Valor econômico, v. 17, n. 4.008, 19/05/2016. Política, p. A9

Centrão ganha disputa pela liderança

Temer cede posto-chave na Câmara para deputado do PSC, que representa um bloco de 13 partidos

Por: Raphael Di Cunto

 

Pressionado pelo centrão da Câmara dos Deputados, o presidente interino da República, Michel Temer (PMDB), optou pelo grupo para exercer maioria na Casa. Um dos principais aliados de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o agora ex-líder do PSC André Moura (SE) foi escolhido como líder do governo na Câmara e terá a tarefa de conduzir as votações.

"Estou há seis anos na Casa, construí relação com os parlamentares e líderes, atuamos juntos no processo de impeachment e por isso tive apoio de 13 partidos", disse Moura. "O presidente afastado Eduardo Cunha não terá influência nenhuma na minha liderança do governo", afirmou.

A escolha desagradou à antiga oposição (DEM, PSDB, PPS e PSB), que reclamaram nos bastidores da "cara" do novo governo, extremamente ligada a Cunha. Mas a possibilidade de atrapalharem as votações, pelo menos neste momento, é reduzida. O grupo, que defendia o impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff bem antes do centrão, ocupa seis ministérios relevantes com Temer.

Integrantes do centrão dizem que Temer optou por governar com a maioria - são 217 deputados, contra 119 da antiga oposição- e garantir apoio na base do toma lá dá cá. Como o PSDB e DEM têm projeto presidencial, dizem, poderiam se recusar a encaminhar certos temas por questões "ideológicas" ou de olho na eleição.

Com o centrão, diz um integrante do grupo, o diálogo é em "outro nível". "Esse projeto é difícil, a base na Câmara vai ter resistência. O que o governo tem a disposição em cargos e emendas para aprová-lo? ", exemplifica. "Já o PSDB e o DEM poderiam criar resistência sobre temas que não forem alinhados com suas ideias."

Outro argumento do grupo é o dito maior trânsito com PT e PCdoB, a nova oposição. "É mais fácil o André Moura negociar com o PT do que alguém do DEM fazer isso", analisa. Os petistas, contudo, têm evitado diálogo com o bloco, que pulou de lado durante a discussão do impeachment.

O argumento mais forte, porém, foi o implícito. Ao levar uma lista de apoio com quase 300 deputados ao nome de Moura, o centrão deu sinais de que, se Temer preferisse Rodrigo Maia (DEM-RJ), favorito até então, poderia ter problemas na Câmara. Maia também é ligado a Cunha, mas não ao centrão.

A última reunião foi na noite de terça-feira, depois da reunião de líderes com o presidente interino. Silvio Costa (PTdoB-PE), ex-vice-líder de Dilma, acusou o grupo de, no encontro, ameaçar dar andamento ao impeachment de Temer na Câmara - o processo depende só da indicação dos líderes. O grupo nega.

DEM e PPS souberam da escolha do líder pelos jornais e protestaram. Já o PSDB, que não quis entrar na briga, demonstrou preocupação, mas não fará críticas públicas. O entendimento é de que o líder é a cara do governo Temer, e não do PSDB, por isso não cabem comentários.

O líder Antônio Imbassahy (PSDB-BA) foi procurado pelo Palácio na semana passada e sondado sobre três nomes, mas defendeu que a escolha era de Temer. Na ocasião, o governo tentou uma terceira via, o líder do PSD, Rogério Rosso (DF), mas ele recusou por achar inadequado o presidente da comissão do impeachment assumir a função.

A liderança do governo coloca o centrão em melhor posição para, além de ocupar mais espaço agora no Legislativo, conduzir a eleição para a presidência da Câmara - seja uma antecipada, caso o cargo de Cunha seja declarado vago como querem parte da Casa, ou em fevereiro de 2017, quando acaba o mandato dele.

O grupo já acertou, por exemplo, que a articulação do Planalto não interferirá na pauta própria da Casa após aprovada a agenda emergencial do novo governo para retomar a economia, como tentava fazer o PT. Entre esses temas que serão pautados está mudanças no estatuto do desarmamento, o estatuto da família, entre outros, nos moldes da votação da maioridade penal.

