Valor econômico, v. 17, n. 4009, 20/05/2016. Política, p. A6

Pressão do setor de saúde adia votação de PEC

Por: Vandson Lima / Thiago Resende

 

A articulação de setores organizados ligados à saúde entre os senadores foi responsável pelo adiamento da votação em segundo turno, que deveria ter ocorrido esta semana, da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que permite a desvinculação de 25% da receita de Estados, municípios e da União pelos próximos quatro anos.

A mudança, que deveria funcionar como um aceno aos Estados e municípios, que poderiam aplicar em outras despesas parte dos recursos hoje atrelados a áreas específicas, alarmou o setor, cioso de que os entes federados fiquem desobrigados e passem a investir menos dinheiro do que hoje é destinado obrigatoriamente à área.

Segundo dois senadores do círculo próximo do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), a proposta está sendo, por isso, reavaliada. É possível, inclusive, que toda a parte que libera Estados e municípios seja retirada da PEC 143, deixando apenas a União como beneficiária da desvinculação.

A solução criaria uma situação insólita. Isso porque, originalmente, o texto de autoria do senador Dalírio Beber (PSDB-SC) tratava apenas de Estados e municípios, não da União, incluída por ação do agora ministro do Planejamento, Romero Jucá, senador licenciado do PMDB e relator da proposta.

A União foi agregada pelo ministro diante da dificuldade de a proposta de Desvinculação de Receitas da União (DRU) avançar na Câmara dos Deputados. Na casa vizinha, o relator Laudivio Carvalho (SD-MG) era da oposição ao governo de Dilma Rousseff e não negociava com o Planalto. A PEC da DRU está na Câmara desde julho do ano passado, quando o ministro da Fazenda ainda era Joaquim Levy. Ou seja, se tomada essa medida de exclusão dos entes, haveria duas PECs, ambas nos termos da DRU, emtramitação no Congresso - uma na Câmara e outra no Senado, ambas precisando posteriormente cruzar o Congresso e obter aval na Casa vizinha.

A desvinculação é justificada porque a estrutura orçamentária e fiscal brasileira possui elevado volume de despesas obrigatórias, tais como as relativas a pessoal e a benefícios previdenciários, e também vinculação expressiva das receitas orçamentárias a finalidades específicas - como saúde, tecnologia e pesquisa. O mecanismo permite que recursos que estejam parados em algum órgão ou instituição sejam destinados a outras finalidades, facilitando o cumprimento da meta de superávit primário.

A única exceção na emenda proposta é a educação, já que o substitutivo excetua da desvinculação a arrecadação da contribuição social do salário-educação e, "para efeito do cálculo dos recursos para manutenção e desenvolvimento do ensino, o percentual referido será nulo".

Autor no Senado, Beber criticou a costura, argumentando que Estados e municípios já arcam com percentuais muito superiores ao previsto em lei no custeio da saúde, já que o setor é subfinanciado pela União. Logo, não terão como gastar menos do que previsto na Constituição para a área pela própria necessidade. "A desvinculação é um instrumento de gestão, não significa que o prefeito ou governador ficará desobrigado. A União foi se omitindo ao longo dos últimos anos e os municípios já estão pagando essa conta. Emmédia, os municípios já investem 23% de sua Receita Corrente Líquida em Saúde. A Constituição determina 15% e, para Estados, 12%", disse.

Questionado, Romero Jucá afirmou que "a DRU será aquela que o Congresso entender que deve aprovar. O importante é aprovar a desvinculação. Essa medida é emergencial", disse. O ministro falou também que o governo vai "depois discutir uma modelagem mais permanente" para a mudança.

Parlamentares do PT afirmaram que a proposta formulada por Jucá em discussão no Senado ampliou o escopo dos recursos a serem desvinculados. Isso, portanto, mudou em relação ao que vigorou em anos anteriores. Assim, sustentam que a União possa continuar aplicando livremente o percentual de 25% das receitas, mas que esse mecanismo não atinja os recursos a seremdestinados à educação e saúde. O mesmo valeria para a gestão dos Estados e municípios.

Mesmo reconhecendo ser minoria na Casa, o senador Paulo Paim (PT-RS) defende a ideia de que a seguridade social, principalmente as aposentadorias, seja preservada. "A PEC possibilita desvincular tudo isso. Nossa intenção é não deixar que se mexa nesses recursos", afirmou.

Até o ano passado, o governo podia destinar, conforme seu interesse, 20% das receitas da União. A equipe econômica da presidente afastada Dilma Rousseff apresentou uma proposta de alteração constitucional para que pudesse desvincular 30%, além de estender o mecanismo para até o fim de 2023.

Esse projeto ainda está parado na Câmara. Diante da resistência de partidos como PSDB e DEM, o governo, no ano passado, começou a negociar uma margem menor, de apenas 25% - mesmo percentual da PEC que está pronta para votação no plenário do Senado.

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