer uma meta tão "realista" quanto a do governo federal. De acordo com representantes estaduais, o desconto solicitado agora pelos entes não significa perdão da dívida. A proposta é que o saldo a pagar seja jogado para os próximos anos.

Na proposta que o ex-ministro Nelson Barbosa havia enviado ao Congresso para renegociar as dívidas estaduais havia a previsão, por exemplo, da suspensão de reajustes salariais durante dois anos, um limite para despesas correntes e a padronização da contabilidade das despesas com pessoal. O desconto na dívida, no entanto, era de 40% por dois anos.

Renato Villela, secretário de Fazenda do Estado de São Paulo, destaca que a proposta possibilita o reinício da negociação com o governo federal. Para ele, se o percentual for menor, pode ser dado por um prazo maior. "O governo federal precisa tirar isso da pauta e ganhar o apoio dos governadores para as reformas." George Santoro, secretário de Fazenda de Alagoas, lembra que ogovernador do Estado, Renan Calheiros Filho, defende também os 100% de carência por um ano. A sugestão dos Estados do Nordeste é essa também, diz ele, adicionada ao alongamento de dez anos da dívida com o BNDES, com carência de quatro anos.

Ana Carla Abrão Costa, secretária da Fazenda goiana, enfatiza que é preciso atacar a fonte do problema, não só a consequência dele, que é a crise financeira dos Estados. "E a fonte é o desequilíbrio estrutural. É imprescindível que a renegociação da dívida venha acompanhada de medidas estruturais de reequilíbrio"

A Fazenda estima que uma moratória de 100% custaria R$ 36 bilhões num ano, incluindo apenas a dívida com a União. Se o benefício for estendido aos bancos federais, o impacto aumenta. Esse valor, no entanto, não é divulgado pela equipe econômica. O único indicador do gasto com a renegociação é um déficit d e R$ 19,9 bilhões que foi incorporado à meta de 2016, resultado de uma conta líquida entre o que o governo espera receber com a repatriação de recursos no exterior e o que vai gastar no ajuste estadual e outras despesas que não foram especificadas.

O ministro do Planejamento, Romero Jucá, sinalizou apoio a uma carência para os entes - de forma que não haja um desequilíbrio das contas públicas. "Vamos discutir uma carência. Sabemos que situação dos Estados é de dificuldade. Temos que levar isso em conta e construirmos uma solução para ajudar os governos estaduais", afirmou.

Em entrevista recente, Meirelles reconheceu que será necessário equacionar a situação dos Estados. "Esse acordo será analisado, proposto e negociado duramente. Vamos fazer acordo que não seja lesivo à União, que não comprometa estabilização fiscal, e ao mesmo tempo estabelecer metas para gestão fiscal dos Estados", afirmou.

Amanhã, o presidente interino Michel Temer anuncia uma série de medidas para controlar a dívida pública, após o anúncio feito na sexta-feira de que o déficit previsto para este ano é de R$ 170,5 bilhões. Ele estará acompanhado dos ministros da Fazenda, Henrique Meirelles, do Planejamento, Romero Jucá, da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, e da Casa Civil, Eliseu Padilha.

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