Valor econômico, v. 17, n. 4003, 12/05/2016. Política, p. A3

Senado vota afastamento de Dilma

Resultado deve sinalizar disposição dos senadores de aprovar de modo definitivo o impeachment

Por: Vandson Lima, Thiago Resende, Fábio Pupo, Cristiane Agostine, Raphael Di Cunto e Murillo Camarotto

 

 

O Senado encaminhou ontem o afastamento da presidente da República, Dilma Rousseff, do cargo por até 180 dias, com a admissibilidade do processo de impeachment que pode cassar seu mandato em definitivo.

A votação, que ainda não havia sido iniciada até o fechamento desta edição, deve confirmar um revés para Dilma, com mais de 50 senadores favoráveis à sua saída temporária. Computados os discursos de 43 senadores, somavam 32 os que votariam peloprosseguimento da denúncia e apenas 10 pelo arquivamento - o senador Fernando Collor (PTC-AL) deu a entender que votará contra Dilma, mas em uma fala muito mais voltada a lembrar o processo contra ele em 1992 do que a comentar o atual, não declarou voto. Dos 81 senadores, 75 haviam registrado presença na sessão.

Sessão plenária do Senado: até o momento do fechamento desta edição, 32 senadores falaram a favor do impeachment e novecontra o afastamento

Líder do PMDB, maior partido do Senado, Eunício Oliveira (CE) avaliou que "não há chance de o processo de impeachment não ser encaminhado favoravelmente", tendo como consequência o afastamento da presidente. "Pela experiência e vivência que tenho na Casa, serão mais de 50 votos pelo prosseguimento e afastamento da presidente Dilma", cravou o senador, que foi aliado do governo Dilma, mas está fechado no apoio ao vice, Michel Temer.

A luta dos governistas era para, pelo menos, evitar que fossem alcançados 54 votos pelo afastamento, o que seria uma sinalização indesejada, já que esta é a marca necessária para, ao fim do processo, cassar definitivamente o mandato de Dilma.

"Se em dois meses Temer não tiver popularidade, eles não terão 54 votos [no futuro]", avaliou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ). Assim como os demais petistas, ele prometeu resistência às propostas econômicas do futuro ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e disse esperar que "10 mil pessoas" aguardem Dilma hoje em sua saída do Palácio do Planalto.

A sigla, no entanto, ainda tem dificuldade para vislumbrar caminhos no pós-Dilma. Segundos mandatários da sigla, o PT enterrou a articulação para antecipar as eleições presidenciais, por meio de Emenda Constitucional (PEC). A cúpula da legenda diz que a proposta não tem respaldo popular, dos movimentos sociais e sindicais que teve durante a redemocratização do país, nas Diretas Já. Sem o apoio das ruas, alegam, dificilmente seria aprovada no Congresso Nacional. Alguns parlamentares, como o senador Jorge Viana (PT-AC), ainda apoiam a medida, mas isoladamente.

O PT nacional também desistiu de articular a convocação de uma Assembleia Constituinte para promover uma reforma política. Na análise de dirigentes petistas, neste momento o PMDB e PSDB aprovariam medidas que poderiam prejudicar o PT.

Na outra ponta, o presidente do Congresso Nacional, senador Renan Calheiros (PMDB-AL) ressaltou a necessidade de se emplacar reformas para alicerçar o governo Temer, com o devido apoio do Congresso. "Vou ajudar institucionalmente, colaborar para avançarmos nas reformas", disse. "Vou ter com um novo presidente a mesma relação que tive com a presidente Dilma", garantiu.

Renan afirmou que pretende manter a "isenção" em relação ao novo governo. Por isso, não votará em nenhuma das fases do processo contra Dilma. "Estou lutando para manter a independência", justificou. Ele rechaçou que possa haver uma reviravolta no processo e lembrou que, até ontem, nenhuma decisão da Casa foi contestada no Supremo Tribunal Federal (STF). "Isso mostra que seguimos estritamente o rito", disse. "Somente em virtude de decisão, lamento, equivocada pelo presidente interino da Câmara dosDeputados, e já revogada, levou-se a polêmica que levou a discussão do Supremo das decisões que aqui tomamos", lembrou, em outra crítica à decisão de Waldir Maranhão (PP-MA), respaldada pelo governo, de tentar anular a sessão da Câmara que aprovou o impeachment.

O episódio, alegam aliados de Renan, irritou o presidente e pode ter marcado um afastamento efetivo dele dos petistas.

Dado como certo no comando do Ministério das Relações Exteriores do futuro governo de Michel Temer, o senador José Serra (PSDB-SP) avaliou, ao chegar ao plenário do Senado, que o processo para a cassação definitiva da presidente Dilma deve durar "dois ou três meses", e não se estender pelos 180 dias previstos.

"O processo pode demorar algum tempo, mas não acredito que exija os seis meses previstos. Na verdade, esse prazo será encurtado na prática. Acho que dois, três meses no máximo. Vai ser bem menor", disse o senador, correligionário de Antonio Anastasia (MG), relator da denúncia.

Para Serra, "importante para o Brasil, para todos os lados da política que a situação se defina´" no menor tempo possível. Ele evitou comentários sobre o futuro governo.

Presidente do PSDB, Aécio Neves (MG) disse que o partido será "um grande avalista" de um eventual governo Temer. E cobrou do virtual presidente ousadia, pois "a primeira impressão é a que prevalecerá".

Relatando conversa com Temer ontem, o tucano afirmou que o pemedebista demonstrou interesse em incorporar propostas do PSDB no plano de um novo governo. Entre as ideias, ele citou as reformas política, trabalhista e previdenciária, além da redução da máquina pública.

Aberto o processo de impeachment, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, passará a ser a "última instância" e responderá recursos e questões de ordem que forem apresentados na comissão especial. É ele quem passa a presidir de fato o processo.

O colegiado formado para analisar a admissibilidade da denúncia continuará funcionando. A composição não muda. Raimundo Lira (PMDB-PB) segue na presidência da comissão. E Antonio Anastasia (PSDB-MG) também será relator nessa segunda fase.

Pela previsão legal, o presidente do Supremo somente presidirá duas sessões no Senado: o julgamento da pronúncia (provas trazidas ao processo) e o julgamento final. Haverá uma espécie de transmissão do comando do processo, de Renan para Lewandowski, amanhã. O presidente do Supremo deverá inclusive participar de reunião com os líderes do Senado.

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