Um dos gestos mais importantes agora será o posicionamento do PMDB, maior partido da Casa, com 67 deputados, e cujo alinhamento dependerá do deputado Baleia Rossi (SP), um dos mais próximos de Temer e escolhido ontem líder da bancada por aclamação. Pela proximidade com o Planalto, Baleia pode reforçar o centrão ou reequilibrar o jogo ao se aliar à antiga oposição.

Antigo líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ) estava isolado na Casa depois de brigar com Cunha - e por consequência, com o centrão- e aceitou o convite para virar ministro do Esporte. Primeiro-vice líder da bancada, Leonardo Quintão (MG) tentou aliança com o centrão para continuar no cargo, mas não teve sucesso. O mineiro procurou os líderes do centrão em meio a uma coletiva de imprensa e reclamou que o ministro Geddel Vieira Lima, da Secretaria de Governo, atuava para eleger Baleia. Mas retirou a candidatura ao constatar a falta de apoio.

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Deputado é réu em três ações penais e investigado por tentativa de homicídio

Por: Raphael Di Cunto / Carolina Oms

 

A "cara" do governo Michel Temer (PMDB) na Câmara dos Deputados venceu sua primeira eleição por apenas 92 votos, quase não assumiu o atual mandato por estar impedido pela Lei da Ficha Limpa, ganhou protagonismo ao acompanhar o então presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), do café da manhã ao jantar e é réu em três ações penais, além de investigado em quatroinquéritos - um deles na operação Lava-Jato.

André Luís Dantas Ferreira, ou André Moura (PSC-SE), sobrenome que pegou do pai, um ex-vereador, ex-deputado estadual e ex-conselheiro do Tribunal de Contas do Sergipe, está na oposição em seu Estado há dez anos, mas não demorou a se aproximar do poder ao chegar em Brasília. Foi da base enquanto o governo Dilma tinha amplo apoio no Congresso, se tornou independente para lançar o pastor Everaldo à Presidência em 2014, em acordo com o PSDB, mas mantendo relações com o governo do PT, e adotou a oposição quando o governo estava prestes a cair.

Por influência do senador Eduardo Amorim, comandante de seu grupo no Estado e que acabou derrotado na eleição para o governo em 2014, André virou líder do PSC logo no segundo ano de mandato e não deixou mais o cargo nos cinco anos seguintes. Foi um dos principais articuladores, junto com Cunha, do blocão que sustentou a candidatura do pemedebista à Presidência da Casa e agora do "centrão", que manteve Temer pressionado até escolhê-lo líder.

Da proximidade com Cunha também deriva um dos inquéritos a que responde na Lava-Jato. Moura é investigado pressionar dirigentes do grupo Schahin na CPI da Petrobras, empresa que o presidente afastado da Câmra teria achacado para pagar propina. "Se a procuradoria acha que fui agressivo e carrasco, paciência, mas não tenho o que temer. Eu não poderia tratar um réu confesso com flores", afirmou.

O parlamentar, que foi prefeito de Pirambu (SE) de 1997 a 2004, deixou o cargo para ocupar uma secretaria de Estado no Sergipe e atribuiu ao seu sucessor e ex-aliado a maioria das ações que responde no Supremo.

Ele é réu por suposto crime de responsabilidade, formação de quadrilha, improbidade administrativa na época que foi prefeito e da gestão seguinte. É acusado de ter recebido mercadorias de supermercado e conta de telefone pagos pela prefeitura e de usar veículos da frota municipal para fins pessoais. Também é investigado em três inquéritos que apuram crime contra a Lei deLicitações e peculato; crime de responsabilidade e formação de quadrilha em outro inquérito e por tentativa de homicídio do vigia da casa de Juarez Batista dos Santos, prefeito que o sucedeu em Pirambu. O parlamentar acusa seu ex-aliado de persegui-lo e tentar culpá-lo pelos desvios depois de terem rompido.

Moura alimentava chegar à Presidência da Câmara com a ajuda de Cunha, mas o aliado sempre o alertou para o pequeno tamanho de seu partido - apenas nove deputados-, insuficiente para sustentar uma candidatura destas. Agora, na liderança do governo, encontra o espaço para sonhos mais altos, mas pode esbarrar no desejo de outros integrantes do centrão de ocupar o cargo.

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