Título: Não basta tirar da rua, diz secretária
Autor: Sakkis, Ariadne; Machado, Roberta
Fonte: Correio Braziliense, 19/10/2011, Cidades, p. 25
Segundo Arlete Sampaio, é preciso que o governo avalie cada caso para adotar políticas capazes de acabar com as ocupações de sem teto
A secretária de Desenvolvimento Social e Transferência de Renda, Arlete Sampaio, descarta a adoção de uma política pública que tenha como objetivo retirar das ruas mendigos e invasores de áreas públicas. Segundo ela, que reconhece o aumento dos moradores de rua nesta época do ano ¿ conforme mostrou ontem o Correio ¿, apenas uma rede de proteção pode contornar a vulnerabilidade da situação social. "Nosso trabalho não é fazer higienização social. Essas pessoas têm dramas próprios e estão nas ruas, principalmente, porque estão desempregadas ou por desavenças familiares", disse.
Ainda de acordo com a secretária, apenas entre o fim de outubro e o início de novembro o Distrito Federal deverá ter nova política pública para a população de rua. A estratégia será unir esforços com diversas secretarias, principalmente as de Saúde e Segurança Pública, para tentar dar outras opções de vida aos moradores de rua. Para Arlete Sampaio, os casos devem ser avaliados individualmente para que as soluções mais adequadas sejam aplicadas. "Não podemos simplesmente tirá-las das ruas porque a presença delas incomoda a classe média. O governo e a sociedade têm de dar uma solução", afirma Sampaio.
A situação no DF chegou ao ponto de que até terrenos pertencentes a embaixadas foram invadidos. A grande pilha de lixo rodeada por barracas de lona vizinha da Embaixada da China, à beira da Via L4 Sul, começou a ser retirada na manhã de ontem.
À pedido do Itamaraty, a Agência de Fiscalização (Agefis) e a Polícia Militar derrubaram a estrutura que era usada como ponto central de distribuição de uma cooperativa de reciclagem. Há mais de um ano, havia despejo e recolhimento de lixo no terreno, que pertence à Embaixada da Guatemala. Todo o lixo será recolhido até amanhã.
No caso de catadores de lixo reciclável, a ideia é que órgãos públicos, por exemplo, encaminhem esse tipo de material para galpões de reciclagem a fim de facilitar a incorporação das pessoas a cooperativas do setor. Mas o governo terá de convencer moradores de rua como Edinalva de Jesus, 49 anos. Nascida em Irecê (BA), ela pisou na capital federal há quase 15 anos para trabalhar como doméstica. A experiência durou quatro anos, até que a patroa se mudou e deixou a baiana sem emprego. Ela sobrevive com o que ganha com reciclagem. Mesmo pagando aluguel de R$ 200 por uma casa em Planaltina de Goiás, há uma década ela só volta para casa a cada duas semanas. "É muito difícil pagar passagem e lá não tem trabalho. Em Planaltina o pessoal quer pagar muito pouco, então ganho mais aqui", justificou. Como ela, famílias inteiras moram às margens da via L3 Norte, próximo à Colina da UnB.
Atraídos por doações A nova política pública virá a tempo de tentar lidar com o aumento da população de rua, fato tradicionalmente observado com a chegada dos feriados de fim de ano. Para Arlete Sampaio, Brasília continua sendo polo de atração de moradores sem teto em função da alta renda dos habitantes, que mantêm o hábito de fazer doações. "Eles sabem que vão receber alguma coisa e eles próprios dizem que o lixo de Brasília é muito rico", explica. A secretária acredita que a população deve mudar de hábitos para tornar a vida nas ruas menos atrativa. "As pessoas podem ajudar, mas fazendo doações para instituições que desenvolvem trabalhos sociais", aconselha.
Por enquanto, para muitos catadores, a situação ainda é a mesma. Luiz Monteiro da Silva, 52 anos, conta que não foi abordado por nenhum agente social recentemente. "Estou até achando estranho eles não terem vindo esta semana. Toda hora a polícia vem e ameaça, e eu não vou para albergue", reclama Luiz. Ele passa as noites na barraca de lona com a esposa e uma filha, mas ressalta que recusa o abrigo do governo porque aluga uma casa em Planaltina (GO), onde moram outras duas filhas. Segundo ele, a única visita bem-vinda é a dos doadores. "Às vezes, trazem uma cesta, uma roupa. Eu não peço, mas ajuda", diz. Há 27 anos ele vive entre a residência alugada e o barraco montado na L3 Norte, próximo à Colina, pois alega que não consegue trabalho que pague melhor do que a reciclagem de lixo no Plano Piloto. Enquanto espera ser chamado em uma das inscrições que fez nos programas habitacionais do DF, ele continua dormindo na rua, onde sua mulher deu à luz três de suas filhas.
Ranking O último levantamento da Secretaria de Desenvolvimento Social e Transferência de Renda (Sedest) aponta que 2.365 pessoas vivem em situação de rua na capital do país. Entre eles, 38,2% estão no Plano Piloto. Desses, 37,3% se encontram na região central. A Asa Norte concentra 38,3% deles e a Asa Sul, 24,4%. Taguatinga concentra 19,9% dos sem teto e é seguida por Ceilândia (9,7%) e Núcleo Bandeirante (2,1%)
Opinião do internauta Leitores do Correio comentam reportagem sobre os moradores de rua de Brasília
Guilherme Correia Pereira "Isso é normal. Vai chegando o fim de ano e eles montam suas barracas e ficam na espera das doações de dinheiro e cestas básicas e natalinas que irão reabastecer a despensa. Depois, voltam para as cidades natais."
Pedro Freitas "Muitas dessas pessoas estão morando na rua por falta de opção, mas a maioria aprendeu a ter vida fácil e não está nem aí pra nada. Daí para virar um usuário de droga, até mesmo cometer algo mais grave, é um passo. Tem que mandá-las de volta às suas origens."
Julio Oliveira "Por que não repatriam essas pessoas para seus estados de origem? Vá ver se tem morador de rua em Curitiba? Ficam pessoas nas rodoviárias. Chegou sem destino? Não tem onde ficar? Veio fazer o quê? Não tem respostas? Volta na hora."
Ana Oliveira "É um absurdo que o governo seja conivente com esse tipo de coisa. A polícia e o serviço social vêm, tiram essas pessoas e elas estão de volta no outro dia. A situação na L3, ao lado da Direção Regional de Ensino, está insustentável. Eles entram, tomam banho, brigam. Tudo ocorre por lá."
Ed Costa "Os moradores da Asa Norte precisam se unir, precisamente os das 706/906, contra esses arruaceiros, baderneiros, maconheiros e desocupados, já que quando ligam para as polícias, elas não fazem nada."
Francisco Lima "A existência de indigentes dormindo nas ruas de Brasília é pura falta de competência das autoridades constituídas. São pessoas que vivem na mais completa promiscuidade. Sem amparo governamental. Ocupação de área pública é proibida por lei. Removam!"