Valor econômico, v. 17, n. 4005, 16/05/2016. Política, p. A8

Criação de Secretaria da Cultura será definida hoje

Por: Rafael Bitencourt / Bruno Peres / Marcus Lopes

 

Uma solução pensada pelo governo para pôr fim ao descontentamento com a junção das pastas de Educação e Cultura ganhou força neste fim de semana. O presidente interino Michel Temer enxerga a possibilidade de criar uma Secretaria da Cultura que, para ter maior status, seria ligada diretamente à Presidência da República.

A reação do governo serviria para solucionar não apenas o impasse envolvendo as críticas ao novo desenho institucional dos dois ministérios, mas também para colocar fim a outra queixa importante: a ausência de mulher na composição do primeiro escalão. A represente feminina assumiria a nova instância administrativa ligada à política cultural.

O ministro da Educação e Cultura Mendonça Filho disse ao Valor que vai defender sua posição junto a Temer em reunião que será realizada hoje. Segundo ele, a decisão de criar a nova secretaria ainda não foi tomada. "Vou levar ao presidente uma avaliação geral do quadro organizacional e de prioridades para área da cultura para que possa ele tomar uma decisão ouvindo, evidentemente, quem está com a responsabilidade nas áreas de educação e cultura", disse Mendonça.

Ele afirmou que prefere não antecipar a posição que irá defender sobre a mudança na pasta durante a reunião com o presidente. "Não vou emitir nenhuma opinião. Primeiro vou falar com ele e depois comunicar a decisão do governo", afirmou.

Um dos nomes que já circulam para assumir a função é Adriana Rattes, ex-secretária de Cultura do Estado do Rio, ligada ao PMDB.

O mal estar no meio cultural é profundo e Mendonça Filho foi testemunha da insatisfação na sexta, quando foi vaiado por funcionários do antigo ministério. Mais do que uma reação ao novo ministro, o questionamento é com a extinção do ministério.

"Qual será o papel da Funarte, que fomentou grandes projetos para o teatro brasileiro?", indaga o ator e dramaturgo Ivam Cabral, fundador da Companhia de Teatro Os Satyros.

"É uma pena ver o país voltar a uma situação de 30 anos atrás", diz o diretor do Instituto Tomie Ohtake, Ricardo Ohtake. Em vez de reforçar uma área, a da Educação, o novo governo corre o risco de enfraquecer as duas, na visão do jornalista e dramaturgo Mario Viana. "Voltar a reunir sob o mesmo comando os dois ministérios é mais do que um retrocesso ao governo dos militares. É um sinal de que a cultura será tratada como puxadinho", diz.

"Não é só uma questão de orçamento, é um trabalho enorme que pode ser completamente perdido. Os processos de regulação e o acompanhamento das políticas culturais não são construídos do dia para a noite", observa a diretora da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), Izabel Costa Cermelli, a Belita.

Francisco Weffort, ministro da Cultura no governo Fernando Henrique Cardoso, preocupa-se com a manutenção da estrutura desenvolvida pelo MinC ao longo dos anos. "Em uma situação de emergência em que os dois ministérios devem ficar juntos, penso que se deve fazer o máximo para manter as estruturas administrativas da cultura como foram construídas nos últimos 30 ano": manter o Fundo Nacional de Cultura e as leis de incentivo, a de Cinema e a Rouanet, assim como os museus, fundações e demaisinstituições vinculadas ao Ministério da Cultura", diz Weffort, que preferiria manter os ministérios separados.

A expectativa é grande também em outra área ligada ao Ministério da Cultura: a preservação do patrimônio histórico. "Juntar a cultura com a educação é inaceitável. A forma de produção e os processos que envolvem as duas áreas são muito diferentes", diz o arquiteto e urbanista Nestor Goulart Reis, conselheiro do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

Entidades ligadas às secretarias estaduais e municipais de cultura também se manifestaram contra a extinção do Minc. O Fórum Nacional dos Conselhos Estaduais de Cultura (Conecta) emitiu manifesto em que trata a junção como "leviandade absoluta". Já o Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes Municipais de Cultura das Capitais e Regiões Metropolitanas, que reúne secretários municipais de todo o país, também emitiu manifesto contrário à fusão. (*)- Especial para o Valor; colaborou Cristiane Agostine)